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LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
Um Brasil diferente...
O ajuste das contas externas pode ser comparado ao 1º
estágio de foguete que pode
nos levar ao desenvolvimento
O BANCO Central nos informou nesta semana que um
evento extraordinário ocorreu no ultimo mês de janeiro. Pela
primeira vez, o Brasil tem reservas
cambiais superiores à sua divida externa total. Em outras palavras,
nossos compromissos em dólares,
privados e públicos, são menores
-o BC estima em US$ 4 bilhões-
do que os ativos brasileiros no exterior. Embora essa situação estivesse
prevista por quem acompanha as
estatísticas quase dia a dia, a sua
confirmação me causa um sentimento estranho. Como nossa economia mudou nesta última década!
Antes de fazer um juízo de valores
sobre essa nova situação, quero deixar bem clara uma posição que defendo há algum tempo: a fragilidade
externa de nossa economia foi a
causa principal de nossos problemas econômicos que ocorreram a
partir da segunda metade dos anos
70 do século passado. Por isso a informação divulgada pelo Banco
Central, apesar de já esperada havia
tempos, tem uma importância tão
grande.
Ela marca o fim de uma época de
crises constantes, crescimento medíocre e altamente instável, estagnação da renda da população e piora
da distribuição de renda por conta
da inflação elevada. Embora um
grande número de economistas justifique o martírio dos últimos 30
anos a partir de várias outras distorções em nosso sistema econômico
-pequena abertura para o exterior,
riscos de natureza jurídica, sistema
tributário irracional entre outros-,
fica claro hoje que a fraqueza de
nossa moeda era a mãe de todos os
problemas que enfrentamos.
Não digo que, resolvida essa questão -e ela está hoje resolvida dentro de um horizonte de tempo longo-, os outros problemas que herdamos do passado desaparecerão.
Mas afirmo, com convicção, que,
sem resolver a questão externa, não
havia mecanismos para enfrentar
-e vencer- esses outros desafios.
Muitos vão certamente contra-argumentar -e tentar jogar água
fria no meu entusiasmo- com afirmações como a de ser um absurdo
um país como o Brasil ter uma posição credora externa. Nós precisaríamos de poupança vinda de fora
para financiar nosso desenvolvimento. Essa afirmação poderia estar correta em um mundo econômico diferente do atual. Mas a experiência das últimas décadas mostra
que os países em desenvolvimento
que obtiveram maior sucesso em
termos de crescimento foram, na
maior parte dos casos, os que mantiveram a conta corrente em equilíbrio ou até superavitária.
O ajuste das contas externas é um
presente, um efeito colateral do
crescimento asiático, que elevou
nossos termos de troca. Pode ser
comparado ao primeiro estágio de
um foguete que pode nos levar ao
desenvolvimento. Mas esse primeiro estágio é apenas condição necessária, não suficiente, para que o Brasil consolide um novo patamar de
desenvolvimento. Os próximos estágios não cairão do céu. O país precisará construí-los com firme ação
do setor privado e do Estado, este
como indutor do desenvolvimento.
Isso demanda investimento colossal
em educação, saúde e infra-estrutura, áreas com escasso progresso no
que depende da ação estatal. Implica
que o governo deixe de ser um peso
morto e busque aumentar sua produtividade. Implica reformas estruturais em diversas áreas.
A boa notícia é que temos algum
tempo para construir essas condições. A má notícia é que não será o
governo Lula, por absoluta inépcia, a
fazer o que é preciso.
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, 64, engenheiro e
economista, é economista-chefe da Quest Investimentos.
Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações
(governo FHC).
lcmb2@terra.com.br
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