São Paulo, quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

VINICIUS TORRES FREIRE

Quem descasa quer casa

Motivos, projeções e chutes sobre onde podem ficar as "casas" para quem descasou ou "descolou" do crescimento

ERA TÃO ridícula, marqueteira, carente de bom senso e de prudência a idéia de que "o mundo" poderia descolar ou "descasar" da crise americana quanto o é o decreto, ouvido nesta semana, de que tal possibilidade em geral é nula devido tão-somente ao pânico recente (e não se sabe se quão duradouro) nos mercados de ações.
Ontem, o banco Morgan Stanley publicou um resumo de seu "seminário" anual sobre as perspectivas de investimento para 2008. Trata-se de reuniões entre estrategistas de investimento e economistas do banco com seus clientes, investidores importantes. No texto, ponderam a hipótese de "descasamento".
Para tratar logo de Brasil: "Queremos comprar, embora cuidadosa e seletivamente, mercados emergentes, os quais têm as melhores chances de "descasarem" dos EUA". Quanto a ações: "Nós [Morgan] e nossos clientes queremos comprar infra-estrutura, mercados emergentes e múltis ligadas ao mercado consumidor dos emergentes". Quanto a "commodities": vão de agrícolas e vendem metais. Nos emergentes, a economia "real" tende a atravessar a crise de modo mais tranqüilo do que os mercados financeiros.
Mais tranqüilo significa o quê? Que a recessão americana não vai "aleijar" os emergentes, como no passado -é de perguntar se vamos perder apenas uma das mãos ou os dois pés, mas vá lá. O pessoal do Morgan ressalta o argumento citando explicitamente Brasil e China, que "aceleraram" no ano passado, mesmo com o enfraquecimento americano. Mais: dizem que, se a hipótese do "descolamento emergente" estivesse errada, o petróleo já teria caído mais (para US$ 70).
Motivos do "descasamento suave"? O crescimento emergente depende agora mais de mercado interno, os preços do comércio mundial lhes são favoráveis, há superávits comerciais e fiscais, tais países se tornaram fonte de "poupança global".
Apesar do risco e da volatilidade historicamente maiores que os de países centrais, os grandes emergentes tendem a expandir mais seu mercado consumidor, têm agora moedas mais fortes e bancos mais saudáveis que os de países avançados (sic).
O Morgan avisa que tal visão não é uma estratégia de curto prazo, de "vamos comprar na baixa", mas de descobrir onde deve estar a rentabilidade depois que assentar a poeira da volatilidade nesses dias de "derretimento" do mercado.
No curto prazo, menos de um ano, os economistas do Morgan e seus clientes acham que o mercado é baixista mesmo. Preferem liqüidez, dinheiro ou substitutos próximos, a qualquer risco. Acham que, mesmo com os presentes tombos, o preço dos ativos ainda não incorporou nem a possibilidade de uma suave recessão nos EUA, "que dirá a de uma recessão severa". Mas, no longo prazo, acham que ações americanas e o dólar são negócios melhores que a Europa e seu euro. A Europa não vai "descolar" dos EUA, dizem. Vai "recasar" com a crise americana.
A recessão nos Estados Unidos seria suave, com a recuperação começando no final do ano, para a maioria dos "seminaristas" do Morgan e investidores ouvidos em pesquisas -uma minoria acredita que é possível um cenário "Japão anos 90" para os Estados Unidos de agora.


vinit@uol.com.br

Texto Anterior: Paulo Nogueira Batista Jr.: Ansiedade e pânico nos EUA
Próximo Texto: Crise nos mercados/ efeitos no Brasil: Turbulência aumenta custos do Tesouro
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.