São Paulo, quarta-feira, 23 de fevereiro de 2005

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RECEITA ORTODOXA

Segundo projeto-piloto, país poderá abater do esforço fiscal gastos em infra-estrutura de até US$ 3 bi em 3 anos

Brasil obtém aval do FMI para investimento

FABIANO MAISONNAVE
DE WASHINGTON

LEONARDO SOUZA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O Fundo Monetário Internacional anunciou ontem a aprovação do projeto-piloto pelo qual o Brasil poderá abater até US$ 3 bilhões de investimentos em infra-estrutura do esforço fiscal feito para o pagamento de juros da dívida pública nos próximos três anos.
Na prática, conforme a Folha antecipou em dezembro, o governo poderá perseguir meta de superávit primário menor, na proporção desses investimentos. "O projeto-piloto do Brasil proporciona recursos adicionais para um conjunto de projetos que tem forte potencial para gerar retornos macroeconômicos e fiscais no médio prazo, no contexto de um regime fiscal sustentável e consistente do ponto de vista macroeconômico", disse em nota a diretora do Departamento Fiscal do Fundo, Teresa Ter-Minassian.
De acordo com a nota, o Brasil pode abater anualmente, entre 2005 e 2007, até US$ 1 bilhão da meta do superávit primário. Isso dá cerca de R$ 2,6 bilhões hoje, mas membros do FMI dizem que o valor em reais seria de R$ 2,8 bilhões, conforme o câmbio da época do acordo.
Numa situação hipotética, se o Brasil tiver de economizar nominalmente R$ 80 bilhões para o superávit primário -a meta deste ano é 4,25% do PIB (Produto Interno Bruto)-, até R$ 2,8 bilhões gastos em infra-estrutura seriam, com o aval do Fundo, abatidos desse valor. Com isso, a economia de receitas para o pagamento de juros, na prática, cairia para R$ 77,2 bilhões, mas o Fundo consideraria a meta como cumprida.
O secretário do Tesouro Nacional, Joaquim Levy, chamou essa redução na economia de receitas de "espaço na meta [de superávit] que poderá ser usado" a critério do governo.
"O programa-piloto não implica mudanças metodológicas na forma de calcular o resultado nem implica excluírem-se despesas das contas do Orçamento primário", afirma a nota do FMI.
Já na expectativa de que o acordo fosse aprovado, o governo havia separado, no Orçamento de 2005, R$ 2,9 bilhões de investimentos em infra-estrutura.
A nota diz que "o corpo técnico também aplaude a intenção do governo de publicar relatório sobre os investimentos incluídos no projeto-piloto".
De acordo com Levy, a idéia do projeto-piloto é "acelerar investimentos" que seriam feitos no futuro, de modo a "acelerar seus benefícios". Ele afirmou que entre esta semana e a próxima o governo divulgará estimativas do custo/benefício de cada projeto selecionado. No resultado do Tesouro, disse, serão informados mês a mês o superávit primário alcançado e os valores dos investimentos relacionados ao projeto-piloto.
Levy afirmou que o acordo fechado com o Fundo para a implantação do projeto-piloto é "a manifestação da credibilidade" que o Brasil tem com a instituição.
Cerca de 15 outros países também negociam projetos-piloto semelhantes, mas o Brasil foi o primeiro a conseguir o aval técnico do FMI. O tema será discutido de forma mais ampla pela diretoria do Fundo logo após o encontro do órgão em abril.
O governo diz que o projeto-piloto independe da renovação do atual programa de ajuda ao Brasil. O acordo termina no mês que vem, quando o governo deve comunicar se irá renová-lo ou não.
"O objetivo do projeto-piloto é que esses investimentos em infra-estrutura sejam realizados em qualquer circunstância", disse à Folha Murilo Portugal, representante do Brasil no Fundo. Ele afirmou que diversos países interessados no projeto-piloto, como o Reino Unido, não têm acordo com o FMI.
Esses recursos estarão contabilizados nas contas públicas, mas não impedirão o cumprimento da meta de superávit primário (economia de receitas para o pagamento de juros).
Desde que os estudos para a implantação do projeto-piloto foram anunciados, em abril do ano passado, não estava muito claro como esses investimentos em infra-estrutura seriam contabilizados para efeitos de cálculo do superávit primário.
Havia entendimento equivocado de que, numa meta de superávit nominal de R$ 80 bilhões, por exemplo, os R$ 2,8 bilhões estariam fora desse valor. Seria como se o governo obtivesse superávit de R$ 80 bilhões e recebesse uma autorização do Fundo para gastar mais R$ 2,8 bilhões sem que isso impactasse no cálculo da meta.
É justamente o contrário, os R$ 2,8 bilhões poderão estar incluídos nos R$ 80 bilhões e, ainda assim, a meta será cumprida. Ou seja, como investimentos são gastos, a meta na verdade seria de R$ 77,2 bilhões. O superávit primário é o resultado obtido descontando-se as despesas das receitas, sem incluir o pagamento de juros.
O governo quer utilizar esse dinheiro sobretudo para recuperar estradas e portos para evitar gargalos para o escoamento da produção no futuro próximo. A escolha e a fiscalização das obras serão responsabilidade do governo brasileiro.


Colaborou Janaína Leite, da Reportagem Local


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