São Paulo, Quinta-feira, 23 de Dezembro de 1999


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MEMÓRIA

Projeto foi sonho de bilionário

CLAUDIO CORDEIRO
do Banco de Dados

A saga do Projeto Jari teve início em 1967, quando o megaempresário norte-americano Daniel Keith Ludwig decidiu criar um empreendimento capaz de abastecer o mundo de celulose e alimentos.
Ludwig acreditava que haveria uma carência generalizada desses produtos na virada do século e escolheu uma região despovoada no meio da selva amazônica para viabilizar seu sonho.
O empresário, então um dos quatro homens mais ricos do mundo, com um patrimônio estimado em US$ 3,5 bilhões, comprou 1,6 milhão de hectares (área equivalente ao Estado de Sergipe) nas margens do rio Jari, entre o Pará e o Amapá.
O fracasso do projeto pode ser explicado por uma sucessão de erros e diagnósticos equivocados.

Solo
O desmatamento realizado pelos tratores tirava as raízes e o húmus, fazendo com que o solo ficasse inadequado para o cultivo.
A solução encontrada foi trocar os tratores por motosserras, em um processo mais caro e demorado.
A gmelina, a árvore selecionada para a produção de celulose, foi trazida da Ásia e não se adaptou ao clima amazônico, além de ser vulnerável às pragas tropicais.
Diante do imprevisto, a gmelina foi substituída pelo pinus e, mais tarde, por eucaliptos, ocasionando mais custos e atrasos.
O projeto ainda sofreu outros reveses, como a explosão de uma caldeira e o fracasso no cultivo de arroz.
Em 78, ao tentar revitalizar o projeto, uma unidade industrial e uma usina termogeradora de energia construídas sobre balsas foram trazidas prontas do Japão, em uma viagem de 57 dias e 21 mil quilômetros.
As terras que Ludwig adquiriu não estavam devidamente regularizadas e sua propriedade passou a ser questionada no final dos anos 70.

Nacionalismo
O governo militar, que apoiou o projeto no começo, era criticado e pressionado por setores nacionalistas das Forças Armadas e da sociedade civil.
Em 82, o então ministro do Planejamento, Delfim Netto, aproveitou o descontentamento geral com o empreendimento e articulou sua venda para um grupo de 23 empresários brasileiros.
Ludwig, depois de investir cerca de US$ 1,3 bilhão entre 67 e 82, foi embora do Brasil com US$ 70 milhões. Morreu em 92, deixando o que restava de sua fortuna para uma fundação de pesquisa contra o câncer.
Com o suporte financeiro do BNDES e do Banco do Brasil, o empresário Augusto Trajano de Azevedo Antunes, do grupo de mineração Caemi, liderou o conglomerado até 92, quando passou o comando para os netos Guilherme e Mário Frering.
Apesar de registrar lucro em 94, o primeiro de sua história, os herdeiros levaram o empreendimento a uma espécie de "concordata branca" para renegociar as dívidas em 96.
Em abril de 97, um incêndio destruiu a termoelétrica e paralisou a produção de celulose, que só foi normalizada em janeiro de 98.
Os maiores credores da dívida de cerca de US$ 340 milhões são o BNDES e o Banco do Brasil. Os dois bancos também são acionistas e possuem 20% e 12% da empresa, respectivamente, mas o controle é da família Frering, com 37%.
A desvalorização do real e o aumento do preço internacional da celulose devem melhorar o caixa da companhia e aliviar a dívida, pois 90% da produção é exportada para os Estados Unidos e Europa.


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