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CRASH REVISITADO
Grande Depressão completa 80 anos e ainda intriga economistas e historiadores, que veem semelhanças entre 1929 e a crise atual -resposta mais eficiente dos governos hoje, contudo, evitou estagnação
Associated Press - 24.out.1929/Arquivo
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Multidão em frente à Bolsa de Valores de Nova York na Quinta-Feira Negra, quando o Dow Jones caiu 11% e iniciou o maior movimento de desvalorização de sua história
TONI SCIARRETTA
DA REPORTAGEM LOCAL
Um clima de euforia no ar,
com crescimento inédito da
economia, uma classe média
emergente, crédito farto, um
setor privado de grande potencial, aberturas de capital que levantavam fortuna na Bolsa, em
que até o pequeno investidor
conseguia dobrar seu capital
em questão de meses.
A descrição não difere muito
do Brasil de 2009 e 2007, auge
do Novo Mercado da BM&F
Bovespa, mas se refere aos EUA
de 1929, às vésperas dos cinco
dias úteis que varreram um terço da riqueza americana, colocou o capitalismo de mercado
em xeque, cortaram o emprego
de 25% da população e colocaram o mundo na maior depressão econômica conhecida.
A recuperação da economia
só aconteceu em 1943, e a Bolsa
só retomou o terreno perdido
25 anos depois, em 1954.
A primeira trombeta que
acendeu o pânico entre os investidores aconteceu há exatos
80 anos, no dia 24 de outubro
de 1929, dia que entrou para a
posteridade como a Quinta-Feira Negra da Bolsa de Nova
York, que no período caiu 11%.
Após sinais de retração na
produção industrial, saturação
do consumo e colapso no preço
do café, principal produto brasileiro de exportação e uma das
commodities mais importantes
da época, investidores perderam a confiança de que o mercado seguiria em alta perpétua
e iniciaram a venda de ações.
Prevendo o caos, cinco dos
maiores bancos americanos,
entre eles o First National City
Bank, que antecedeu o contemporâneo Citi, queimaram US$
20 milhões cada um para segurar os preços das ações. A iniciativa funcionou num primeiro momento.
Sucedeu-se um
dia de trégua e um final de semana de suspense, mas isso
não impediu que na segunda-feira investidores apavorados
corressem em pânico para se
desfazer de ações antes que os
preços desabassem mais. Foi a
Segunda-Feira Negra, quando
o Dow Jones retrocedeu mais
de 13%. O golpe final aconteceu
no dia 29, a Terça-Feira Negra,
com queda de quase 12%.
Até hoje, historiadores e acadêmicos tentam entender como o caos se instalou e se houve
realmente uma gota d"água que
tornou insustentável a situação
artificial que os mercados mantiveram durante os anos 20.
Orgia de especulação
A riqueza americana foi inflada após cinco anos de alta
contínua na Bolsa de Nova
York, chamados de "orgia de
especulação" pelo ministro britânico da Economia à época,
Philip Snownden, após o índice
Dow Jones, principal termômetro da Bolsa, saltar 500%. A
pujança permitiu a sofisticação
do sistema financeiro americano e o florescimento de mais de
20 mil pequenas casas bancárias. Os EUA chegaram a ter 31
mil bancos em 1921.
Para Renato Colistete, professor de história econômica da
USP, a crise atual se assemelha
à de 1929 pela volatilidade no
mercado de ações e pelo colapso da confiança nos bancos.
Mas difere pela resposta dada
pelos governos e reguladores,
que atuaram em conjunto para
injetar liquidez no sistema financeiro e evitar uma pane
completa na economia.
"A sequência da crise de 29 e
da do ano passado é mais ou
menos a mesma. Houve um
boom, um excesso de otimismo
no mercado que não se sustentou, e a perda de confiança. A
diferença é que, em 29, o BC
dos EUA tentou controlar essa
bolha restringindo o crédito e
reduzindo a liquidez. Desta vez,
juntou forças com os demais
bancos centrais e injetou muito
dinheiro no mercado."
"O BC americano, desta vez,
criou 11 linhas de crédito para
irrigar a economia. Criou-se
um socorro de US$ 6 trilhões.
Atenderam o mercado, setores
de produção, como a GM, e os
bancos, para que essa crise não
se espalhasse por todo o sistema. Fizeram o inverso do que
em 1929", disse Ernesto Lozardo, economista da FGV (Fundação Getulio Vargas).
Em 1929 os EUA deixaram
quebrar boa parte dos bancos
que se arriscaram demais, uma
atitude darwinista de purificação do sistema financeiro, que
teve como efeito colateral espalhar o risco de calote. O resultado foi a quebra de quase 12 mil
bancos entre 1929 e 1933, ano
em que 4.000 instituições financeiras faliram.
Desta vez, o sistema financeiro estava consolidado, o que
não impediu a venda da corretora Merrill Lynch para o Bank
of America e a quebra dos bancos de investimento Bear
Stearns e Lehman Brothers.
Grandes demais para quebrar,
como se diz no mercado, os demais bancos foram todos socorridos pelo governo.
Para preservar seus mercados, o governo americano criou
na década de 30 barreiras alfandegárias e elevou os impostos de importação, o que paralisou o comércio internacional,
derrubou o preço das commodities e trouxe deflação. Hoje,
80 anos depois, os países seguraram o ímpeto protecionista.
Leia a cobertura especial
sobre a crise de 1929
www.folha.com.br/092885
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