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OPINIÃO ECONÔMICA
Alisamento cambial
BORIS TABACOF
A política do câmbio é uma
das variáveis determinantes
da sustentabilidade deste novo
momento de crescimento da economia brasileira.
Os instrumentos macroeconômicos adotados, de claro efeito
contracionista, têm sido objeto de
exaustivas, embora pouco concludentes, discussões e explicações, hoje um pouco amainadas
pelo crescimento econômico de
algo como 4,5% da economia nacional neste ano. Mas permanece
a dúvida cruel da sua sustentabilidade.
A política cambial, que determina o valor da moeda brasileira em
relação às moedas mais poderosas, como o dólar norte-americano, tem pouca visibilidade pública, a não ser nas compras dos turistas que andam pelo mundo
afora.
A participação do Brasil no comércio mundial vem diminuindo, considerando o dinamismo
crescente e as transformações das
economias das sociedades desenvolvidas e a ascensão dos países
asiáticos. Em 1950, as nossas exportações e importações representavam 2,6% e 1,7%, respectivamente, dos fluxos de comércio
internacional. Em 2003, caímos
para 1,0% e 0,6%.
Mas, embora, em termos relativos, tenhamos caído de posição
por miríades de razões, a balança
comercial tem crescido de maneira importante em termos de números absolutos. Considerando
que os outros vetores da economia provocam constrangimentos, é fácil concluir que o setor externo é quem puxa a maior parte
do dinamismo, embora reduzido,
da vida econômica do país.
Um dos feitos mais importantes
da economia do país nos anos recentes tem sido a crescente cultura exportadora dos empresários
brasileiros. De uma atitude de
considerar, com algumas exceções, o mercado externo como
um escoadouro eventual dos produtos que encontram dificuldades de colocação no âmbito doméstico, o mercado global passa a
ser um campo permanente de
ação. Vários setores já incluem
essa perspectiva internacional na
sua estratégia, dimensionando
por aí os investimentos no aumento da capacidade produtiva.
A adoção do câmbio flutuante
foi um avanço importante. O longo período em que a cotação do
real em relação ao dólar foi mantida praticamente fixa e previsível
em níveis artificialmente elevados
causou estragos consideráveis na
estrutura empresarial brasileira.
A partir de 1999, com a nova posição cambial, puderam acontecer
a evolução positiva da balança comercial e a criação da mentalidade exportadora que começa a se
enraizar.
Mas é inegável que o pêndulo da
taxa cambial brasileira está oscilando de forma que já perturba
esse quadro. A moeda brasileira
está ficando de novo superavaliada em relação ao dólar. A médio
prazo, certamente o câmbio vai se
tornando desfavorável aos exportadores, favorecendo a competição dos importados e tornando
menos interessantes os investimentos estrangeiros diretos.
Esse movimento é agravado pelo aumento dos custos internos
incorridos pelos produtores nacionais. Recentes levantamentos
demonstram graficamente como
a curva dos custos ultrapassa a da
taxa de câmbio a partir de meados de 2003, não somente em relação ao dólar, mas a uma cesta de
moedas dos 20 principais parceiros comerciais do Brasil. A partir
de junho deste ano, a perda é de
10% do seu valor real. Se tomarmos a taxa cambial de janeiro de
2002 como índice 100, estamos
em 89,5 em setembro deste ano. E
essa tendência de valorização do
real continua, alimentada pela
performance comercial, o que é
bom, mas também pelo ingresso
de capitais de risco de investidores internacionais, atraídos pelos
juros que o Brasil paga. Sabemos,
por experiência, que essa situação
pode inverter-se, o que, de novo,
deixaria a nossa posição externa
em situação crítica.
É notório que não existe mercado de moedas completamente
limpo, mesmo nos países mais liberais. Os países asiáticos, principalmente a China, utilizam a intervenção no câmbio, mantendo
suas moedas desvalorizadas, o
que ajuda a explicar a sua imensa
competitividade no comércio e
nos investimentos.
O Brasil não pode perder a janela de oportunidade que a situação
favorável global nos oferece. A
ação adequada deve ser uma política de acumulação de reservas
cambiais. Experientes economistas chamam esse processo de alisamento cambial. Consistiria em
operações com as reservas líquidas do país, obviamente muito
baixas neste mundo difícil e mutável. Só para exemplificar: as reservas da China são de US$ 483
bilhões; as da Índia, de US$ 113 bilhões; as do México, de US$ 61 bilhões; e as da Rússia, de US$ 94 bilhões.
O Tesouro Nacional deveria caminhar para a eliminação da
emissão de títulos indexados à taxa de câmbio, e o Banco Central,
as operações de "swap" cambial.
O Tesouro voltaria a adotar a prática de atender a seus compromissos externos adquirindo dólares diretamente no mercado, sem
utilizar reservas, e o BC adotaria
explicitamente a política de acumulação de reservas, para as
quais poderia se estabelecer uma
meta de US$ 50 bilhões nos próximos três anos.
Essa política poderá gerar um
viés para cima na taxa real de
câmbio e alguma pressão sobre o
nível de preços, que as políticas
monetária e fiscal podem contrabalançar. Os benefícios dessa política, melhorando a liquidez do
país, tão importante nestes tempos incertos, ao mesmo tempo
em que estimulariam as exportações, compensariam plenamente
os eventuais efeitos indesejáveis.
É uma questão de ênfase a ser
dada às questões vitais da política
cambial.
Boris Tabacof é presidente do Conselho
Deliberativo da Bracelpa e vice-presidente do Conselho de Administração da Suzano Bahia Sul.
Excepcionalmente, hoje, a coluna de
Luiz Carlos Mendonça de Barros não é
publicada.
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