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Tiroteio do G4 se transfere para Genebra
DO ENVIADO ESPECIAL A GENEBRA
Sem tanta pólvora, o tiroteio de quinta-feira em Potsdam reproduziu-se ontem,
em plena sede da Organização Mundial do Comércio,
durante reunião do Comitê
de Negociações Comerciais,
principal órgão técnico da
instituição.
Clodoaldo Hugueney, o
chefe da missão brasileira
em Genebra, ouviu, com
crescente irritação, os representantes da União Européia
e dos Estados Unidos (Eckart Guth e Peter Algeier,
respectivamente) falarem
dos progressos "substanciais" que teriam ocorrido
nas negociações na Alemanha, em especial na área
agrícola.
Depois, veio a conclusão
de que o encontro do G4 em
Potsdam falhara por causa
da inflexibilidade de Brasil e
Índia em bens industriais.
Os dois também disseram
que o fiasco de Potsdam não
significava que as negociações em Genebra não tinham
mais futuro.
Hugueney tomou a palavra em seguida para dizer:
"As negociações têm futuro, sim. Mas a primeira condição para que tenham futuro é que se diga a verdade".
A verdade, para o Brasil, é
que Potsdam fracassou porque não houve o que Hugueney chama de "movimentos
sérios" por parte de EUA e
UE na liberalização de seus
mercados agrícolas.
"Ganhei o meu dia", diria
depois aos jornalistas esse
experiente diplomata, que
leva o peso da negociação
técnica no dia-a-dia.
Pode de fato ter ganho o
dia, ao fazer um desabafo há
muito contido, mas a explosão causou certa surpresa
entre os delegados e entre os
quadros técnicos da OMC.
Houve até quem falasse
em "venezuelanização" da
política externa brasileira, só
porque o chanceler Celso
Amorim, anteontem, e Hugueney, ontem, foram duros
nas suas críticas a norte-americanos e europeus, afinal as duas grandes usinas
comerciais do planeta, que
só têm um concorrente de
peso na China.
Os chineses, aliás, adotam
nas negociações um perfil
extremamente discreto.
Mesmo assim, seu delegado
disse na plenária que "os países em desenvolvimento têm
dificuldades em assumir
compromissos além de sua
capacidade".
Tradução: não têm margem de manobra para abrir
seus mercados na medida
desejada pelo mundo rico.
A reunião do Comitê foi
um rosário de declarações de
sobrevida da Rodada Doha,
mas objetivamente ficaram
adiadas as reuniões marcadas para a semana que vem.
Objetivo: abrir um espaço de
respiração para que os textos
dos presidentes dos comitês
negociadores possam ser
lançados sem provocar um
incêndio semelhante ao de
Potsdam.
(CR)
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