São Paulo, terça-feira, 23 de julho de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ANÁLISE

Quebra da WorldCom representa risco para outras telefônicas

SIMON ROMERO
JONATHAN D. GLATER

DO "NEW YORK TIMES"

Mesmo que o pedido de concordata da WorldCom fosse esperado há semanas, o fato de que se tenha realizado criou uma cascata de problemas na indústria interdependente de operadoras de telefonia locais e de longa distância, bem como para as empresas que lhes fornecem equipamentos. Os dois anos de crise no setor de telecomunicações são um fator importante para o passo claudicante da economia mundial e a queda nos mercados de ações. As ações de empresas de telecomunicações perderam valor de mercado no total agregado de US$ 2 trilhões nos últimos dois anos. Assim, as dificuldades que persistem no setor podem ter conseqüências negativas mais amplas.
"As pessoas não podem mais ignorar que o setor de telecomunicações está esburacado e representa sério obstáculo para a economia", diz Scott Cleland, executivo chefe da consultoria Precursor Group, de Washington.
Em termos mais imediatos para as demais operadoras, no entanto, está a preocupante perspectiva de um calote por parte da WorldCom, que tipicamente pagava dezenas de milhões de dólares por mês a outras empresas do setor como parte do complexo processo de interação sob o qual as empresas de telefonia conectam os seus respectivos assinantes em uma vasta teia de comunicação.
A maior associação setorial do mercado enviou uma carta no final de semana à Comissão Federal de Comunicações (FCC) dos EUA, pedindo permissão para repassar aos consumidores os custos incorridos caso a WorldCom se atrasasse em seus pagamentos de conexão de rede. Quase todas as empresas de telecomunicações - sejam operadoras de telefonia, como a Verizon Communications, ou fabricantes de equipamentos como a Lucent Technologies- têm contas a receber da WorldCom, e terão dificuldades para recebê-las caso a empresa decida pedir concordata.
Entre as grandes operadoras regionais de telefonia, estima-se que a Verizon e a SBC Communications tenham, cada qual, mais de US$ 200 milhões a receber da WorldCom, e que parte dessas dívidas já estejam em atraso. Não se sabe ao certo que proporção dessas dívidas será paga, ou se elas podem contar com o recebimento dos US$ 100 milhões em tarifas de interconexão que a WorldCom lhes paga a cada mês para conectar seus clientes às redes delas.
"Estamos desapontados que eles tenham decidido agir assim", disse Peter Thonis, porta-voz da Verizon. "Vamos acompanhar a situação de muito perto e fazer o que for preciso para proteger os interesses de nossos acionistas".
Outra grande operadora regional, a BellSouth, planeja reter parte do dinheiro que recolhe como agente de cobrança da WorldCom caso a empresa não pague suas tarifas de interconexão, informou o porta-voz Jeff Batcher. Ele disse que a BellSouth costumava receber em média US$ 80 milhões mensais da WorldCom.
O pedido de concordata da WorldCom também deve pesar sobre os esforços de reestruturação que já estão em curso entre outras empresas de telecomunicações, tais como a Global Crossing e a 360networks, que estão igualmente em concordata. Os credores dessas empresas vêm encontrando problemas em achar compradores para suas redes, ou parte delas. Agora que a WorldCom parece decidida a vender alguns ativos, o excedente de propriedades indesejadas no mercado vai aumentar ainda mais.
O excesso de capacidade nas redes de comunicações, resultado do investimento exagerado durante o boom do setor de telecomunicações que durou até o final dos anos 90, é um fator essencial para a atual depressão do setor.
A rápida alta nas ações de empresas do setor permitiu que empresas iniciantes, a mais notável das quais era a WorldCom, crescessem rapidamente por meio de aquisições e com a obtenção de fontes pouco dispendiosas de financiamento. A crescente popularidade da internet naquele período ajudou a estimular o frenesi de construção de redes. Executivos da UUNet, uma empresa de "backbone" para a internet adquirida pela WorldCom em 1996, foram citados como tendo declarado que o tráfego na internet se duplicaria a cada 100 dias.
Como demonstrou o escândalo na contabilidade da WorldCom, o fracasso em cumprir previsões como a que se referia ao tráfego na internet em ritmo sequer próximo ao projetado contribuiu para a pressão que os executivos passaram a sentir no sentido de apresentar uma fachada de normalidade financeira.
Mas mesmo que a WorldCom tenha tomado medidas extremas para tentar enfrentar os crescentes problemas do setor, as dificuldades do grupo demonstram que as telecomunicações não são um jogo de soma zero no qual as perdas de uma empresa se traduzam facilmente em ganhos para outra.
Por exemplo, a WorldCom sofreu declínio em sua receita com telefonemas de longa distância, nos últimos anos, porque os usuários de celulares começaram a usá-los mais e mais para realizar interurbanos atraídos por tarifas de até dois centavos de dólar por minuto, comparados aos 10 centavos de dólar por minuto cobrados pela WorldCom.
Mas isso não quer dizer que os operadores de celular tenham lucrado com esses clientes "roubados" às operadoras comuns de longa distância, porque as vantagens que eles poderiam ter obtido foram desgastadas pela feroz guerra de preços no setor de celulares, causada pelo investimento excessivo em redes que o setor realizou no final dos anos 90.
Para a WorldCom, o pedido de concordata é uma forma de ganhar tempo mas não resolve nenhum problema magicamente. A queda no volume de operações do setor de telecomunicações representará um problema para a WorldCom quando ela escolher que contratos abandonar e que contratos honrar, disse Sandra E. Mayerson, que dirige a equipe de falências e concordatas no escritório de advocacia Holland & Knight, de Nova York.
Porque em muitos casos os fornecedores da empresa também são seus clientes, optar por abandonar um contrato de suprimento para economizar dinheiro pode resultar em perder um contrato de venda que geraria receita igual ou até superior, diz ela.


Tradução de Paulo Migliacci


Texto Anterior: Para Anatel, a situação da empresa é boa
Próximo Texto: Fiscalização: Receita investiga remessas da Bombril
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.