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Ação de Lula fracassa e deixa pouca opção
Presidente brasileiro fez grande esforço para destravar a Rodada Doha e chegou a dizer que faltava pouco para acordo
Possibilidade de acordos bilaterais em vez de acerto global na OMC também é reduzida devido a posições de EUA e União Européia
Michael Urban - 19.jun.07/France Presse
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Manifestantes protestam contra o encontro da OMC vestidos de fogo, ar, terra e água |
DO ENVIADO ESPECIAL A GENEBRA
O paradoxal -e contraditório- nas críticas que se fazem
ao governo brasileiro, ao apontá-lo como responsável pelo
malogro do G4 e, por extensão,
pelo estado comatoso da Rodada Doha, é que nenhum outro
presidente fez tanto esforço e
falou tanto sobre a necessidade
de concluir a rodada como Luiz
Inácio Lula da Silva.
Ainda na semana passada, logo após a reunião do G8 (oitos
países mais industrializados)
na Alemanha, Lula disse aos
jornalistas que eles se surpreenderiam ao ver como o
acordo seria fechado muito antes do que se previa.
Pode-se, portanto, criticar
Lula por propaganda enganosa
mas não por bloquear um acordo global.
Cansou-se de telefonar para
os líderes dos grandes países
(George W. Bush, Tony Blair,
Angela Merkel), cansou-se de
propor, aliás inutilmente, uma
reunião de cúpula para dar o
"impulso político" à negociações que, na área técnica, está
emperradas a rigor desde o lançamento, há seis anos.
Um empenho, aliás, muito
lógico: o eixo da negociação é
abrir o mercado agrícola dos
países ricos. O Brasil é uma potência no agronegócio, mundialmente reconhecido. Seria,
portanto, o primeiro e maior
beneficiário da queda de barreiras agrícolas no mundo rico.
É o único setor, de resto, que
pode aumentar imediatamente
suas exportações, mesmo que
não houvesse o "boom" de
commodities.
O problema para a diplomacia brasileira não é que tenha
boicotado Doha de uma hora
para outra. É que, se Doha fracassar, a diplomacia comercial
não tem muito para onde ir.
Pode tentar acordos bilaterais, mas os únicos que fazem
real sentido econômico seriam
com os Estados Unidos e a
União Européia.
Com os EUA, os entendimentos em torno da Alca pararam em fevereiro de 2007, com
a promessa de se convocar nova
reunião em três semanas. Passaram-se três anos, e não há o
menor sinal de que possam recomeçar.
Com a Europa, a sua comissária de Agricultura já cortou
qualquer esperança, ao dizer
que, em negociações bilaterais,
ninguém vai obter mais concessões do que os europeus ofereceram em Potsdam (e que o
Brasil achou muito pouco).
Resta ao Brasil manter ou reforçar a política de aproximação Sul/Sul, tão criticada pelo
empresariado, que quer os
mercados do mundo rico.
O problema é que, além das
dificuldades na negociação
com os Estados Unidos, o ambiente tenso criado com o fiasco de Potsdam e a troca de acusações levam os americanos a
acenar com radicalização.
Ontem, em sua entrevista coletiva em Genebra, Susan
Schwab, a negociadora-chefe
dos EUA, disse que era possível
que os senadores americanos
retomassem uma proposta surgida quando do fracasso anterior do G4 no sentido de retirar
as preferências comerciais de
que Brasil (e Índia) gozam naquele mercado.
Pode não passar de uma resposta de circunstância, mas é
importante lembrar que o projeto preferido de Lula é o que
ele chama de "revolução no
mundo" representada pela
transformação do álcool em
combustível de largo uso. Para
isso, depende da concretização
da parceria desenhada quando
da viagem de Bush ao Brasil.
Agora que a lua-de-mel azedou, o Brasil acaba condenado a
olhar mesmo para o Sul. É sintomático que a primeira pergunta de Lula quando o chanceler Celso Amorim lhe avisou
do fracasso de Potsdam foi sobre o G20, exatamente o grupo
de países em desenvolvimento
que luta para abrir o mercado
agrícola do mundo rico.
Por gosto ou necessidade, podem se tornar parceiros preferenciais.
(CLÓVIS ROSSI)
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