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Roupa perde espaço e "status" no consumo
Novas tecnologias e crédito facilitado acirram disputa pelo orçamento do consumidor, que agora inclui muito mais itens
Setor têxtil perde lugar para novas formas de diferenciação dos indivíduos e consumo voltado para o bem-estar
DENISE BRITO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
O bom momento por que
passa a economia do país não
tem sido suficiente para beneficiar as vendas do setor de vestuário da mesma maneira como ocorre com outros setores
do mercado de consumo. A perda de participação no PIB (Produto Interno Bruto) dá uma
medida da situação. Enquanto
em 1980 a indústria de vestuário, calçados e artefatos de tecido representava 1,52% do PIB,
em 2004 esse índice havia caído para 0,6%. "Não é porque o
crediário cresceu que necessariamente o setor de vestuário
está vendendo mais", diz o professor de marketing da USP
Elias Frederico.
Uma explicação para isso, segundo ele, está na diversificação dos produtos de consumo
-baseada principalmente em
avanços tecnológicos e na facilidade de crediário-, que passaram a disputar o orçamento
do consumidor. "O ambiente
hoje é de concorrência total, tudo concorre com tudo porque o
bolso do consumidor é um só",
concorda a economista Fátima
Merlin, gerente de varejo da
empresa de pesquisa Latin Panel. Segundo ela, não se trata de
crise, mas de uma reorganização do bolso do consumidor,
que pode ser ilustrada com a
crescente presença de novos
itens na vida do brasileiro.
"É o caso do celular: se em
1996 havia um aparelho para
cada 57 habitantes no país, em
2006 já havia um para cada
dois", observa Merlin. "O gasto
médio com o aparelho hoje é de
R$ 20, valor maior que o gasto
em muitos outros setores."
Diversificação
Assim, produtos de categorias totalmente diferentes
-como eletrônicos, viagens e
tratamentos de beleza, que
possuem a mesma função de
diferenciar os indivíduos ou
proporcionar qualidade de vida- passaram a competir com
as roupas.
"É uma concorrência invisível, pois, ao contrário da loja
em frente à sua, você não tem
como monitorar [as demais]",
diz Frederico. "Há 20 anos havia poucos itens que imprimiam status ou estilo de vida.
Era roupa, casa e automóvel.
Hoje, há muito mais elementos
de diferenciação, e o vestuário
vem sofrendo com isso."
Além do celular, e sua conta
mensal, entre os novos concorrentes estão itens como DVD,
internet, moto, tocador de
mp3, pacotes de viagens, produtos e serviços de beleza, e até
bebidas de grife. Quem andava
de carro usado comprou um zero-quilômetro, e quem andava
a pé comprou uma moto.
Não por acaso, a indústria de
motocicletas praticamente
multiplicou por dez suas vendas, e a automobilística vem batendo recordes com financiamentos em até 72 meses.
"Hoje tem até operação plástica paga em 24 vezes. Celular
virou moda, e as pessoas trocam de aparelho como se comprassem um suéter", diz Sylvio
Mandel, presidente da Abeim
(Associação Brasileira do Varejo Têxtil), entidade que reúne
grandes redes como C&A, Marisa, Wal-Mart e Luigi Bertolli.
As irmãs Aíla, 24, bacharel
em turismo e hotelaria, e Aíse
Amaral, 27, advogada, são
exemplos típicos da mudança
de comportamento por que
passou o mercado consumidor.
"O valor e a freqüência de meus
gastos com roupa mudaram
bastante. Antes eu comprava
sempre, até porque mulher é
muito consumista", diz Aíse.
"Agora, por exemplo, estou
querendo comprar roupa, mas
vou ter de esperar, pois tive gastos extras com viagens e acesso
à internet. É que acessar a internet todo dia e viajar de avião,
em vez de ônibus, é mais importante do que ter roupa nova
para usar todo dia."
Aíla não pensa muito diferente. "Antes eu gastava mais
com roupa, mas tive de remanejar todo o meu orçamento,
pois agora tenho várias despesas fixas novas que não tinha
antes, como a assinatura de TV
a cabo, idas ao salão para fazer
escova de "chocolate", alguns
cremes que passei a usar e gastos mais freqüentes com refeição fora de casa."
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