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Aneel quer inflação fora da tarifa de energia
Agência estuda aproveitar renovação de concessões do setor para acabar com reajustes que repõem a inflação para empresas
Para companhias do setor, medida é "impossível", mas governo alega que mudança ajudará a diminuir o nível de indexação da economia
AGNALDO BRITO
DA REPORTAGEM LOCAL
O diretor-geral da Aneel
(Agência Nacional de Energia
Elétrica), Nelson Hubner, disse
ontem em São Paulo que os repasses anuais da inflação, medidos em índices como o
IGP-M e o IPCA, podem ser eliminados em parte dos contratos de energia negociados hoje
no setor elétrico.
O governo prevê que isso irá
beneficiar os consumidores,
que pagam esses repasses nas
contas de luz. Hoje, a Aneel autoriza todos os anos reajustes
para repor a inflação.
"A inflação eleva a tarifa de
energia elétrica. Esta, por sua
vez, afeta o índice de inflação, o
que vai realimentar o próprio
aumento de tarifa. Então fica
como que o cachorro correndo
atrás do rabo", disse Hubner.
O objetivo da medida é quebrar um dos elos da indexação
da economia. Energia elétrica é
um dos insumos essenciais da
atividade econômica. Qualquer
elevação de custo é logo repassada para os preços finais.
A medida provisória que
criou o Plano Real previa medidas de desindexação da economia, mas jamais quebrou o modelo de indexação nos contratos de energia elétrica no país.
Há certo desconforto na
Aneel, que ao longo de todo o
primeiro trimestre autorizou
grandes reajustes no preço da
energia elétrica ao mesmo tempo em que o país enfrentava
uma crise. Segundo Hubner, os
atuais ganhos de eficiência são
engolidos pela inflação sobre as
tarifas administradas.
A eliminação da cláusula de
repasse automático da inflação
para a tarifa de energia, entretanto, não será aplicada a todos
os contratos. A mudança também não será imediata. O governo acha mais viável eliminar
o repasse automático da inflação a partir da chamada "energia velha", produzida nas usinas já amortizadas.
Por isso, o governo estuda
impor a nova regra como condição para a renovação das concessões que começam a vencer
no início da próxima década.
Portanto, só a partir de então,
os efeitos do não repasse da inflação começariam a ser observados pelos consumidores.
Um grupo do governo estuda
como essas concessões podem
ser renovadas. O fim do repasse
automático da inflação nos
contratos de venda de energia
seria uma imposição para a renovação da concessão.
É algo que poderá valer para
os projetos antigos, mas não
para os novos. "Essa medida já
é mais difícil de ser adotada,
por exemplo, no caso dos empreendimentos novos, como o
projeto da usina hidrelétrica de
Belo Monte. Isso porque o projeto precisa de condições de financiabilidade, e o financiador
cobrará a existência de uma
cláusula de reposição da inflação para os contratos de venda
de energia. No caso das usinas
antigas (que poderão ter a concessão renovada), a situação é
diferente", disse Hubner.
O assunto está em discussão
no grupo de estudos de revisão
tarifária da Aneel. A assessoria
de comunicação do Ministério
de Minas e Energia confirmou
ontem que o tema é de interesse do governo. O trabalho na
Aneel é, inclusive, acompanhado de perto por técnicos do ministério. A proposta, entretanto, ainda não alcançou o grupo
de estudos formado pelo ministério para definir se haverá e
como ocorrerá a renovação das
concessões que vencem nos
próximos anos.
Reação
Flávio Antônio Neiva, presidente da Abrage (Associação
Brasileira das Empresas Geradoras de Energia Elétrica), considerou a ideia do governo "impossível" de ser adotada. "Os
geradores vão incluir o reajuste
da inflação. É impossível não
considerar o repasse da inflação. Como vender energia por
prazos de 20 anos ou 30 anos
sem ter cláusula que assegure a
atualização dos custos com base na inflação?", questionou.
Segundo ele, o repasse anual
da inflação não representa o
maior custo da tarifa de energia. O efeito dele na tarifa final,
afirma, é pequeno.
Para Luiz Carlos Guimarães,
presidente da Abradee (Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica), essa
seria uma medida "não habitual" no setor. "Não há milagre.
Se o governo adotar essas medidas para as concessões novas
ou renovadas [as antigas não
podem ter a regra mudada], o
que vai ocorrer é que a empresa
irá estimar a inflação de um período mais longo para que a
concessão consiga passar quatro ou mais anos sem os repasses anuais da inflação. O preço
da energia iria ser mais caro",
conclui Guimarães.
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