São Paulo, quarta-feira, 22 de setembro de 2004

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LUÍS NASSIF

Uma visão do risco Brasil

A teoria é uma abstração, um ferramental utilizado para entender a realidade. São raríssimos os economistas que conseguem casar esse duplo conhecimento -o da teoria e o da prática. Menos ainda os que conseguem tirar lições dessa capacidade de apreender a realidade.
Uma das exceções é o economista Paulo Tenani, estrategista do UBS Wealth Management. Seu artigo "Risco Brasil e Portfólio Global" é um achado relevante para entender um dos enigmas da economia atual: por que o risco Brasil sempre sobe se, desde 1994, os "fundamentos" internos vem melhorando?
Há uma década, por meio do Plano Brady, o Brasil securitizou sua dívida, ou seja, transformou-a em títulos soberanos, emitidos e negociados no mercado. Com o livre fluxo de capitais, o preço dos ativos domésticos passou a ser dado por arbitragem, diretamente influenciada pelo tal risco Brasil -o diferencial entre as taxas de juros mundiais e as da dívida externa soberana.
Desde o início da série histórica, a taxa de risco Brasil variou de um mínimo de 3,5%, em setembro de 1997, a um máximo de 24%, em setembro de 2002, mantendo-se, em média, ao redor dos 8,1% -0,8 ponto percentual acima da média dos emergentes (7,3%). Pior, a taxa de risco Brasil levou, por arbitragem, ao aumento da dívida pública, e não o contrário.
Tenani vai buscar a explicação na Teoria de Portfólio. Por ela, o risco total de qualquer investimento divide-se em duas partes distintas: o risco não-sistêmico e o risco sistêmico.
Não-sistêmicos são os riscos inerentes ao investimento -no caso do Brasil, os tais "fundamentos" da economia. Sistêmicos, os riscos inerentes ao mercado como um todo.
Para combater riscos não-sistêmicos, a Teoria do Portfólio indica a diversificação de carteiras. Para combater os riscos sistêmicos, indica a diversificação em ativos contracíclicos (aqueles que vão bem quando a economia geral vai mal e vice-versa).
A correlação entre o risco do ativo e do mercado é dada pelo "coeficiente beta". Quanto maior (mais perto de um), significa que está mais colado no risco sistêmico e menos atraente é para o investidor -que passa, então, a exigir uma taxa de retorno maior.
Tenani montou um gráfico com o universo de 25 países emergentes que compõem o Embi Global. O Brasil está destacado no gráfico, com uma taxa de risco de 5,2% e um beta de 0,95. Pelo menos 35% das variações do risco Brasil podem ser explicadas por seu beta, diz ele.
Toda vez que a economia global vai mal, os fundos se desfazem de seus ativos cíclicos. E o Brasil, com seu coeficiente beta de 0,95, é o primeiro a dançar. É esse fenômeno que explica o aumento do risco Brasil, e não os fundamentos da economia.
"Essa conclusão sugere uma lição aos formuladores de política econômica do Brasil; pois os fundamentos domésticos devem ser aperfeiçoados simplesmente pelo bem do país, e não com um olho na diminuição da taxa de risco", conclui ele.

E-mail - Luisnassif@uol.com.br


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