São Paulo, sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

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JOHN GAPPER

Estatização não é panaceia


Contribuinte teria de pagar conta de US$ 2 trilhões para estatizar e recapitalizar os dez maiores bancos dos EUA


NO MERCADO financeiro, quatro meses é muito tempo. Na metade de setembro, quando a crise de crédito estava engolfando Wall Street, achava que Henry Paulson, então secretário do Tesouro dos EUA, deveria se recusar a salvar o Lehman Brothers. Ele permitiu o colapso do banco de investimentos, e o resto é história. Em retrospecto, ainda acredito que deixar que o Lehman Brothers quebrasse fosse a decisão correta, mas eu estava errado ao não perceber que o processo precisava ser conduzido de maneira ordenada. Quando as chances de uma tomada de controle pelo setor privado se esgotaram, uma intervenção era necessária para prevenir o caos. Agora voltamos ao ponto em que começamos, desta vez com os grandes bancos comerciais desempenhando o papel que coube anteriormente às corretoras de valores. Os governos tanto dos EUA quanto do Reino Unido enfrentam pressão não para simplesmente resgatar esses bancos, mas para estatizá-los. Esse surto de nervosismo surgiu depois que os investidores foram informados de que o prejuízo do RBS (Royal Bank of Scotland) em 2008 foi de US$ 40 bilhões. Os preços das ações dos bancos britânicos caíram de maneira tão abrupta que alguns financistas e políticos estão apelando ao governo britânico que ponha fim à incerteza e estatize essas instituições. Houve apelos semelhantes nos EUA, depois que o Citigroup e o Bank of America revelaram grandes perdas. Ao contrário do que recomendei no caso do Lehman, não creio que os governos deveriam permitir a quebra de grandes bancos. Mas não acredito que um país deveria estar ávido por estatizar seus bancos a não ser em casos extremos. Meu argumento quanto à quebra do Lehman era o de que o governo dos EUA, caso continuasse a intervir para salvar bancos de investimento, desgastaria suas finanças e poderia enfrentar problemas cambiais. Esses problemas se fizeram sentir de maneira dolorosa no Reino Unido. O primeiro-ministro britânico, Gordon Brown, foi elogiado em todo o mundo, em outubro, por sua intervenção mais radical e mais dispendiosa que a dos EUA, em defesa dos bancos. Três meses mais tarde, ele enfrenta a tripla ameaça de uma crise bancária, cambial e fiscal. A lição é que, embora intervenções dramáticas pareçam satisfatórias no momento em que são realizadas, não necessariamente resolvem os problemas. Estatização pode ser necessária, mas não é panaceia. Os custos de uma recapitalização plena dos bancos nos EUA e no Reino Unido, além dos custos envolvidos em estabelecer "maus bancos" sob controle estatal para deter ativos problemáticos, seriam imensos. O plano que vem sendo debatido pelos EUA de criar um "banco agregador" para comprar os ativos problemáticos das instituições financeiras custaria US$ 1 trilhão. E é preciso considerar que os dez maiores bancos americanos, todos agora vistos como deficitários em termos de capital, têm cerca de US$ 800 bilhões em capitalização. A estatização e a necessária recapitalização apenas desses bancos levariam a conta a ser paga pelos contribuintes a mais de US$ 2 trilhões, e isso coloca em perspectiva preocupante o saldo de US$ 350 bilhões que resta dos US$ 700 bilhões reservados ao resgate de ativos problemáticos no pacote original do Tesouro. No caso do mercado bancário britânico, se continuar em queda incansável, Brown talvez não tenha outra escolha senão assumir o comando direto da economia. Mas, se o primeiro-ministro se transformar em supremo banqueiro, seus problemas estarão apenas começando.


JOHN GAPPER é colunista do "Financial Times", jornal em que este texto foi publicado originalmente.

Tradução de PAULO MIGLIACCI

Excepcionalmente, hoje, a coluna de LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS não é publicada.


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