São Paulo, segunda-feira, 24 de novembro de 2008

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Lula não vai limitar compra de terra

Governo desiste de restringir investimento de estrangeiros em um momento de escassez de crédito

Medidas para controlar compra por estrangeiros, consideradas ameaça ao país, estão "congeladas" na AGU desde setembro


Luiz Carlos Murauskas - 10.dez.07/Folha
Plantação de soja é pulverizada por máquina em fazenda em Mato Grosso; alta de commodities agrícolas acentuou o interesse de estrangeiros por terras no Brasil

EDUARDO SCOLESE
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Por conta da crise financeira internacional, o Palácio do Planalto determinou à AGU (Advocacia Geral da União) que mantenha na gaveta as propostas de mudanças na legislação para restringir a compra de terras por estrangeiros no país.
O argumento para segurar pelo menos por ora essas medidas é que, num momento de escassez de crédito e de contenção de recursos, o governo não pode vetar ou restringir a entrada de qualquer tipo de investimento internacional.
Urgentes até outro dia, quando a chamada "estrangeirização" das terras do país era apontada como uma espécie de ameaça à soberania nacional, as medidas estão prontas e paradas na mesa do ministro José Dias Toffoli (AGU) desde o início de setembro, dias antes do estouro da crise internacional.
O que preocupa o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não são apenas os efeitos técnicos e práticos dessas medidas mas o simbolismo de, neste momento, ser visto no exterior como um país que despreza investimentos estrangeiros.
Nas mãos de Toffoli, há dois mecanismos jurídicos. O primeiro deles, e que cabe diretamente ao advogado-geral da União, é a revogação de um parecer emitido em 1997 pelo órgão. Ele diz que, na lei nº 5.709, de 1971, o parágrafo que faz restrição às pessoas jurídicas brasileiras controladas por capital estrangeiro não foi recepcionado pela Constituição de 1988 e, portanto, estaria revogado.
Agora, a AGU mudou de opinião. O consultor-geral do órgão, Ronaldo Jorge, concluiu que esse parágrafo foi recepcionado pela Constituição de 1988 e que o parecer de 1997 é que precisa ser revogado. Essa canetada de Toffoli, porém, depende do aval de Lula.
Desde que a crise econômica veio à tona, Lula tem se mostrado resistente a mudanças antes dadas como certas e que poderiam inibir investimentos. Além da medida da terra, ele adiou o anúncio das regras do zoneamento da cana, mecanismo acordado entre os ministérios da Agricultura e do Meio Ambiente para impedir o avanço da cultura na Amazônia.
Segundo a legislação em vigor, a aquisição de terra está vedada a pessoa física estrangeira não residente no país e a pessoas jurídicas não autorizadas a funcionar no Brasil. Além disso, a compra está limitada a pessoas físicas estrangeiras residentes no país e a pessoas jurídicas estrangeiras autorizadas a funcionar no Brasil.
Com o parecer de 1997 da AGU ainda em vigor, não há limite para pessoas jurídicas brasileiras com a maioria de suas ações com direito a voto controlada por estrangeiros.
Não há como quantificar o volume de recursos que deixará de entrar no país caso esse parecer seja de fato revogado. Um dos setores que poderiam ser atingidos é o de celulose, com suas vastas plantações de eucaliptos, em que é grande a atuação de estrangeiros.
Reportagem de julho da Folha mostrou que, segundo dados do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), fazendeiros e investidores estrangeiros compram ao menos 0,5 quilômetro quadrado de terras brasileiras a cada hora, o que, ao final de um dia, significa 12 quilômetros quadrados legalmente em mãos de pessoas físicas ou jurídicas de outras nacionalidades. Na época, havia 40,3 mil quilômetros quadrados legalmente sob o controle de estrangeiros -o que não inclui as empresas brasileiras controladas por pessoas de outros países.
O segundo mecanismo jurídico, parado no governo, é um projeto de lei sobre o tema a ser encaminhado ao Congresso. Ainda incipiente, o texto trataria não apenas da compra de terras por estrangeiros mas também de limites fundiários para brasileiros.


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