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OPINIÃO ECONÔMICA
Nem o genial Mário conseguiu
BENJAMIN STEINBRUCH
O economista Mário Henrique Simonsen foi o todo-poderoso ministro da Fazenda do
governo Ernesto Geisel, de 1974 a
1978. Com a posse de João Figueiredo, o último presidente do regime militar, assumiu o Ministério
do Planejamento, mas ficou apenas alguns meses no cargo. Pediu
demissão para reassumir sua cadeira na Fundação Getúlio Vargas.
Morto em 1997, aos 61 anos, Simonsen já entrou para a história
como um dos brasileiros mais brilhantes de todos os tempos. Embora fosse viciado na complexidade da econometria e da matemática, resolvia os problemas do dia-a-dia do ministério com simplicidade e humor.
Está no livro "Mário", organizado pelos jornalistas Coriolano
Gatto e Luiz César Faro, um fato
ocorrido durante o governo Geisel, quando os Estados Unidos
tentaram aumentar a alíquota de
importação de calçados brasileiros. O efeito negativo dessa medida para a indústria nacional fez
soar um sinal de alerta no Itamaraty, que passou a fazer gestões
diplomáticas contra a taxação
em Washington.
Simonsen decidiu agir por conta própria. Redigiu um decreto
que aumentou o imposto de importação de fitas de cinema e fez
uma cópia da minuta chegar às
mãos do lobista de Hollywood no
Brasil, Harry Stone. Não houve a
taxação dos calçados nem a do cinema, e o Itamaraty comemorou
o desfecho como resultado de suas
gestões. Simonsen, quieto no seu
canto, morreu de rir.
Conto isso para dizer que Simonsen, com todo o seu brilhantismo, foi parcialmente derrotado
numa batalha que travou durante o governo Geisel para reduzir o
ritmo de crescimento da economia.
Essa situação vivida nos anos
1970 é impensável nos dias de hoje, marcados pela retração econômica. Naquela época, o Brasil vinha de um período de expansão
acelerada do PIB: 10,4% em 1970,
11,4% em 1971, 11,9% em l972 e incríveis 13,9% em 1973. Mas, nesse
ano, estourou a crise do petróleo.
De uma hora para outra, os
membros da Opep organizaram
um cartel que multiplicou por
quatro os preços do barril do óleo
cru. O Brasil, grande importador,
não tinha dólares suficientes para
continuar comprando todo o petróleo que necessitava, a menos
que se endividasse de forma perigosa.
Simonsen adotou então a política do "desaquecimento", termo
que frequentou as manchetes de
jornais diariamente a partir de
1974. A idéia era que, reduzindo o
ritmo de crescimento, as importações de petróleo cairiam e com isso seria possível equilibrar as contas externas e impedir o aumento
da dívida em dólares.
Durante quatro anos, Simonsen
usou um arsenal de medidas econômicas para desaquecer a economia, mas não alcançou plenamente o objetivo. O máximo que
conseguiu foi reduzir a taxa de
crescimento para 4,9% em 1977 e
em 1978. Ao deixar o governo, em
1979, a dívida externa brasileira
tinha quase triplicado em relação
à de 1974 e chegou a US$ 49 bilhões. O nível era absurdamente
alto para a época e foi o estopim
das crises de balanço de pagamentos que o país enfrentou na
década de 1980.
A lição desses tempos de Simonsen é que a economia brasileira
tem propensão ao crescimento. As
estatísticas do século 20 também
comprovam isso. O Brasil foi o
país com maior expansão econômica de 1900 a 1980. Nesse período, o PIB cresceu cerca de 1.200%.
Em todo o século, o aumento foi
de 1.400%.
As dificuldades que o país enfrenta hoje, portanto, devem ser
consideradas como passageiras. O
padrão histórico brasileiro de
crescimento econômico é muito
mais elevado que o atual. Crescer
e criar renda nunca foram problema para o Brasil. Nosso calcanhar-de-aquiles é a distribuição
da renda criada, esta sim uma
chaga secular no país.
O Brasil pode, sim, retomar o
caminho do investimento, da
criação de renda e da geração de
empregos. O Banco Central deve
fazer amanhã, se as previsões do
mercado se confirmarem, a primeira redução importante dos juros no governo Lula (no mês passado, a taxa caiu apenas 0,5 ponto percentual).
Espera-se que esse seja o sinal
para a nova fase de desenvolvimento que o país aguarda, com
investimento público e estímulo
ao privado. Felizmente, a história
mostra que a economia não precisa de grandes anabolizantes para crescer. Na verdade, é necessário ter muita competência para
segurar o crescimento. Nem o genial Mário conseguiu.
Benjamin Steinbruch, 50, empresário,
é presidente do conselho de administração da Companhia Siderúrgica Nacional.
E-mail - bvictoria@psi.com.br
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