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LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
Ainda a questão do real valorizado
Finalmente o governo agiu para tentar estancar, ou ao menos reduzir, a queda do dólar em relação ao real
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VOLTO MAIS uma vez à questão
da valorização do real. Finalmente o governo resolveu
agir para tentar estancar -ou pelo
menos reduzir- a queda do dólar
em relação à nossa moeda. O leitor
da Folha já conhece meu pensamento em relação a esse assunto.
Discordo dos analistas que não
consideram isso um problema e
me preocupo muito com o fortalecimento do real. Principalmente
enquanto durar a posição atual da
China em relação à sua moeda e a
política monetária do Federal Reserve nos Estados Unidos.
Portanto parece-me correta a
posição do ministro Guido Mantega de tentar interferir na formação
da taxa de câmbio. Vivemos um
período em que as autoridades de
economias importantes estão
atuando nos mercados de câmbio.
O yuan chinês, mantido artificialmente constante em relação ao
dólar, é, de longe, o fator externo
mais relevante por trás da valorização do real e de outras moedas
de países emergentes.
No caso da China, o mecanismo
de defesa do yuan é simples: o banco central chinês compra qualquer
quantidade de dólares que entra
no país mantendo fixa a cotação de
sua moeda em relação ao dólar
norte-americano. Para viabilizar
esse sistema de câmbio fixo, conta
com mecanismos institucionais
que tentam impedir a entrada de
capitais financeiros de curto prazo.
Além disso, o sistema está ancorado em alta geração de poupança
interna, minimizando os riscos inflacionários dessa política. Acredito que apenas em 2010, quando a
recuperação chinesa estiver consolidada, vá ocorrer uma valorização do yuan e uma redução na
pressão sobre outras moedas, como o real.
Já no caso norte-americano, a
influência do Fed na manutenção
do dólar fraco é mais sutil: os juros
quase a zero fazem com que os especuladores tomem dinheiro emprestado em dólares e os troquem
por outras moedas como o real.
Apenas com a retomada da normalidade da política monetária
norte-americana é que vai desaparecer essa fonte temporária de
desvalorização do dólar perante
quase todas as outras moedas. Coisa também para 2010, talvez já no
fim do primeiro semestre.
Minha intuição diz que o valor
do dólar norte-americano, quando
essas duas forças forem retiradas,
será próximo a R$ 1,80. Enquanto
elas permanecerem, não descarto
a hipótese de vermos a moeda norte-americana sendo negociada a
R$ 1,60. Por isso, acredito que uma
intervenção do governo nesse período faça sentido.
Se concordo com a preocupação
do ministro Mantega, discordo
frontalmente do instrumento escolhido por ele para enfrentar esse
problema. Uma primeira crítica é
que essa medida isolada não tem a
menor chance de ter sucesso, pois
o Banco Central acredita na teoria
do câmbio flutuante puro. E, sem o
engajamento do Banco Central
nesse difícil combate, as chances
de sucesso são inexistentes.
Em segundo lugar, na forma como foi definido o IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) pelo
Ministério da Fazenda, será fácil
para as instituições financeiras evitá-lo. A própria imprensa trouxe
ontem um cardápio de dez alternativas para tanto. Com o pagamento
de uma taxa inferior a 1% a um intermediário financeiro, pode-se
evitar o pagamento do IOF. Nessa
hipótese, teríamos o pior dos mundos: a criação de um custo adicional para os investimentos financeiros no Brasil sem que o Tesouro
Nacional se beneficie pela arrecadação de impostos.
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, 66, engenheiro e
economista, é economista-chefe da Quest Investimentos.
Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações
(governo Fernando Henrique Cardoso).
lcmb2@terra.com.br
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