São Paulo, domingo, 22 de fevereiro de 2004

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CONCORRÊNCIA

Presidente do Cade toma por base o histórico de decisões do órgão

Nestlé tem pouca chance de levar a Garoto, diz Grandino

MAELI PRADO
DA REPORTAGEM LOCAL

Se prevalecer o histórico de decisões do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), não há grandes chances de o órgão mudar o mérito da decisão que barrou a compra da Garoto pela Nestlé.
A opinião é do controvertido presidente do Cade, João Grandino Rodas -único dos seis conselheiros do órgão a aprovar, com restrições, a união das empresas.
Grandino, que é professor titular de direito da USP e tem mestrado em direito pela Universidade Harvard (EUA), deixa o cargo em julho próximo, quando vence o mandato de quatro anos.
Ele contesta as acusações de que sugeriu à Nestlé que recorresse da decisão do órgão. "Nenhuma empresa multinacional precisa de alguém para dizer a ela que recurso tem, porque elas têm um batalhão de advogados."
A seguir, a entrevista de Grandino à Folha.
 

Folha - Após a polêmica decisão do Cade sobre o caso Nestlé/Garoto, o órgão ganha força ou perde, com as pressões contrárias?
João Grandino Rodas -
O Cade já vinha tendo notoriedade nacional desde 95. Apesar disso, não tenho dúvida de que esse julgamento contribuiu para que o Cade ficasse mais conhecido. É normal que os dois lados envolvidos dêem ênfase a um ponto ou outro. Houve inclusive uma grande movimentação política, mas entendo que o Cade não perdeu, muito pelo contrário, pois ganha força a idéia da preservação do órgão, apesar das pressões. Nunca notei no governo intenção de enfraquecer o Cade. Não quero entrar no mérito político, mas acho que dificilmente haverá uma CPI no Cade, como foi aventado. Na eventualidade de haver, não tenho receio -nem por mim nem pelos conselheiros.

Folha - Como está a pressão sobre os conselheiros por causa da decisão sobre o caso?
Grandino -
Em um primeiro momento é normal que esse furor aconteça. Sobre a possibilidade de ser mudado o mérito da decisão, diria que as chances não são grandes, olhando historicamente as decisões do Cade. Acho que ninguém que conhece a matéria diria que as chances são grandes.

Folha - O sr. foi muito criticado por dizer que havia possibilidade de recurso contra a decisão do Cade. Como o sr. encara as críticas?
Grandino -
A crítica maior se deveu, basicamente, pelo fato de eu ter levantado a questão da não-compatibilidade da decisão do conselheiro-relator e dos demais com a Constituição. Mas coloquei isso por ser minha convicção. Se você olhar os quase quatro anos em que estou no Cade e os precedentes dos votos que dei, verá que todos são nessa linha. A Constituição prevê que a livre concorrência é fundamento da ordem econômica. Para intervir na economia, é necessário que essa intervenção ocorra em casos excepcionais. Mas é uma idéia que não é uma ofensa aos demais votos. A decisão será cumprida.

Folha - Como os conselheiros estão avaliando a proposta informal de criação de uma terceira empresa pela Varig e pela TAM?
Grandino -
Fizeram uma proposta verbal, que modifica em parte aquela apresentada há um ano. O que se espera é que essas propostas venham por escrito, rapidamente, e possam ser examinadas de maneira também rápida.

Folha - Sempre houve muitas críticas à estrutura pequena do Cade, que determina atrasos em julgamentos de casos complicados. Como o sr. encara essa questão?
Grandino -
Os atrasos em julgamentos se devem, em parte, à estrutura pequena, mas também a outras razões. Entre elas, o fato de que a lei vigente possibilita a entrada no sistema de defesa da concorrência de um número exagerado de processos de fusão. De cada 100 processos que entram, cerca de 85 não precisariam entrar. O sistema está trabalhando em um projeto para mudar essa lei, que deve ser encaminhado aos Ministérios da Justiça e da Fazenda.


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