São Paulo, quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

MARTIN WOLF

Reequilíbrio da economia chinesa


As medidas de curto prazo tomadas neste ano para reequilibrar a economia são um expediente temporário

A CHINA teve uma boa crise. Isso se tornou evidente no "encontro de verão" do Fórum Econômico Mundial de Davos, realizado em Dalian menos de duas semanas atrás. A confiança chinesa era palpável. Mas a ansiedade era igualmente grande. O gigante sobreviveu ao choque. Mas sua recuperação está sendo impulsionada por uma alta no crédito e nos investimentos fixos. Em prazo mais longo, a China precisa reequilibrar sua economia, estimulando o aumento do consumo. É hora de os chineses se divertirem mais. Isso certamente não será desagradável para eles.
O homem que melhor retrata tanto a confiança como a incerteza dos chineses é o primeiro-ministro Wan Jiabao. Ele declarou durante a reunião que "a crise financeira mundial sem precedentes teve um custo pesado para a economia chinesa. Nós enfrentamos os desafios e as dificuldades com plena confiança". Mas ele também admitiu que "a estabilização e a recuperação da economia chinesa ainda não estão firmes, sólidas e equilibradas".
Os dados que surgem na China sugerem que uma poderosa recuperação está em curso. No primeiro semestre deste ano o PIB se expandiu em 7,1%. As projeções de consenso para este mês sugerem que a economia se expandirá em 8,3% em 2009 e em 9,4% em 2010. O gigante da Ásia deve se tornar a segunda maior economia do mundo já em 2010.
De acordo com a Economist Intelligence Unit, a demanda doméstica pode se expandir em até 11,5% em termos reais neste ano. Uma alta dessa ordem na demanda interna chinesa é exatamente o necessário.
O consumo dos domicílios chineses também deve crescer em 9,3%. No entanto, como de hábito, o investimento fixo real é que serve como locomotiva, e a projeção é de que cresça 14,8% neste ano. Caso isso se confirme, esse item terá crescido acima do PIB nos dez últimos anos, com exceção de apenas um ano. Essa relação cada vez mais elevada entre investimento e PIB, partindo de uma base já alta, não é um ponto forte, mas sim uma fraqueza. Ela sugere um declínio no retorno sobre o capital. Além disso, quando os índices de crescimento enfim caírem, o colapso do investimento causará um sério rombo na demanda.
O mais encorajador dos desdobramentos é a contração nos superavit comerciais e em conta corrente chineses. Tanto as exportações como as importações caíram acentuadamente, mas as exportações caíram ainda mais. No entanto o comércio internacional da China anda tão instável que é difícil ter certeza de que chegamos a um ponto de inflexão.
Muito dependerá da natureza e do ritmo da recuperação mundial.
Além disso, o país continuará a manter um superavit substancial em conta corrente e a acumular ainda mais reservas cambiais, se bem que estas já sejam muito maiores do que a China precisa para fins de seguro.
As reservas, afinal, já atingiram US$ 2,132 trilhões em junho último, o equivalente a mais de 40% do PIB.
As medidas de curto prazo tomadas para reequilibrar a economia, por meio de expansão do crédito e alta no investimento fixo, são um expediente temporário. Precisam conduzir a um plano que reequilibre a economia e privilegie o consumo. Isso serve aos interesses chineses. E também serve aos interesses de uma economia mundial mais equilibrada. Caso a resposta bem-sucedida deste ano conduza nessa direção, a crise terá propiciado um grande benefício em longo prazo.
Como os líderes de Washington gostam de dizer hoje em dia, "uma crise é coisa horrível de desperdiçar". A gramática deles pode não ser perfeita. Mas estão certos e não apenas quanto aos Estados Unidos.


Tradução de PAULO MIGLIACCI

MARTIN WOLF é colunista do "Financial Times"

Hoje, excepcionalmente, a coluna de PAULO NOGUEIRA BATISTA JR. não é publicada.


Texto Anterior: Frase
Próximo Texto: Aneel quer inflação fora da tarifa de energia
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.