|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Na periferia da crise, Brasil teve de abandonar café
DA REPORTAGEM LOCAL
Distante do epicentro da
crise financeira, o Brasil de
1929 foi contaminado pelo
colapso no preço do café,
commodity responsável na
época por 80% da pauta de
exportação brasileira. O produto teve seu auge em 1928 e
perdeu mais de 50% do valor
cinco meses após o "crash"
na Bolsa de Nova York.
Para segurar as cotações
do café, o governo brasileiro
promovia queima do produto estocado, com objetivo de
reduzir a oferta mundial. O
resultado foi a quebra de
grande parte dos cafeicultores, que até então dominavam a economia brasileira.
Como ocorreu nas demais
crises globais, o valor do dólar duplicou no Brasil em
menos de um ano, inviabilizando importações, mas fomentando e diversificando a
indústria nacional.
À época com 15 anos, o empresário José Mindlin, 95,
lembra que o dólar disparou
poucos meses depois do
"crash" da Bolsa de Nova
York. Em 1930, Mindlin estudava nos EUA e seu pai,
Ephin Henrique, que era
dentista em São Paulo, não
pôde mantê-lo no exterior.
"Tive que voltar para o
Brasil. Nos anos 20, tudo era
importado aqui. Me lembro
de começar a usar sapato
brasileiro porque não dava
mais para comprar sapato
inglês. No ambiente que eu
frequentava, era um pouco
degradante vestir um terno
que não fosse de casimira inglesa. Hoje, a casimira brasileira é tão boa ou melhor do
que a inglesa. Falar em casimira inglesa hoje é que é degradante", disse Mindlin.
O pai de Mindlin tinha
comprado uma fazenda de
café em Campinas em 1927,
quando o café estava no auge.
"Em 1930, a saca do café era
menos que o custo de colheita. Papai vendeu a fazenda alguns anos depois."
De volta ao Brasil, Mindlin
tornou-se jornalista do "Estado de S.Paulo", onde ajudou a cobrir os efeitos da crise e o processo de urbanização do Brasil.
Ligada à cultura de café
desde o final do século 19, a
família de Eduardo Carvalhaes, 84, abriu uma corretora em Santos, em 1918, ainda
antes do "boom" da commodity nos anos 20. Carvalhaes
conta que a crise arrasou o
mercado cafeeiro e reduziu
os negócios até levar ao fechamento, em 1937, da Bolsa
de Café de Santos.
"Os anos 30 foram muito
difíceis para a nossa família,
que atravessou duas guerras
e duas ditaduras negociando
café. O pessoal que se safou
passou a diversificar mais e
foi se dedicar a outras atividades", disse Carvalhaes Filho, ligado ao Museu do Café.
Segundo Renato Colistete,
professor de história econômica da USP, a crise dos cafeicultores colocou em situação delicada o Brasil perante
seus credores nos EUA e Reino Unido. "Houve preocupação com uma moratória do
Brasil, que trouxe perdas e
acentuou o problema dos
bancos americanos", disse.
Texto Anterior: Frases Próximo Texto: Resenha: Correspondente faz livro sobre a crise atual Índice
|