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Cliente sob suspeita traz dilema a bancos
Caso do HSBC, que financia usina autuada por supostas condições degradantes de trabalho, revela conflitos para preservar imagem
Instituições financeiras que se comprometem a seguir padrões socioambientais em empréstimos enfrentam desafios para evitar perdas
JULIO WIZIACK
DA REPORTAGEM LOCAL
Eleito pelo jornal "Financial
Times" como um dos mais severos na concessão de crédito,
o HSBC financia no Brasil a
usina de álcool Pagrisa, autuada no início do mês pelo Ministério do Trabalho por ter mantido em sua fazenda, em Ulianópolis (PA), 1.108 funcionários em supostas condições de
trabalho análogas à escravidão.
O financiamento, feito há
dois anos, seria quitado em
2010. Com o processo aberto
pelo ministério -cuja conclusão está prevista para o início
desta semana-, a Pagrisa pode
entrar para a lista suja das
companhias brasileiras, e isso
arranharia a imagem do HSBC.
A usina nega irregularidades.
Tecnicamente, não há nada
de errado no financiamento do
HSBC à Pagrisa -ocorrido antes da autuação do ministério.
O rigor do banco na avaliação
do risco de crédito chega a ser
exagerado em alguns quesitos.
Além disso, não há como prever que, após a concessão do
crédito, as empresas infringirão uma cláusula do contrato.
O problema é que, em momentos de crise, os bancos não
costumam manter a transparência exigida das empresas
que pedem recursos. "Eles gostam de placas dizendo que financiam obras monumentais e
jogam histórias comprometedoras debaixo do tapete", diz
Gustavo Pimentel, gerente do
Projeto Eco-Finanças da ONG
Amigos da Terra.
Por meio de sua assessoria, o
HSBC alegou sigilo bancário
para não se pronunciar sobre o
caso. Mas o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social) confirma
que o HSBC usou o Finame no
repasse de recursos à Pagrisa.
O Finame é uma linha de
crédito oferecida pelo BNDES
para a compra de máquinas e
equipamentos a juros mais baixos que os de mercado. Os contratos são firmados entre o
BNDES e os bancos comerciais
da praça, que transferem o dinheiro às empresas- geralmente em parcelas- cobrando
uma taxa pelo serviço.
Riscos
Na transação com a Pagrisa, o
HSBC assumiu todos os riscos.
Aí começa a confusão. Na semana passada, a usina teve seus
contratos de venda de álcool
cancelados por BR Distribuidora, Esso e Texaco.
Signatárias do Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo, essas companhias
deixaram de comprar por mês 5
milhões de litros de álcool.
"Sem essa receita, corremos
o risco de fechar", afirma Marcos Zancaner, um dos proprietários da usina.
As chances de a Pagrisa não
pagar o financiamento são
grandes. Caso o processo aberto pelo Ministério do Trabalho
termine em condenação, o
BNDES deverá ordenar ao
HSBC a suspensão das parcelas
restantes do financiamento.
Segundo a Pagrisa, os recursos foram liberados de uma só
vez, e isso levaria o HSBC a "devolver" os recursos ao BNDES
sob o risco de responder junto
com a empresa por possíveis irregularidades.
É o que prevêem os Princípios do Equador, um conjunto
de normas definidas pelo Banco Mundial que regulam a concessão de créditos.
Pelas normas, não pode haver dinheiro para quem destrói
o ambiente ou mantém funcionários em condições degradantes de trabalho. Em caso de irregularidades comprovadas
após a liberação dos recursos, o
crédito tem de ser cortado para
evitar a co-responsabilização.
O desafio para os bancos é a
superação dos conflitos de interesse. Muitas vezes os sócios ou
acionistas majoritários das empresas que batem às portas dos
bancos pedindo empréstimos
têm, em geral, conta corrente e
de investimento abertas na instituição que concede o crédito.
A Pagrisa agora tenta provar
sua inocência ao Ministério do
Trabalho e evitar o pior. Cedendo ao apelo da bancada do Pará
no Congresso, o ministro Carlos Luppi recebeu o dono da
usina na semana passada.
Mesmo que a empresa seja
condenada, poderá ainda evitar
sua inclusão no cadastro nacional das empresas que contratam mão-de-obra análoga à escrava por meio de liminar, procedimento adotado por 30
companhias brasileiras.
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