São Paulo, terça, 22 de dezembro de 1998

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

LUÍS NASSIF
Os sinais do mercado

Em sua coluna de ontem, o ex- ministro João Sayad assume um ar quase súplice, sem saber o que fazer para que o governo abra os olhos para romper com a inércia da política econômica atual, e promete passar a noite de Natal rezando para que algo ocorra.
Sayad não está só nessa impotência. Chegou-se a uma situação inédita na vida do país, algo que -segundo outro economista renomado- supera as tragédias gregas. Naquelas, o público sabia do final; os personagens, não. Agora, personagens, público e crítica já sabem qual o resultado final, se nada for feito para romper com essa armadilha de câmbio e juros, mas não se rompe com a inércia.
A não-ação se baseia em princípios supostamente racionais.
1) De fato, errou-se na política cambial, mas agora se está no caminho correto.
2) O momento de mudar a política cambial era seis meses atrás (independentemente do momento em que se esteja falando).
3) O momento de mudar a política cambial é daqui a seis meses (independentemente do momento em que se esteja falando).
4) O câmbio está alinhado pelas desvalorizações progressivas.
Desde 95, todos os argumentos foram utilizados para não se enfrentar um problema que é inevitável. De início, quando o Brasil dispunha de reservas em abundância, apresentaram-se exemplos de países que mudaram o câmbio sem dispor de reservas, para dramatizar os riscos, e não ter de enfrentar o problema. Depois, apostou-se na reestruturação industrial interna -que estava apenas se iniciando- como se fosse a alternativa para enfrentar o problema cambial. E se fez a aposta de que as exportações cresceriam a mais que 12% ao ano.
Quando estourou a crise da Ásia e o comércio internacional refluiu, apostou-se que os países que desvalorizaram suas moedas não recuperariam o dinamismo devido ao encarecimento do componente importado de sua produção. Só que ajustes cambiais são neutros, quando componentes importados se destinam à exportação.
Em todos os momentos, todos os atos de política econômica foram tomados visando os chamados "sinais de mercado". Fazendo o que o mercado quer para o dia seguinte, o futuro estará assegurado.
Também essa aposta se perdeu. A pretexto de defender a moeda a qualquer custo, produziu-se um custo tão extraordinário que a moeda se enfraqueceu. Conseguiu- se a situação de maior fragilidade para uma economia: uma moeda artificialmente valorizada.
Alegou-se que o câmbio estava alinhado usando os mesmos argumentos que eram combatidos pelos defensores do ajuste: a comparação com o preço de paridade da moeda.
É difícil saber, hoje em dia, o que se passa na cabeça do presidente, quando exercita o discurso otimista de quem considera que o país encontrou o rumo, que basta o ajuste fiscal para, no segundo semestre, o fênix emergir das cinzas.
Às vezes bate a esperança de que há um discurso otimista para fora, mas uma visão realista para dentro. Às vezes, vêm informações diferentes, de que o presidente de fato acredita naquilo que diz.
Por aí, é possível entender o desespero do professor Sayad, e de tantos outros que sabem que o prazo está se esgotando. Analistas que sabem que os membros da equipe econômica sabem que não há saída fora o enfrentamento da questão cambial. Mas vão-se pela janela as derradeiras oportunidades de o país superar o desafio, pelo medo de enfrentar a hora da verdade.
Falta um estadista para garantir o segundo governo FHC.


E-mail: lnassif@uol.com.br



Texto Anterior | Próximo Texto | Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.