São Paulo, quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

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Inflação pode forçar BC a elevar os juros

JOSÉ MÁRCIO CAMARGO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Nesta semana, os mercados finalmente colocaram nos preços dos ativos uma recessão na economia americana. A derrocada das Bolsas de Valores, a queda dos preços das commodities, inclusive do petróleo, o aumento da aversão ao risco nos mercados de câmbio, a redução de 0,75 ponto percentual da taxa de juros nos Estados Unidos, tudo aponta para uma recessão na maior economia do mundo.
A recessão nos Estados Unidos terá, fatalmente, efeitos negativos não apenas para as economias desenvolvidas mas também para as emergentes, inclusive o Brasil. Qual o cenário mais provável para a economia brasileira?
A queda dos preços das commodities metálicas deverá gerar uma redução do superávit comercial brasileiro. Como o crescimento da demanda interna (consumo, gastos do governo e investimentos) é maior que o crescimento da oferta de bens e serviços, a diferença está sendo coberta por forte crescimento das importações (40% ao ano). Esse desequilíbrio entre oferta e demanda ainda não gerou pressão inflacionária devido à forte valorização do real ante ao dólar nos últimos anos.
A redução do superávit comercial e o aumento da aversão ao risco muito provavelmente irão reverter a trajetória da taxa de câmbio. Em lugar da forte valorização dos últimos quatro anos, devemos observar estabilidade ou até mesmo alguma desvalorização cambial. Como resultado, os preços das importações e de produtos que competem com as importações passarão a mostrar pressão de alta, explicitando o desequilíbrio entre oferta e procura.
O resultado é que devemos ter maiores pressões inflacionárias em 2008, o que poderá forçar o Banco Central a aumentar a taxa de juros ao longo do ano, reduzindo a taxa de crescimento do PIB dos projetados 4,5% para 3,5% em 2008.
Ainda que esse não seja um cenário particularmente otimista, não se deve exagerar no pessimismo. Em primeiro lugar, o Brasil está mais resistente do que em crises anteriores. Tem uma situação fiscal mais sólida, com quedas sistemáticas da relação dívida/Produto Interno Bruto, superávits na balança comercial e em conta corrente e US$ 185 bilhões de reservas acumuladas.
Por ouro lado, os processos de urbanização na China e na Índia e o deslocamento da produção de alimentos para a geração de energia manterão os preços das commodities agrícolas, das quais somos grandes exportadores, em níveis elevados, reduzindo o efeito da queda dos preços das commodities metálicas sobre as contas externas brasileiras.

Medidas
Em um cenário internacional difícil como esse, cortar os gastos públicos e gerar um superávit fiscal capaz de manter a trajetória da relação dívida/PIB em queda é fundamental. Além de diminuir o excesso de demanda e minimizar o aumento de juros necessário para colocar a inflação dentro da meta, essa decisão teria o efeito de manter a confiança dos investidores nacionais e internacionais nos títulos públicos brasileiros, evitando uma reversão mais forte do fluxo de capitais. Essa é a variável decisiva para que um cenário internacional negativo tenha impacto relativamente pequeno para a economia brasileira. E, felizmente, ela está dentro do controle do governo brasileiro.


JOSÉ MÁRCIO CAMARGO é professor do Departamento de Economia da PUC-RJ e sócio da Tendências Consultoria Integrada.


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