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RESENHA
Correspondente faz livro sobre a crise atual
VINICIUS TORRES FREIRE
COLUNISTA DA FOLHA
Pouco antes do início da crise, em 2007, Marcelo, que migrara de Minas Gerais para Nova Jersey, tinha duas casas financiadas, as quais valiam US$
1,1 milhão. Em 2008, após as
quebras de bancos e outros desastres, Marcelo devolvera os
imóveis. As prestações eram altas demais para o que as casas
então valiam -40% menos. Foi
morar com o cunhado e dirigia
uma limusine para viver. O desastre pessoal de Marcelo, de
outros migrantes e de americanos pontuam "Desastre Global", de Fernando Canzian.
A obra é a reunião dos artigos
que Canzian escreveu para a
Folha Online durante sua mais
recente estadia nos Estados
Unidos. O autor é repórter especial da Folha e foi enviado a
Nova York a fim de cobrir o tumulto nas finanças dos EUA,
assuntos nos quais tem sólida
experiência. Canzian foi repórter de finanças e já fora correspondente da Folha nos EUA,
em Nova York e Washington.
Canzian tinha a tarefa diária,
urgente e difícil de traduzir os
tecnicismos de uma crise financeira especialmente obscura. Mas, como ótimo repórter,
procurava dar caráter palpável
para os efeitos cotidianos do
colapso. O autor se sai bem
nessa tarefa de equilibrista.
Num artigo, Canzian troca
em miúdos o funcionamento
de um dos derivativos que detonaram a crise e trata dos efeitos macroeconômicos da ruína
desses papéis. Mas sempre interpola suas explicações com
quadros vívidos de origens e
consequências do problema.
Canzian não recolhe suas histórias por acaso ou condescendência. Seus casos mostram a
operação real da economia. A
fantástica fábrica de investimentos exóticos, afinal, era
movida por pessoas e tinha
efeito reais, demasiado reais.
Canzian não conta apenas a
história miúda e de pessoas ditas comuns. Está lá em seu livro o caso de Lawrence Summers, principal assessor econômico de Barack Obama. Quando secretário do Tesouro de
Bill Clinton, Summers defendia a liberdade irrestrita para o
mercado financeiro, o que acabou em "desastre global". Ou o
autor vai ainda um pouco mais
longe, ao relatar as origens da
política e da mentalidade do
absolutismo de mercado: os
anos de Ronald Reagan.
O último artigo é de agosto
de 2009. Canzian teve assim a
oportunidade de contar como
os bancos voltaram a lucrar
com base em ajudas "regulatórias" e financeiras estatais. E de
explicar como o governo americano se endividou a fim de
evitar uma crise maior que a
Grande Depressão de 1929.
Assim, beneficiou um dos
principais responsáveis pelo
desastre -a grande finança
americana. Em tom de ironia a
respeito dessa ironia da história, Canzian termina seu relato
completo e didático do ano que
viveu em meio à crise.
DESASTRE GLOBAL
Autor: Fernando Canzian
Editora: Publifolha
Quanto: R$ 12,90 (96 págs.)
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