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OPINIÃO ECONÔMICA
ITR: um leão de papel
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
O presidente da República insiste em afirmar que o movimento dos sem-terra não dá o
devido crédito a seus esforços
em prol da reforma agrária.
Voltou a dizê-lo por ocasião do
seu encontro com as lideranças
do MST, na sexta-feira passada.
Um dos pratos de resistência
da argumentação do presidente
tem sido a nova legislação do
Imposto Territorial Rural
(ITR), aprovada em dezembro
de 1996.
Na entrevista coletiva concedida após o encontro, Fernando
Henrique referiu-se duas vezes
ao novo ITR e pediu que se reconheça o progresso feito pelo
governo nesse e em outros aspectos da questão agrária.
Em artigo distribuído pelo
Palácio do Planalto e publicado
pelos principais jornais do país
no domingo retrasado, o presidente chegou ao ponto de afirmar que "o novo ITR, por si só,
introduz verdadeira revolução
na estrutura fundiária do
país". A "revolução" se deve,
segundo ele, ao fato de que a
nova lei "elevou de 4,5% para
20% a alíquota sobre a grande
propriedade improdutiva, ao
mesmo tempo em que simplificou e facilitou a cobrança do
imposto".
Como seria de esperar, as lideranças do MST não se convenceram. No documento que entregaram ao presidente na sexta-feira, afirmam que o governo
não tem tido "vontade política
de realmente cobrar (o ITR) dos
latifundiários".
A legislação anterior, prossegue o documento, já permitia
uma cobrança significativa,
que não foi feita. Segundo o
MST, o ministro Raul Jungmann ``revelou à bancada ruralista que a legislação anterior
era mais punitiva ao latifúndio
do que a nova proposta do governo. Dessa forma, conseguiu o
apoio da bancada".
Vejamos o que está nas notas
taquigráficas da reunião do ministro Jungmann com a bancada ruralista e outros parlamentares, realizada no Congresso,
no dia 10 de dezembro de 1996,
pouco antes da aprovação do
novo ITR.
Na ocasião, alguns deputados
da bancada ruralista questionaram a alíquota de 20%, considerando-a "confiscatória".
Jungmann respondeu que a lei
anterior estabelecia "uma taxação muito mais gravosa". Isso porque continha um "mecanismo de progressão temporal", segundo o qual a alíquota
era multiplicada por dois, ano a
ano.
No caso da alíquota de 4,5%,
que vigorava para as grandes
propriedades com grau de utilização inferior a 30%, a alíquota "seria de 72% em seis
anos", afirmou o ministro.
"Portanto, se considerarmos
um horizonte de cinco a seis
anos, estamos sendo, inclusive,
menos gravosos do que o que
está vigendo", concluiu.
O governo fica devendo um
esclarecimento. Afinal, quem
são as vítimas do "marketing"
governamental -a bancada
ruralista, alvo das explicações
do ministro, ou a população em
geral, brindada com as constantes referências do governo
ao aumento das alíquotas sobre
as terras improdutivas no novo
ITR?
Seja como for, o que mais importa não é a alíquota nominal,
o percentual fixado em lei, mas
a alíquota efetiva, isto é, a relação entre o imposto pago e o
valor real da terra. Se o valor da
terra continuar a ser subestimado, as alíquotas efetivas continuarão irrisórias.
É o que provavelmente ocorrerá, em parte porque a nova lei
do ITR suprimiu o VTNm, o
valor mínimo da terra nua, previsto na lei anterior, que era
fixado pela Receita com base
em dados da Fundação Getúlio
Vargas.
O novo ITR é um tigre (ou
leão) de papel. Permanecerá insignificante como instrumento
de arrecadação ou de reforma
agrária.
Trata-se de um tributo complexo, que sempre foi fortemente sonegado. E a Receita Federal continua desaparelhada para fiscalizá-lo.
Paulo Nogueira Batista Jr., 42, professor da
Fundação Getúlio Vargas e pesquisador-visitante do Instituto de Estudos Avançados da
Universidade de São Paulo, escreve às quintas-feiras nesta coluna.
E-mail: pnbjr@ibm.net
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