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São Paulo, domingo, 24 de agosto de 2003

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Taxa menor fará país crescer, diz analista

GUILHERME BARROS
EDITOR DO PAINEL S.A.

O economista Paulo Guedes, 53, presidente do Ibmec Educacional, um instituto privado de educação, acha que o Brasil tem grande possibilidade de recuperação do crescimento a partir da queda dos juros. "Com os juros mais baixos, o país terá mais investimento e mais consumo", diz ele.
Guedes faz uma ressalva, no entanto. Segundo ele, o país ainda é vítima do que a social democracia fez na Europa. Enquanto nos Estados Unidos, que adotam a liberal democracia, foi criado 1,7 milhão de empregos por ano nos últimos 20 anos, na Europa não foram criados empregos.
A seguir, os principais trechos da entrevista.

Folha - O sr. acredita na retomada do crescimento?
Paulo Guedes -
Existe uma possibilidade rósea de uma recuperação cíclica. Em primeiro lugar, porque estamos trabalhando agora com uma trajetória fortemente declinante de juros, já que a inflação está indo para um dígito. Também estamos trabalhando com taxas de câmbio levemente ascendentes. Na medida em que o juro vai caindo, o câmbio vai subindo. Com juros mais baixos, você teria mais investimento e mais consumo, e com o câmbio mais alto você teria mais substituição de importação e mais promoção de exportações. São quatro fontes de pressão de demanda empurrando a economia para melhor. Esse é o lado bom.

Folha - E o lado ruim?
Guedes -
A economia brasileira está em contração. Nos últimos cinco anos, o país cresce a taxas de 1% ao ano. O Brasil trincou por excesso de peso. É o FMI que entra para ficar um ou dois anos e fica 21. É uma política monetária que, pela estabilidade, em vez de precisar de juro alto por um ou dois anos, fica quase duas décadas. A mãe de todo esse desastre é o excesso de gasto do governo.

Folha - O governo está atacando os problemas?
Guedes -
Foi uma surpresa espetacular a indicação do [Antonio] Palocci [Filho, ministro da Fazenda], que tem se revelado uma pessoa de muito bom senso. Ele ancorou bem a área econômica. Agora, acho que estamos sendo vítimas do que a social democracia fez na Europa. No regime americano, da liberal democracia, acredita-se que a economia de mercado é o fator preponderante de criação de riqueza para o país. Na Europa, já é diferente. O impacto do socialismo e da social democracia foi muito maior. A consequência disso é que, nos últimos 20 anos, a Europa não criou empregos. Enquanto isso, nos Estados Unidos, foi criado 1,7 milhão de empregos por ano.

Folha - O que é preciso ser feito?
Guedes -
O primeiro passo é tentar se aproximar da fronteira da produção. Não é nem investir, mas aumentar a eficiência de alocação dos recursos que já existem. O país precisa de uma reforma na Justiça trabalhista. Os encargos trabalhistas são muito altos. Lanço um desafio: o governo poderia fazer uma experiência e baixar os encargos em 20% para ver se a arrecadação sobe ou não. No Plano Real, o déficit público campeou solto no primeiro mandato de FHC. No segundo mandato, flutuamos o câmbio e adotamos o regime de metas de inflação. Finalmente, quando tivemos o braço torcido pelo FMI, corrigimos o déficit fiscal. No ano passado, todos correram para o dólar com medo do Lula, a dívida interna subiu para 60% do PIB e os bancos lá fora decidiram cortar o crédito. Se existisse o Banco Central independente, não teria ocorrido todo esse frisson.

Folha - Estamos na direção certa?
Guedes -
Chegamos ao aperfeiçoamento evolutivo e descobrimos que os preços e os salários devem ficar livres, desindexados, e que a política monetária é para ser usada com meta inflacionária. Há pouco tempo, voltou um zum-zum de inércia. Foi só o Banco Central mostrar suas armas [aumentar os juros], que sumiu a inércia. O problema é que o BC não pode ficar com o juro alto o tempo inteiro. Quero elogiar o PT. O PT aprendeu em seis meses o que os tucanos levaram quase duas décadas. Quando falo em tucanos, incluo os economistas tucanos, que estão há duas décadas no poder. Tudo o que é plano foi feito com inspiração dessa turma.

Folha - O que falta?
Guedes -
Primeiro, a autonomia do Banco Central, para não termos outro susto ali na frente. A outra coisa é a política cambial. Existem vários regimes de câmbio livre. Existe o câmbio flexível com US$ 500 bilhões de reserva, que é o caso do Japão. Tem o russo, com US$ 70 bilhões de reserva, e tem o câmbio flexível brasileiro, que é o "peladão", sem reserva. O Banco Central tem de admitir que, ao brincar de câmbio flexível, isso não significa ausência de intervenção. O Banco Central deveria adotar um sistema de meta de reservas, a exemplo do regime de metas de inflação. O Banco Central não é o proprietário das reservas cambiais, é o fiel depositário.

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