São Paulo, domingo, 22 de abril de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Pequena copia grande para evitar imposto

Fabricantes de refrigerante abrem unidade em Manaus em busca de benefícios fiscais

Empresas ligadas à Afrebras dizem que recorrerão à SDE contra práticas de AmBev e Coca-Cola, que rebatem as acusações

FÁTIMA FERNANDES
CLAUDIA ROLLI

DA REPORTAGEM LOCAL Um pool formado por fabricantes regionais de refrigerantes decidiu copiar o modelo de produção da Coca-Cola e da AmBev na Zona Franca de Manaus -que dispõe de benefícios fiscais- e pedir investigação da SDE (Secretaria de Direito Econômico), ligada ao Ministério da Justiça, sobre práticas das duas empresas que resultariam em concorrência desleal.
Com fábricas em Manaus, Coca-Cola e AmBev vendem insumos às coligadas e, com essa operação, repassam crédito de 27% do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) às afiliadas -o mesmo benefício é concedido a todas as empresas do setor de bebidas instaladas naquela região.
Para também ter direito a esse benefício fiscal, cinco fabricantes de refrigerantes investiram R$ 2,5 milhões para montar a Sulamerica Importação e Exportação de Concentrados de Bebidas, na Zona Franca de Manaus (AM).
Fabricantes regionais de refrigerantes reunidos na Afrebras, associação que representa 105 empresas, afirmam que Coca-Cola e AmBev são ainda beneficiadas pela legislação sobre IPI, PIS e Cofins. Esses tributos incidem sobre as unidades vendidas -e não sobre o valor das vendas (faturamento).
"Isso é a mesma coisa que dizer que o imposto de um Fusca é o mesmo do de um BMW. Quem vende mais barato, caso dos fabricantes regionais de refrigerantes, paga imposto proporcionalmente maior sobre o preço. Por que essa legislação tributária vale só para refrigerantes?", questiona Fernando Rodrigues de Bairros, presidente da Afrebras.
"Com toda essa situação, o jeito foi copiar o modelo deles [de instalação de fábricas na Zona Franca] para ter mais eficiência", afirma Edson Bruehmueller, gerente comercial da Refrigerante Marajá, de Mato Grosso, uma das empresas que participam do pool para produzir concentrado na ZFM.
A Marajá, assim como a Coca-Cola, também importa xarope de duas empresas situadas em Atlanta (EUA), onde está a Coca-Cola.
Representantes das empresas de maior porte discordam dos argumentos da associação de fabricantes regionais e informam que o setor de refrigerantes não é o único que tem esse sistema de tributação.
Em 2006, diz a Afrebras, os fabricantes regionais pagaram 40,62% em tributos -IPI, PIS, Cofins e ICMS considerado de 18%- sobre o preço médio de R$ 1,64 (preço identificado pela Afrebras) de uma garrafa de dois litros. Coca-Cola e AmBev pagaram 33,08% sobre o preço médio de R$ 2,46 da mesma embalagem.
O IPI incidente sobre a venda de refrigerante é fixo -R$ 0,24 por unidade. No caso do PIS e da Cofins, os fabricantes pagam R$ 0,131 por unidade. O ICMS considerado foi de 18%, o que dá R$ 0,30 por litro para quem vendeu a R$ 1,64 e R$ 0,44 para quem vendeu a R$ 2,46.
Os dados constam de estudo do IBPT (Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário) para a Afrebras, feito em 2005, e considera os preços de venda ao consumidor. A associação ressalta, entretanto, que, mesmo se considerados os preços de fábrica, os fabricantes regionais estão pagando "proporcionalmente" mais imposto do que as grandes companhias. "É só verificar os preços de fábrica nas notas fiscais para confirmar isso", afirma Bairros.

Representação na SDE
A Afrebras deve formalizar amanhã uma representação na SDE para investigar a atuação da Coca e da AmBev, que estariam utilizando "práticas que causam sérios danos à concorrência e a toda a coletividade".
A associação quer a avaliação da SDE quanto a: 1) aquisições realizadas pelas duas companhias -vai pedir, por exemplo, a revisão na aquisição da cervejaria Cintra pela AmBev; 2) prática de compra de espaços nas redes de supermercados; 3) política de preços; 4) legislação tributária para o setor de refrigerantes.
Em 2006, segundo informa a Afrebras, Coca-Cola e AmBev tinham 74,4% de participação no setor de refrigerantes, fatia que cresce desde 1999, quando as duas detinham 67%. Os fabricantes regionais, que respondiam por 33% desse mercado em 1999, terminaram 2006 com 25,6% de participação. Sobre o faturamento do setor (R$ 17,5 bilhões em 2005), nos cálculos da Afrebras, as grandes participam com 89% e, as pequenas, com 11%.
O presidente da Afrebras informa que as duas companhias também interferem diretamente na política de preços do setor. "Uma das práticas mais comuns é a promoção cruzada. Elas diminuem o preço de uma marca de grande presença no mercado. Assim, obrigam os fabricantes a acompanharem. Mas, em contrapartida, aumentam o preço de certa marca líder para inviabilizar a iniciativa e sobrevivência de empresas do setor", informa a Afrebras na representação à SDE.
O fato de a legislação tributária no setor de refrigerantes considerar as unidades vendidas -e não o faturamento das vendas- é outro ponto a favor das grandes companhias, na avaliação da Afrebras.
"Proporcionalmente, as empresas que vendem por preços mais baixos pagam mais tributos do que as grandes corporações. Isso promove e agrava as desigualdades dentro do setor, da mesma forma que interfere na concorrência", diz a Afrebras no documento encaminhado à SDE.
A associação também recorreu três vezes, nos últimos oito meses, à Receita Federal para mudar o atual sistema.


Texto Anterior: Frase
Próximo Texto: Dicas ajudam a pagar menos ou a restituir mais IR
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.