São Paulo, sábado, 22 de março de 2008

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OPINIÃO

Equipe econômica estimulou expansão do crédito, que favoreceu classes mais baixas

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A preocupação do governo em fazer um ajuste fino para evitar descompasso entre o crescimento da economia e a capacidade de as indústrias ofertarem bens e serviços é legítima e deve fazer parte da pauta de prioridades em qualquer país do mundo. No entanto, cabem algumas considerações no caso brasileiro.
Primeiro, as pessoas que estão consumindo abundantemente (a ponto de sofrerem ameaça do Banco Central de uma penalização com aumento dos juros e merecerem uma espécie de puxão de orelhas do ministro da Fazenda, como faz parecer a discussão atual sobre medidas para conter o crédito excessivo) foram amplamente estimuladas pelo próprio governo a fazer isso.
Nos últimos anos, por determinação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a equipe econômica não só adotou medidas de estímulo ao crédito como comemorou publicamente os resultados obtidos. Base eleitoral deste governo, as classes C, D e E, que têm renda mais baixa, foram recebidas com festa no mercado de consumo e financiaram suas compras com crédito fácil e farto.
Os bancos do governo, como a Caixa Econômica e o Banco do Brasil, foram encarregados de cumprir a política de governo de abrir as portas a esse público e puxar os juros de mercado para baixo.
A determinação do governo de elevar o volume de empréstimos no país seguiu até mesmo quando o Banco Central dava sinais de que era hora de parar um pouco para conter risco de descontrole da inflação, como aconteceu na virada de 2004 para 2005.
Enquanto o BC tentava desacelerar a economia elevando juros, o resto do governo dava impulsos não apenas fortalecendo o mercado de crédito mas também aumentando os gastos públicos. Afinal, crédito não é a única coisa que estimula e economia.
Aumentos salariais, programas sociais, reajustes do salário mínimo acima da inflação, elevação das despesas do governo e o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) também têm impacto no aumento do PIB (Produto Interno Bruto), e não deve ser surpresa para um governo que essas políticas tenham levado a determinado nível de crescimento, que não era bem o que se pretendia.
O foco da discussão atual para conter o crescimento do mercado de crédito -a redução da quantidade de parcelas dos financiamentos- atingirá diretamente os novatos dessa onda, a base eleitoral do presidente Lula. São especialmente eles, as classes C, D e E, que precisam de mais tempo para pagar. Com isso, diminuem o valor da prestação, de forma que ela caiba no orçamento das famílias.
Agora, essas pessoas terão que entender que as TVs, as geladeiras, os sofás e até mesmo os carros zero-quilômetro que elas compraram ajudaram a criar um problema para a economia brasileira -e não o descompasso entre Fazenda e Banco Central para adotar medidas que sigam um projeto de governo. Talvez se a equipe econômica estivesse realmente em sintonia nos últimos anos, em vez de cada um ir para um lado, a situação hoje não teria chegado a esse ponto, e oferta e demanda estariam mais equilibradas.
(SHEILA D'AMORIM)


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