São Paulo, segunda-feira, 22 de novembro de 2004

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PREÇOS

Produtos essenciais influenciados pela moeda americana, como farinha de trigo, pesam mais no orçamento de quem ganha menos

Dólar em queda ajuda família de baixa renda

PEDRO SOARES
DA SUCURSAL DO RIO

A forte queda do dólar tem beneficiado as famílias de renda menor, ao reduzir o preço de importantes alimentos da cesta básica. É o que mostra levantamento realizado pela Folha com base em dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
O peso de produtos essenciais influenciados pela cotação da moeda norte-americana é maior no orçamento das famílias que ganham menos. Muitos desses itens registraram queda em outubro: farinha de trigo (3,09%), óleo de soja (2,68%), margarina (2,03%), biscoito (1,42%), pão francês (1,14%), café moído (0,25%) e açúcar cristal (0,45%).
A taxa de câmbio começou a cair com intensidade em meados deste ano -a moeda dos EUA iniciou o semestre a R$ 3,15 e ao final de outubro já estava a R$ 2,85, segundo o Banco Central.
O dólar influencia os preços dos alimentos em duas frentes: nos produtos feitos a partir de matérias-primas diretamente importadas e nos insumos cotados no mercado internacional em moeda forte, como a soja e o trigo.
"Sem dúvida, a queda do dólar dá a sensação de melhora da renda real para as famílias que ganham menos. Sempre existem certos suspiros de consumo em razão do dólar mais baixo. Foi assim no começo do plano real", afirma Carlos Thadeu de Freitas, ex-diretor do Banco Central e economista da CNC (Confederação Nacional do Comércio).
Ao analisar os dados do INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor), que mede a inflação para as famílias com rendimento menor -até oito salários mínimos-, fica claro o efeito favorável para quem tem rendimento menor. Para esse grupo, os preços dos alimentos caíram 0,57% em outubro. Já para a parcela que recebe até 40 mínimos (agrupada em outro índice, o IPCA), a deflação foi de 0,23%.
O motivo é que a alimentação tem peso maior no consumo de quem ganha menos. Sua contribuição é de 30,41% no INPC. Já no IPCA o peso é menor -22,93%.
Alex Agostini, economista da GRC Visão, concorda que a recente trajetória da inflação beneficia os mais pobres: "A queda da inflação tem realmente favorecido as famílias de baixa renda".
A diferença entre o resultado fechado de outubro do IPCA e do INPC também revela esse impacto. Enquanto o IPCA foi de 0,44%, o INPC atingiu apenas 0,17%.
Sob o impulso do dólar, diz Freitas, o comércio venderá mais neste Natal, já que os alimentos importados típicos da época e mesmo bens mais essenciais, cujos preços são influenciados pela moeda norte-americana, vão ficar mais baratos. Os economistas lembram ainda que a retração dos preços dos alimentos, especialmente dos in natura (leite, ovos, hortaliças e outros) e dos que sofrem impacto do dólar, está ajudando a conter a inflação.
Neste ano, para quem tem renda mais baixa, o grupo alimentos e bebidas subiu bem menos do que a inflação média. A alta foi de 2,32%. A maioria dos produtos listados subiu menos do que a variação média dos índices de preços -a inflação até setembro pelo INPC ficou em 4,77%. São exceções o açúcar e o café, que, por problemas climáticos, subiram com força no início do ano.
Um dos itens que mais contribuíram para a redução da inflação foi o óleo de soja, com queda de 4,38% neste ano. Dessa lista, óleo de soja e pão francês estão entre os produtos que mais pesam no grupo alimentação.
Consumidores atestam a recente queda dos preços. "Fui ao supermercado e vi que óleo de soja estava em promoção. Aproveitei e comprei duas garrafas plásticas. Realmente, está bem mais barato. Acho que paguei R$ 1,75. Antes, estava quase R$ 3", disse a dona-de-casa Maria Mavilde Moreira Teixeira, moradora de Botafogo, que vai quase todos os dias ao supermercado. Segundo ela, também baixaram, mas com menos intensidade, os preços do açúcar, dos biscoitos e do pão. "Só a farinha está a mesma coisa."
Fábio Romão, economista da LCA, pondera que a retração dos preços dos alimentos já é um fenômeno estrutural da economia brasileira, iniciado com o Plano Real e mais claramente identificado de 1995 a 1998. "É o período da chamada âncora verde."
Além das flutuações do dólar, tanto para cima como para baixo, afirma, os alimentos foram influenciados por várias mudanças econômicas. Uma delas é o ganho de produtividade no campo e na indústria, que ampliou a oferta de alimentos. "Também favoreceu o recuo dos preços o maior poder de barganha do varejo, que se tornou um gigante a ponto de cobrar da indústria descontos", diz.
Além do efeito dólar, o fato de os combustíveis terem peso maior na inflação de quem ganha mais ajudou a elevar a distância entre o INPC e o IPCA. O peso da gasolina no IPCA é de 4,02%, um dos produtos que mais influenciam a inflação. Já no INPC a participação é menor: 2,09%. A gasolina subiu 6,40% neste ano no IPCA. No INPC, a alta foi de 6,61%.


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