São Paulo, sexta-feira, 22 de outubro de 2004

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BASTIDORES

Alta causa conflito interno

KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A elevação da taxa básica de juros acima do esperado desencadeou conflitos no governo. O ministro da Casa Civil, José Dirceu, reclamou ontem da decisão do Copom (Comitê de Política Monetária) em conversa com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. E as equipes do Ministério da Fazenda e do Banco Central trocam críticas nos bastidores a respeito da correção da medida.
Do ponto de vista público, a cúpula do governo vai procurar abafar a versão de conflitos internos a respeito da decisão de anteontem, que elevou a Selic de 16,25% para 16,75% ao ano. Nos bastidores, porém, a "confusão" já começou.
Cobrado por Lula a dar explicações, o ministro da Fazenda, Antonio Palocci Filho, disse a ele que os dois últimos aumentos da Selic (de 0,25 ponto percentual em setembro e de 0,50 ponto agora) foram uma forma de combater uma "bolha inflacionária" e que, no início de 2005, será retomada a trajetória de queda da taxa.
Lula era contra os dois aumentos, o que manifestou a Palocci e a Henrique Meirelles, presidente do BC, mas não teve sua opinião levada em conta pelo Copom. A segunda alta (0,50 ponto) o surpreendeu e o contrariou. Mas, como de hábito, ele mantém o apoio público ao Banco Central, dizendo que prefere fazer as coisas com calma, mas fazê-las direito.
Nas conversas internas, porém, o tom das manifestações dos membros do governo é oposto. A começar da Fazenda, em que o secretário de Política Econômica, Marcos Lisboa, e o secretário do Tesouro, Joaquim Levy, criticam a atuação de Afonso Bevilaqua, que até a reunião do Copom comandava interinamente a diretoria de Política Monetária e que, com a chegada de Rodrigo Azevedo, reassumiu ontem a diretoria de Política Econômica do BC.
Para Lisboa e Levy, Bevilaqua lidera um grupo interno no BC que é o mais influente e com uma visão mais pró-mercado do que a dos demais diretores. Com a chegada de Azevedo, a diretoria do BC volta a ter nove integrantes (incluindo Meirelles).
Lisboa e Levy avaliam que foi Bevilaqua quem liderou movimento para impedir queda maior da Selic quando isso era possível e que, agora, foi o principal defensor de uma alta maior. Como vazou para a imprensa que havia um trio mais pró-mercado, o Copom tomou decisão unânime anteontem para evitar carimbos específicos e mostrar que não se curva à pressão política.
Bevilaqua, ex-professor da PUC-RJ, é visto no Planalto como o homem mais influente do BC. Avesso a políticos, costuma dizer que não foi nomeado diretor para atender congressistas e os encaminha para assessores.
Já Lisboa e Levy têm duas preocupações principais em relação às decisões do BC. Primeira: temem que mine a retomada do crescimento econômico, por influírem negativamente nas expectativas dos empresários. Segunda: quanto mais alta a Selic, mais cresce a dívida pública. Levy, do Tesouro, queria fechar 2004 com queda na relação entre a dívida pública e o PIB (Produto Interno Bruto). As decisões do Copom, no mínimo, dificultam isso.

Dirceu e superávit primário
Em reunião com Lula, Dirceu lembrou que a recente elevação da meta do superávit primário deste ano, de 4,25% do PIB para 4,5%, foi vendida por Palocci como medida para frear a necessidade de alta dos juros logo após a reunião de setembro. Para o chefe da Casa Civil, o "sacrifício" de elevar o superávit (economia para pagar os juros da dívida) está sendo desconsiderado pelo BC.


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