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ARTIGO
As estratégias dos bancos e os setores produtivos
SERGIO MAGALHÃES
Desde que a economia brasileira
mergulhou no descontrole inflacionário, dando origem à chamada
"década perdida", o sistema financeiro nacional distanciou-se rapidamente do seu verdadeiro papel
como agente de apoio à produção e
circulação de riquezas. Ou seja, a
indústria, a agricultura e o comércio perderam uma das pernas de
sustentação, com uma enorme e irrecuperável perda imposta a toda a
sociedade.
Na verdade, até os primeiros
anos da década de 80, quando a
economia brasileira observava índices de crescimento que assombravam o mundo, os bancos brasileiros tinham como atuação preponderante o financiamento da
produção e dos investimentos, como ocorre em qualquer parte do
mundo desde que surgiu a atividade de intermediação de moeda e
valores mobiliários.
Hoje, enquanto os nossos colegas industriais alemães ou japoneses só se preocupam em fabricar
produtos cada vez mais baratos e
melhores (porque os seus governos estabelecem eficientes políticas setoriais, as empresas de comércio se incumbem de procurar e
achar clientes e os bancos, de financiar os investimentos, a produção e as vendas), aqui fazemos tudo isso sozinhos, operando verdadeiros milagres para enfrentar os
desafios da globalização e do crescente peso do "custo Brasil".
Dentro desse dramático cenário
para quem produz riquezas, emprega trabalhadores e ainda paga
impostos (quando pode), são bastante sintomáticos os depoimentos dos presidentes dos dois maiores bancos privados do país em reportagem publicada na Folha no
mês passado.
O sr. Lázaro Brandão, presidente
do Bradesco, afirma que o resultado do banco que preside, relativo
ao período janeiro/setembro desde ano, foi 6,8% menor que o de
igual período do ano passado, uma
vez que continuou aplicando parte
considerável de seus recursos na
concessão de crédito a seus clientes. Ele não se eximiu de cumprir
uma das principais funções de
uma entidade financeira, mesmo
assumindo mais riscos e reduzindo sua rentabilidade.
Enquanto isso, o presidente do
segundo maior banco brasileiro
ressalta que escolhera a opção
mais favorável a seus acionistas,
"jogando mais fichas" nos títulos
da dívida pública, mais rentáveis e
sem riscos. Essa escolha rendeu ao
Itaú uma lucratividade 12% maior
que a de 1997, deixando "na mão",
provavelmente, uma porção de
empresas que poderiam ter mantido ou ampliado sua produção e
seus quadros de trabalhadores.
Lamentavelmente, o Bradesco
constitui-se na honrosa e respeitável exceção, não por culpa apenas
dos banqueiros, mas pelo desvirtuamento do sistema financeiro
brasileiro. O processo começou
com a "ciranda financeira" dos
tempos das hiperinflações; hoje,
caracteriza-se pelos indecentes juros pagos pelos títulos do governo
para tapar os buracos orçamentários ou cobrir a conversão da fabulosa e nociva entrada de dinheiro
especulativo do exterior.
Nada mais errado do que a atual
política monetária, que prioriza as
aplicações especulativas estrangeiras e nacionais, que nada geram de
útil, em detrimento dos investimentos na produção de riquezas e
empregos para brasileiros. Nada
mais correto e exemplar do que a
consciência de um Bradesco, que,
resistindo a um lucro supérfluo resultante de uma intermediação
bancária inconsequente, opta pelo
caminho mais árduo, mais arriscado, mas mais construtivo de apoiar
a empresa. Quando o país deixa de
investir e "joga suas fichas" na especulação está perdendo o presente e comprometendo o futuro, porque há outras nações menos ricas,
mas muito mais competentes.
É preocupante também o exacerbado avanço da desnacionalização
do controle acionário dos bancos.
Não temos nenhum preconceito
quanto à origem do capital se as
empresas investem e atuam segundo as leis e os interesses maiores da
nação brasileira. A mesma liberalidade, no entanto, parece não ser
aplicável ao setor financeiro -não
só em razão do seu papel estratégico dentro da dinâmica de uma moderna sociedade industrial, mas
sobretudo diante do imponderável
poder das grandes concentrações
de capital existentes no mercado
internacional.
Não fosse essa função estratégica, os sistemas financeiros das
principais nações soberanas não
necessitariam ser tão regulamentados nem submetidos a rígidos
controles de seus bancos centrais,
sem falar de organismos internacionais, como o FMI.
Cabe, nesse aspecto, uma rápida
reflexão das autoridades tanto do
Poder Executivo quanto do Legislativo. Não seria uma medida de
bom senso preservar um mínimo
de bancos sob controle nacional,
que não se retirem quando o nosso
mercado não for tão interessante
como hoje e que tracem suas estratégias considerando também o desenvolvimento das empresas produtivas brasileiras?
²
Sergio Magalhães, 58, engenheiro e empresário, é presidente da Febramaq (Federação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos).
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