São Paulo, sábado, 24 de fevereiro de 2007

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HAMISH MCRAE

Internet e o poder do consumidor

Com a internet, temos a capacidade de procurar bons negócios e comparar qualidade além de preços

EM TEORIA, é isso que deveria acontecer -mas é bom saber que está de fato acontecendo.
Em teoria, o desenvolvimento da internet é imensamente democrático. Dá a todos nós acesso a um conhecimento que, uma década atrás, teria requerido o departamento de pesquisa de uma multinacional.
Mas demora um pouco para que as pessoas descubram como usar novas tecnologias e para que os serviços distribuídos por meio dessas tecnologias se desenvolvam. E-mail, banda larga, Google, eBay, YouTube, Skype e diversos outros empreendimentos estão alterando o balanço de poder entre os indivíduos, de um lado, e o Estado e as grandes empresas, do outro.
Os últimos dias ofereceram diversos exemplos dessa virada no balanço de poder no Reino Unido. A capacidade dos consumidores para comparar os preços do gás se combinou à liberalização do mercado para permitir que optássemos pelo fornecedor que oferece o melhor negócio, algo que a Centrica (empresa de energia do Reino Unido) está pagando caro por descobrir. O poder da rede deu aos correntistas dos bancos a confiança necessária a questionar tarifas e o mecanismo necessário para que o façam. O acesso fácil ao e-mail permitiu que 1,8 milhão de pessoas protestasse ao primeiro-ministro, Tony Blair, sobre o custo dos pedágios. Os times de futebol tiveram de reduzir os preços de seus ingressos. E assim por diante.
Essa virada na distribuição do poder não aconteceu apenas devido à tecnologia; surgiu em parte devido a uma revolução mais ampla no mercado. Haveria menos utilidade em poder comparar os preços do gás se, como em muitos países, não fosse possível trocar de fornecedor. Mas, mesmo que exista uma empresa monopolista de um lado da equação, o simples fato de que os indivíduos tenham acesso a informações globais muda o balanço de poder entre pessoas e instituições.
Ainda estamos nos estágios iniciais dessa virada, de modo que o que presenciamos até o momento apenas prenuncia o futuro. Mas já é possível avaliar algumas das conseqüências, a maioria das quais -embora nem todas- bastante encorajadoras.
Uma delas é o crescimento sustentado no poder do consumidor. Já temos a capacidade de procurar bons negócios e comparar qualidade além de preços, mas o processo é demorado e os maus fornecedores nem sempre são punidos de imediato. No futuro, serão, o que forçará uma elevação ainda maior na qualidade dos produtos e serviços. Uma segunda é o declínio no poder dos especialistas. Por exemplo, as receitas dos médicos podem ser verificadas em termos de eficiência -e verificadas em nível mundial, não só em um país. A incompetência pode ser localizada, desafiada e punida.
Uma terceira é o declínio no poder dos políticos ou, mais precisamente, pressão adicional para que eles façam o que os eleitores desejam, em lugar de seguirem suas preferências ideológicas pessoais.
Por outro lado, os benefícios dessa "democracia da internet" só se aplicam aos indivíduos com nível de educação suficiente para aproveitá-los. Temos de ter acesso, é claro, mas também é preciso que saibamos usar o fluxo de informações ora disponível. Como no caso de todos os avanços, e o que estamos vivendo é imenso, há pessoas que ficam para trás. A sociedade também precisa cuidar delas.


HAMISH MCRAE é colunista do "Independent", jornal em que este texto foi publicado originalmente.

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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