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Problema é "limpar" dinheiro de origem criminosa, diz especialista
TONI SCIARRETTA
DA REPORTAGEM LOCAL
A proposta de repatriar dinheiro brasileiro sem comprovação de origem é antiga e reaparece normalmente quando o
real desaba -o que não é o caso
atual- ou em períodos anteriores às eleições.
No Brasil, os principais argumentos a favor da proposta são
que sucessivos planos econômicos heterodoxos, instabilidade financeira, restrições
cambiais e fragilidade regulatória vividos até os anos 90 foram
um "convite" para remeter dinheiro ilegalmente ao exterior.
O problema é como separar
recursos que saíram do país por
"simples" sonegação -alvo
prioritário da proposta de anistia- do dinheiro proveniente
de narcotráfico, terrorismo,
corrupção, contrabando, sequestro e outras ilegalidades
indefensáveis. Como impedir
que parte desses recursos ilegais caminhem para caixa dois
e retroalimentem a corrupção?
Por mais controverso que o
assunto seja, países como Estados Unidos, Espanha, Itália,
México e Chile, entre outros,
promoveram algum tipo de
anistia a recursos ilegais no exterior. Os objetivos variaram
desde recuperar a arrecadação,
reequilibrar a taxa de câmbio e
fomentar investimentos até carimbar a origem de dinheiro.
Após a crise, recursos sem
atestado de legalidade não estão mais seguros como antes.
Reguladores de EUA e Europa
discutem restrição a paraísos
fiscais e ao sigilo bancário total
e aperto à lavagem de dinheiro.
Segundo o economista Natham Blanche, da consultoria
Tendências, as regras de restrição cambial vigentes antes da
flutuação do real em 1999 "empurravam" para a ilegalidade
empresas e pessoas físicas, que
tinham de recorrer a práticas
paralelas à legalidade para
manterem suas atividades.
Blanche lembra que o governo
chegou a determinar o que se
podia importar, além de limitar
o direito de ir e vir de turistas.
"Essas pessoas merecem retornar com esse dinheiro para o
Brasil. Isso é poupança brasileira no exterior. Se houver ingresso, ela aumentará o nível de
investimento. Mas tem de separar o joio do trigo; não tem de
dar a mesma oportunidade a
quem cometeu um crime e a
quem fez uma operação paralegal e forçosamente teve de utilizar mecanismos paralelos para manter tanto suas atividades
empresarias como civis", disse.
O ex-secretário da Receita
Federal, Everardo Maciel, afirma ser completamente contrário à proposta de anistia por
permitir a "legalização" de um
dinheiro de origem duvidosa e
ainda somado a um benefício
fiscal. Isso porque a pessoa física tem alíquota de 27,5% de IR
e as empresas podem pagar até
34%, enquanto a repatriação de
recursos ilegais poderá ter alíquota de 10% a 15%.
Maciel lembra que a Receita
Federal sempre permitiu ao
contribuinte irregular pagar o
débito apenas com multa e juros, extinguindo a punição em
caso de espontaneidade do infrator. Para Maciel, grande parte desse dinheiro ilegal já está
no país, possivelmente na Bolsa
e em renda fixa, gozando do
status de capital estrangeiro
proveniente de paraísos fiscais.
"De onde vem o dinheiro?
Como distinguir se o dinheiro é
decorrente de narcotráfico,
corrupção, extorsão, contrabando ou se foi "simples" -e friso essas aspas- sonegação? As
pessoas que cometeram uma
ilegalidade, de naturezas variadas, além de serem anistiadas,
vão receber benefício fiscal."
Para advogados, a anistia só
funcionará se houver garantia
de sigilo bancário. No caso, os
bancos poderiam assumir a
responsabilidade de atestar se
o dinheiro é proveniente de crime ou exclusivamente de sonegação, sem violar esse sigilo.
"Não seria uma delegação excessivamente temerária [aos
bancos]?", pergunta Maciel.
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