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LUÍS NASSIF
É lobby da Fiesp
Se é para definir um culpado
pela situação a que chegou a
economia, debite-se ao patrulhamento ao qual incorreu majoritariamente o pensamento
econômico brasileiro, criando
essa enorme burrice do culto à
unanimidade. É inacreditável
como os bordões vão se perpetuando no tempo, como se realidades, pessoas e instituições
não mudassem.
Ponto central no desenvolvimento equilibrado de uma economia é a mudança gradativa
de ênfases. Não existe política
econômica, social, estratégia
empresarial ou até tratamento
médico que possa se basear em
uma única ênfase. Há fases em
que a ênfase, em uma determinada empresa, é o controle de
custos. Superada a fase, entra-
se em uma nova, de desenvolvimento de novos produtos. E assim por diante.
A arte do condutor de política
econômica consiste em ponderar todos os fatores, e ir adaptando gradativamente as ênfases, de maneira a evitar desequilíbrios em uma ou outra direção.
Mas a discussão nacional
ainda não conseguiu se sofisticar a ponto de ponderar os diversos argumentos e compor
sínteses racionais. Aqui é esse
besteirol da "turma do mercado" versus a "turma desenvolvimentista", onde só se aceitam
conceitos em bloco, de preferência, porque escolher conceitos aqui e acolá, de acordo com
a análise objetiva de problemas, dá muito trabalho e acaba com esse aspecto místico da
discussão econômica.
²
Velhos como os pais
É impressionante como continuamos velhos como nos
anos 80.
Naquele período, vinham-se
de duas ênfases superadas: o
protecionismo às grandes empresas nacionais e a indisciplina orçamentária em todos os
níveis. Na linha de frente desse
estilo, bordões tipo "o que é
bom para a empresa nacional é
bom para o país"; ou então o
"tudo pelo social", como se
princípios de disciplina orçamentária fossem anti-sociais.
Para superar as enormes resistências às mudanças, a mídia passou a exercitar novos
slogans. A defesa da moeda e a
disciplina orçamentária passaram a ser valores hegemônicos,
defendidos radicalmente. A defesa do consumidor (em contraposição à defesa do produtor) permitiu abrir a economia.
A politização desses conceitos
acabou gerando novos bordões, dos quais o principal foi
"isso é lobby da Fiesp", uma entidade que dos anos 90 em
diante era tão inofensiva
quanto um tigre gordo e banguela e só agora começa a recuperar um papel que é importante -como é importante a
representação dos diversos setores, inclusive do mercado financeiro.
Nada contra a radicalização
nas fases heróicas, de consolidação de novos valores. Mas há
momentos em que, consolidados os valores, impõem-se novas análises e a compreensão
das novas etapas da vida nacional.
Em vez de instrumento de
uma visão mais racional e sofisticada da realidade econômica, o que se fez foi transformar esses elementos em fetiches intocáveis. Em vez de análises isentas sobre a realidade,
vieram patrulhamentos e slogans panacas, de quem se considera defensor da globalização e, no fundo, não consegue
superar o sentimento provinciano e anticientífico dos velhos defensores dos modelos fechados.
Para um e para outro, herdeiros do espírito da inquisição
portuguesa, qualquer forma de
questionamento passa a ser
vista como heresia. Profetas
primários da nova ordem,
arautos tropicais da globalização, não conseguiram avançar
além das tintas para entender
que, na sociedade moderna e
complexa que todos ambicionamos, o exercício da pressão e
da crítica não é só legítimo como absolutamente necessário
para corrigir distorções.
O inacreditável é que esse espírito viceja não em 1995,
quando a quebra do país era
uma hipótese, mas em 1998,
quando é fato consumado. No
entanto, qualquer alerta sobre
o desastre recebe o epíteto de
"lobby da Fiesp", esse argumento imbatível, definitivo,
humanizador, porque permite
colocar no mesmo nível de discussão os sábios e os definitivamente néscios.
E-mail: lnassif@uol.com.br
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