São Paulo, sábado, 23 de junho de 2007

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Roupa perde espaço e "status" no consumo

Novas tecnologias e crédito facilitado acirram disputa pelo orçamento do consumidor, que agora inclui muito mais itens

Setor têxtil perde lugar para novas formas de diferenciação dos indivíduos e consumo voltado para o bem-estar


DENISE BRITO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

O bom momento por que passa a economia do país não tem sido suficiente para beneficiar as vendas do setor de vestuário da mesma maneira como ocorre com outros setores do mercado de consumo. A perda de participação no PIB (Produto Interno Bruto) dá uma medida da situação. Enquanto em 1980 a indústria de vestuário, calçados e artefatos de tecido representava 1,52% do PIB, em 2004 esse índice havia caído para 0,6%. "Não é porque o crediário cresceu que necessariamente o setor de vestuário está vendendo mais", diz o professor de marketing da USP Elias Frederico.
Uma explicação para isso, segundo ele, está na diversificação dos produtos de consumo -baseada principalmente em avanços tecnológicos e na facilidade de crediário-, que passaram a disputar o orçamento do consumidor. "O ambiente hoje é de concorrência total, tudo concorre com tudo porque o bolso do consumidor é um só", concorda a economista Fátima Merlin, gerente de varejo da empresa de pesquisa Latin Panel. Segundo ela, não se trata de crise, mas de uma reorganização do bolso do consumidor, que pode ser ilustrada com a crescente presença de novos itens na vida do brasileiro.
"É o caso do celular: se em 1996 havia um aparelho para cada 57 habitantes no país, em 2006 já havia um para cada dois", observa Merlin. "O gasto médio com o aparelho hoje é de R$ 20, valor maior que o gasto em muitos outros setores."

Diversificação
Assim, produtos de categorias totalmente diferentes -como eletrônicos, viagens e tratamentos de beleza, que possuem a mesma função de diferenciar os indivíduos ou proporcionar qualidade de vida- passaram a competir com as roupas.
"É uma concorrência invisível, pois, ao contrário da loja em frente à sua, você não tem como monitorar [as demais]", diz Frederico. "Há 20 anos havia poucos itens que imprimiam status ou estilo de vida. Era roupa, casa e automóvel. Hoje, há muito mais elementos de diferenciação, e o vestuário vem sofrendo com isso."
Além do celular, e sua conta mensal, entre os novos concorrentes estão itens como DVD, internet, moto, tocador de mp3, pacotes de viagens, produtos e serviços de beleza, e até bebidas de grife. Quem andava de carro usado comprou um zero-quilômetro, e quem andava a pé comprou uma moto.
Não por acaso, a indústria de motocicletas praticamente multiplicou por dez suas vendas, e a automobilística vem batendo recordes com financiamentos em até 72 meses.
"Hoje tem até operação plástica paga em 24 vezes. Celular virou moda, e as pessoas trocam de aparelho como se comprassem um suéter", diz Sylvio Mandel, presidente da Abeim (Associação Brasileira do Varejo Têxtil), entidade que reúne grandes redes como C&A, Marisa, Wal-Mart e Luigi Bertolli.
As irmãs Aíla, 24, bacharel em turismo e hotelaria, e Aíse Amaral, 27, advogada, são exemplos típicos da mudança de comportamento por que passou o mercado consumidor. "O valor e a freqüência de meus gastos com roupa mudaram bastante. Antes eu comprava sempre, até porque mulher é muito consumista", diz Aíse. "Agora, por exemplo, estou querendo comprar roupa, mas vou ter de esperar, pois tive gastos extras com viagens e acesso à internet. É que acessar a internet todo dia e viajar de avião, em vez de ônibus, é mais importante do que ter roupa nova para usar todo dia."
Aíla não pensa muito diferente. "Antes eu gastava mais com roupa, mas tive de remanejar todo o meu orçamento, pois agora tenho várias despesas fixas novas que não tinha antes, como a assinatura de TV a cabo, idas ao salão para fazer escova de "chocolate", alguns cremes que passei a usar e gastos mais freqüentes com refeição fora de casa."


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