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PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
Ansiedade e pânico nos EUA
É perigoso entrar em recessão com o sistema financeiro tão
fragilizado e vários bancos
importantes tão vulneráveis
AQUI NOS EUA a situação econômico-financeira é tenebrosa, como se sabe. Imigrantes
brasileiros, por exemplo, começam
a retornar ou a planejar o retorno
para casa. O diretor-gerente do FMI,
Dominique Strauss-Kahn, declarou
que a situação é "séria". Muitos já
perderam a esperança de que uma
recessão possa ser evitada.
Isso me faz lembrar uma história
de Winston Churchill. Certa vez,
quando ele era primeiro-ministro,
Churchill teve um encontro com a
sua contraparte da República da Irlanda. Os dois países enfrentavam
grandes dificuldades na época.
Churchill disse ao primeiro-ministro irlandês que a situação da Inglaterra era "serious but not hopeless"
(séria mas não desesperançada ou
irremediável). E o irlandês respondeu, segundo relato de Churchill,
que a situação no país dele era "hopeless but not serious".
A situação atual dos EUA está
mais para a da Inglaterra ou a da Irlanda de então? Difícil dizer. Os
americanos talvez estejam pagando
o preço econômico por ter conferido
dois mandatos consecutivos a George W. Bush. Oito anos! Eis o resultado: em algumas áreas importantes
da economia e do sistema financeiro, a superpotência acumulou ao
longo desses anos indicadores dignos de uma república bananeira, como já tive ocasião de comentar nesta
coluna.
O presidente do Federal Reserve,
Ben Bernanke, ao depor na quinta-feira passada em uma comissão do
Congresso, tinha a ansiedade estampada no rosto. O pacote de estímulo fiscal, cujas linhas gerais foram anunciadas pelo presidente
Bush na sexta, foi considerado vago
e insuficiente, desencadeando uma
situação de quase pânico nos mercados financeiros internacionais. Em
resposta, o Fed acabou antecipando
em uma semana o corte de 0,75 ponto percentual que seria feito na reunião regular dos dias 29 e 30 -decisão pouco usual que demonstra o
grau de preocupação da autoridade
monetária.
O Fed está correndo atrás do prejuízo. As autoridades monetárias e
fiscais subestimaram a extensão da
crise e agora têm pouco tempo para
agir. Reina uma certa afobação, tanto no Fed como no Executivo e no
Congresso. A decisão de antecipar o
corte de juros, por exemplo, pode ter
impacto ambíguo, sobretudo quando tomada de afogadilho. Por um lado, o efeito é positivo -o Fed finalmente acordou para a gravidade da
crise. Por outro, pode gerar mais insegurança -o que é que o Fed sabe
que nós não sabemos?
A ansiedade dos responsáveis pela
política econômica é compreensível.
É perigoso entrar em uma recessão
com o sistema financeiro tão fragilizado e vários bancos importantes
tão vulneráveis. A recessão, ao gerar
dificuldades adicionais de pagamento para pessoas físicas e jurídicas, levaria a um agravamento dos problemas dos bancos e de outras instituições, colocando em risco a solvência
do sistema financeiro. Por sua vez, o
agravamento dos problemas financeiros realimentaria as forças recessivas, criando um círculo vicioso que
pode ser difícil de quebrar mais à
frente.
A insistência na urgente adoção de
um pacote de estímulo fiscal (com
aumentos de gastos e redução de tributos) também tem sua razões. O
peso de evitar ou amenizar a recessão não pode recair exclusivamente
sobre o Federal Reserve. Se tudo depender de diminuições adicionais
da taxa de juro, o dólar ficará sob
pressão nos mercados internacionais. A depreciação pode transformar-se em colapso, solapando a
confiança no dólar como moeda internacional de reserva.
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR., 52, escreve às quintas-feiras nesta coluna. Diretor-executivo no FMI, representa
um grupo de nove países (Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Haiti, Panamá, República Dominicana, Suriname e Trinidad e Tobago).
pnbjr@attglobal.net
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