São Paulo, terça-feira, 22 de outubro de 2002

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OPINIÃO ECONÔMICA

Linha de largada

BENJAMIN STEINBRUCH

A julgar pelas pesquisas, só um milagre tira a eleição de Lula. Tudo indica que o PT chegará ao poder com mais de 50 milhões de votos na eleição presidencial deste domingo. Então, mesmo alertado pela máxima do futebol de que o jogo só "acaba quando termina", já dá para fazer algumas considerações sobre as razões dessa provável vitória de Lula e sobre as obrigações de vencedores e vencidos.
O PT deve ir para o poder por uma razão aparentemente simples: a população brasileira quer mudar e entende que um grupo político ligado à produção e ao emprego, neste momento, é o mais adequado para unir o país e fazer as mudanças que a gestão neoliberal de Fernando Henrique Cardoso não conseguiu. Não há nenhuma novidade nisso. No Reino Unido, por exemplo, os trabalhistas de Tony Blair ganharam o governo depois das gestões conservadoras de Margaret Thatcher e John Major. Sem querer comparar Blair com Lula, o fato é que, nos dois casos, um partido mais à esquerda foi guindado para reequilibrar o país depois de um largo período de reformas de viés conservador.
Nessas condições, se as urnas confirmarem as pesquisas, Lula assumirá a Presidência com a responsabilidade de cumprir algumas tarefas que Fernando Henrique Cardoso não conseguiu. O desemprego é o maior eleitor de Lula. Ainda que o candidato do governo, José Serra, prometa criar 8 milhões de vagas, ele não consegue responder a uma pergunta básica: por que seu partido não fez isso nos oito anos de poder?
Então, caberá a Lula propor um plano agressivo de estímulo ao crescimento econômico para gerar empregos sem descuidar da estabilização. Essa é uma tarefa difícil para qualquer governo. Porém ela se torna impossível quando as autoridades, como as da atual equipe econômica, não têm apetite para priorizar o desenvolvimento. Quase todas as mazelas brasileiras decorrem, em última instância, da falta de empregos: a fome, a desigualdade, a violência, a deseducação e a precariedade da saúde e da habitação. Só a oferta de trabalho não resolve esses problemas, mas certamente os atenua bastante.
Os que devem vencer a batalha de domingo deveriam pensar numa coisa básica: não podem e não devem tripudiar sobre os derrotados, exagerar nas comemorações ou partir para provocações. Na quarta-feira passada, no clássico São Paulo e Santos, o jovem atacante santista Diego caiu na tentação de comemorar um gol do Santos sobre o escudo do tricolor. Provocou os jogadores adversários e criou grande confusão, porque pisou no símbolo do São Paulo. O PT, se de fato ganhar as eleições no domingo, não deve cometer o erro de pisar em símbolos dos perdedores, até porque precisará deles para governar a partir de 1º de janeiro. Fernando Henrique Cardoso, por exemplo, precisa ser preservado pelo que fez em seus oito anos e pelo que ainda pode ajudar a fazer.
Aos que devem perder, sempre segundo as pesquisas, seria interessante lembrar que a guerra acaba domingo. Eles já foram acusados de promover "terrorismo eleitoral" durante a campanha e não podem cair na tentação de continuar na tática de amedrontar e incendiar o país. Lula, como qualquer outro que se elegesse, enfrentará momentos difíceis: a inflação está em alta; a economia, estagnada; e a credibilidade do Brasil no exterior, abalada, não só por razões econômico-financeiras mas também pela violência e pela insegurança. Entre parênteses, vale citar aqui uma frase que o professor da Universidade de Chicago e Prêmio Nobel de Economia de 1992, Gary S. Becker, escreveu em um artigo sobre as eleições brasileiras na "BusinessWeek" da semana passada: "O Rio de Janeiro foi a única cidade do mundo em que eu tive de tirar o relógio para caminhar em um bairro chique".
Por tudo isso, será desonesto começar a culpar Lula e o PT a partir de 1º de janeiro, ou mesmo já antes da posse, por problemas que não foram criados pelo seu governo. É preciso dar tempo aos vencedores.
A esses -e outra vez lembro que faço esses comentários confiando nas pesquisas-, seria interessante lembrar que, terminada a batalha da eleição, no próximo domingo, terão chegado apenas à linha de largada.
Eu confio em que Lula, se tiver apoio não ressentido da sociedade, inclusive das classes empresariais, poderá ser um grande presidente. Sem diploma universitário, mas com garra, honradez, coragem e sentimento nacional. O Brasil precisa disso.


Benjamin Steinbruch, 49, empresário, é presidente do conselho de administração da Companhia Siderúrgica Nacional.

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bvictoria@psi.com.br


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