São Paulo, segunda-feira, 22 de setembro de 2008

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"Ninguém sabe de onde virá a próxima crise", afirma professor

Para Jagdish Bhagwati, ações anticrise devem considerar efeitos negativos

BRUNO REIS
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Para o professor de economia da Universidade de Columbia (EUA) Jagdish Bhagwati, ninguém pode prever de onde virá a próxima crise. Ele ressalta, porém, que as medidas geralmente usadas para enfrentar as turbulências, tanto no caso atual como nas crises anteriores, costumam ser tomadas sem "estudo" e "reflexão" sobre suas conseqüências. Segundo ele, em "nenhum dos casos se conseguiu administrar o lado negativo [dessas ações]." Bhagwati diz que a inovação na política financeira não deve ultrapassar o "entendimento dos possíveis "downsides'". Leia a seguir trechos da entrevista concedida à Folha.

 

FOLHA - Qual é a sua opinião sobre a crise vivida nos Estados Unidos?
JAGDISH BHAGWATI
- A crise é realmente grande porque leva ao pânico uma imensa parcela de pessoas que possuem qualquer tipo de aplicação nos bancos ou em fundos, ou aquelas que pagam hipotecas de suas casas, o que inclui uma parcela significativa da população dos Estados Unidos. Leva também ao pânico os bancos, tanto comerciais quanto de investimentos, que correm o risco de falir. Meu contador, um homem esperto, me disse que eu deveria retirar meu dinheiro dos fundos e abrir diversas contas, cada uma com depósitos de US$ 100 [o limite de valor coberto pelo Seguro de Deposito Federal]. Independente da pessoa com quem você conversar, o sentimento generalizado é de que a crise atual lembra a grande crise de 1929. Entretanto, não há paralelo real. A situação atual é complexa, mas está sendo contida. No inicio, a crise de 1929 resultou em terríveis conseqüências, em desemprego maciço e depressão econômica. Até o momento, as demissões têm acontecido apenas nos bancos. A taxa de desemprego não foi afetada de maneira significativa. Segundo, a situação de 1929 testemunhou uma politica monetária restritiva o que acentuou a depressão. Terceiro, as políticas comerciais enlouqueceram em 1930 com a instituição da tarifa "Smoot-Hawley" [que elevou as tarifas sobre produtos importados] por parte dos Estados Unidos, o que provocou retaliações de outros países. Quarto, os responsáveis pela elaboração das politicas econômicas, liderados pelo presidente do Fed (Federal Reserve, o banco central dos EUA), Ben Bernanke, e o Secretario do Tesouro, Henry Paulson, são totalmente pragmáticos e determinados a fazer o que for necessário para encerrar a crise imediatamente.

FOLHA - O que podemos aprender com a crise atual para ajudar na prevenção de crises futuras?
BHAGWATI
- Ninguém sabe de onde virá a próxima crise. Nos últimos tempos, tivemos quatro grandes turbulências: a chamada "segunda-feira negra", em outubro de 1997, quando os mercados despencaram e todos acharam que o próprio capitalismo tinha desmoronado junto. Mas não foi daquela vez. Depois veio a crise do fundo LTCM [Long Term Capital Management], hedge fund que super alavancou seus investimentos e gerou um grande temor de que a crise atingisse todo o sistema, por conta do altíssimo envolvimento de bancos e fundos de pensão. Tivemos também a crise do leste asiático, que começou em julho de 1997 e durou ate 1998. Finalmente chegamos à crise atual. Qual e o tema recorrente? Em cada situação, nos entregamos sem pensar à euforia que surge com cada inovação da política financeira. Em resumo, em quase todos os casos, o problema foi que novos instrumentos e politicas financeiras foram implementados sem suficiente estudo e reflexão sobre seus efeitos e conseqüências. Em nenhum dos casos, se conseguiu administrar o lado negativo. O que eu considero ser a maior lição disso tudo é que a inovação não ultrapasse o entendimento dos possíveis "downsides".

FOLHA - As medidas atuais são adequadas para resolver a crise?
BHAGWATI
- Acho que Bernanke e Paulson estão agindo corretamente. Intervieram com firmeza, tomando todas as medidas possíveis. Se eu fosse um cartunista, desenharia uma charge colocando a crise do subprime como o bebê de Rosemary, dentro de uma banheira. Bernanke e Paulson, estariam ao lado da banheira segurando mangueiras com os dizeres: política monetária, política fiscal, nacionalização de Freddie Mac and Fanny Mae, e por último, RTC. Evidentemente, Bernanke e Paulson tem uma tarefa gigantesca e ninguém sabe a real dimensão da crise, nem agora nem depois que as medidas adotadas começarem a surtir efeito, revertendo a falta de confiança que abala seriamente o sistema.


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