São Paulo, sábado, 23 de junho de 2007

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Tiroteio do G4 se transfere para Genebra

DO ENVIADO ESPECIAL A GENEBRA

Sem tanta pólvora, o tiroteio de quinta-feira em Potsdam reproduziu-se ontem, em plena sede da Organização Mundial do Comércio, durante reunião do Comitê de Negociações Comerciais, principal órgão técnico da instituição.
Clodoaldo Hugueney, o chefe da missão brasileira em Genebra, ouviu, com crescente irritação, os representantes da União Européia e dos Estados Unidos (Eckart Guth e Peter Algeier, respectivamente) falarem dos progressos "substanciais" que teriam ocorrido nas negociações na Alemanha, em especial na área agrícola.
Depois, veio a conclusão de que o encontro do G4 em Potsdam falhara por causa da inflexibilidade de Brasil e Índia em bens industriais.
Os dois também disseram que o fiasco de Potsdam não significava que as negociações em Genebra não tinham mais futuro.
Hugueney tomou a palavra em seguida para dizer:
"As negociações têm futuro, sim. Mas a primeira condição para que tenham futuro é que se diga a verdade".
A verdade, para o Brasil, é que Potsdam fracassou porque não houve o que Hugueney chama de "movimentos sérios" por parte de EUA e UE na liberalização de seus mercados agrícolas.
"Ganhei o meu dia", diria depois aos jornalistas esse experiente diplomata, que leva o peso da negociação técnica no dia-a-dia.
Pode de fato ter ganho o dia, ao fazer um desabafo há muito contido, mas a explosão causou certa surpresa entre os delegados e entre os quadros técnicos da OMC.
Houve até quem falasse em "venezuelanização" da política externa brasileira, só porque o chanceler Celso Amorim, anteontem, e Hugueney, ontem, foram duros nas suas críticas a norte-americanos e europeus, afinal as duas grandes usinas comerciais do planeta, que só têm um concorrente de peso na China.
Os chineses, aliás, adotam nas negociações um perfil extremamente discreto. Mesmo assim, seu delegado disse na plenária que "os países em desenvolvimento têm dificuldades em assumir compromissos além de sua capacidade".
Tradução: não têm margem de manobra para abrir seus mercados na medida desejada pelo mundo rico.
A reunião do Comitê foi um rosário de declarações de sobrevida da Rodada Doha, mas objetivamente ficaram adiadas as reuniões marcadas para a semana que vem. Objetivo: abrir um espaço de respiração para que os textos dos presidentes dos comitês negociadores possam ser lançados sem provocar um incêndio semelhante ao de Potsdam. (CR)


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