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LUÍS NASSIF
Monetarista de
uma nota só
Confesso não ter assistido ao
ex-presidente do Banco Central
Gustavo Franco, na entrevista
em que teria sugerido a elevação dos juros para combater a
inflação e presumivelmente
ironizado as políticas cambial e
monetária de seus sucessores.
De qualquer modo, é bom
motivo para alguns exercícios
de relação de causa-efeito, ultimamente bastante ignorados
na análise econômica "fast
food".
1) Os dois principais fatores
de aumento de custos das empresas (que agora ameaçam ser
repassados para preços) são o
câmbio e o arrocho fiscal e tarifário empreendidos pelo governo este ano.
2) Os arrochos fiscal e tarifário se devem à meta firmada
com o FMI, que não saiu do nada: foi fixada tendo em vista a
estabilização da relação dívida
pública versus PIB. Se a dívida
pública fosse menor, o arrocho
fiscal seria menor e seus efeitos
deletérios, minimizados. Logo,
o que condicionou a necessidade desse superávit fiscal foi o
aumento desproporcional na
dívida pública ocorrido nos últimos anos -por culpa da política de juros praticada pelos senhores Gustavo Franco, Francisco Lopes, Gustavo Loyola,
entre tantos outros.
3) Há algumas maneiras de
tentar evitar a elevação do
câmbio. Suponhamos que o BC
aceitasse os conselhos de Franco e subisse os juros. Obviamente, a dívida pública voltaria a
entrar em curva de crescimento, trazendo a necessidade de
superávit fiscal ainda maior e
ampliando as desconfianças
dos investidores. Recorde-se de
que Franco e Lopes conseguiram arrebentar com as contas
externas do país praticando as
mais elevadas taxas de juro do
mundo.
4) Com poucos limites para
cortes de despesa, para aumentar juros sem esfrangalhar as
contas fiscais, o governo teria
que proceder a novos aumentos
de impostos, com mais impacto
sobre os custos das empresas e
sobre o nível de atividade. O
país está fazendo das tripas coração para manter estável a dívida pública, deixada por
Franco, nos níveis atuais de juros. Como julgar que há espaço
para mais aumento de juros,
mais aumento da dívida e mais
arrecadação fiscal? Qual a fórmula proposta por ele para aumentar os juros sem aumentar
a dívida? Não vale propor aumento de juros sem apontar as
contra-indicações. Nem vale
responder que problema fiscal é
com outro departamento.
O importante nessa história é
que as metas fiscais firmadas
com o FMI já conseguiram trazer de volta a inflação e abortar
o início da retomada do desenvolvimento no primeiro semestre. Os principais projetos do
governo para o ano 2000
-"Brasil em Ação" e "Avança
Brasil"- já estão comprometidos pela falta de recursos. Conforme reportagem recente da
Folha, foram liberados apenas
36% dos recursos do "Brasil em
Ação" devido ao contingenciamento imposto pela Fazenda.
Certamente o PPA vai pelo
mesmo caminho, sem contar
cortes para bolsas de estudo,
saúde e programas sociais.
Portanto, se o aumento de juros aumenta a dívida pública e
provoca a necessidade de mais
aumento ainda nos superávits
fiscais; se, hoje em dia, esses superávits estão sendo bancados
com o sacrifício de investimentos fundamentais para garantir o futuro do país, não seria a
hora de Gustavo Franco pegar
sua inteligência privilegiada
(sem ironias) e tentar ajudar o
país a pensar outras alternativas, que não a simples elevação
das taxas de juro?
Que tal ressuscitar o brilhante ensaísta, com trabalhos memoráveis sobre o Encilhamento
e a hiperinflação, e deixar de
lado esse monetarista de uma
nota só, que decididamente
não está à altura do seu brilho?
Não é nem por questão de
ideologia. É apenas por um
melhor aproveitamento de sua
inteligência.
E-mail: lnassif@uol.com.br
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