São Paulo, segunda, 25 de janeiro de 1999

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MERCADO TENSO
Lideranças industriais defendem a alternativa; banqueiros e economistas liberais alertam para perigo
Controle de câmbio divide empresários

Luci Piton - 3.nov.97/Folha Imagem
Boris Tabacof, presidente da Associação Brasileira de Celulose e Papel, que é favorável à centralizalização


Boris Tabacof, presidente da Associação Brasileira de Celulose e Papel, que é favorável à centralização da Redação


A centralização do câmbio como alternativa para o país enfrentar a aguda crise econômica em que se encontra é apoiada por setores produtivos e criticada por representantes do setor financeiro e economistas considerados liberais.
Líderes industriais ouvidos pela Folha acreditam que, apesar dos riscos inerentes à restrição ao livre mercado, a proposta traz vantagens ao Brasil. A opção foi defendida ontem pela Folha, em editorial na primeira página.
O Iedi, que reúne um grupo de empresários que propõem uma política industrial ativa, defende a centralização urgente do câmbio.
O objetivo, segundo Eugênio Staub, presidente do Iedi (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial), é conter a desvalorização excessiva do real, impedir a saída de dólares e afastar o fantasma da volta da inflação.
Crítico ferrenho da sobrevalorização cambial, Staub acha que a retirada da âncora cambial foi feita de forma desastrada. "Essa situação de oferta e procura vai levar o real para o espaço porque a demanda é maior."
"A centralização cambial vai permitir que o governo controle o mercado porque a taxa de R$ 1,80 por dólar é loucura. Qualquer nível acima de R$ 1,60 representa o fim do Plano Real porque ficará difícil controlar a inflação."
Ele discorda do presidente do Banco Central, Francisco Lopes, para quem o real poderia flutuar por seis meses até encontrar um ponto de equilíbrio.
"O Brasil não tem nem seis dias para resolver esse assunto quanto mais seis meses. Temos de defender nossa moeda, mas estou sentindo que o governo não está com a preocupação da urgência."
Boris Tabacof, presidente da Associação Brasileira de Celulose e Papel, disse que a centralização é importante para impedir a escalada imprevisível do dólar.
Para evitar o impacto negativo da medida no exterior, Tabacof acha que o governo tem de evitar que a centralização seja confundida com moratória.
Tabacof disse que a indústria apóia a centralização, embora não seja medida ideal, porque ela é a única maneira do governo administrar a saída de dólares sem recorrer aos juros "estratosféricos".
O presidente da Abrinq (associação dos fabricantes de brinquedos) e vice-presidente do Ciesp (entidade-irmã da Fiesp), Synésio Batista da Costa, defende a centralização "neste momento de crise de confiança". Segundo ele, o governo mostraria ao mercado "que não perdeu o controle da situação. Hoje, parece o contrário." Para Synésio, a medida deveria ser usada em caráter emergencial e provisório.
Segundo Synésio, "com o sistema de livre flutuação, as cotações do real só vão se estabilizar daqui a cinco ou seis meses e nos patamares desejados por poucos bancos".
Para Synésio, a proposta de centralização cambial terá forte apoio. "Se continuarmos como estamos, o mercado financeiro vai acabar com toda a chance de produção."
O professor da Faculdade de Economia e Administração da USP, Eduardo Giannetti, discorda. Para ele, a centralização cambial pode "quebrar o país".
Segundo Giannetti, o país tem em 99 compromissos externos de US$ 55 bilhões. "Com a centralização cambial, o país se isola da comunidade financeira e acaba com qualquer possibilidade de obtenção de recursos voluntários."
Isso significa, segundo ele, o fim do ingresso dos US$ 31 bilhões que restam da ajuda do FMI e países ricos. Além disso, acredita, os empréstimos de médio e longo prazo não seriam renovados e o investimento direto seria afastado por causa das dificuldades em remeter lucros e dividendos.
Giannetti considera "praticamente impossível" obter o apoio do FMI para a centralização cambial. "Existem cláusulas entre os países participantes do Fundo que são muito claras no que diz respeito ao livre fluxo de capitais. Com a centralização cambial, o Brasil estaria rompendo com o FMI."
O ex-ministro Marcílio Marques Moreira não acredita que a centralização possa reduzir os juros e inibir a ação dos capitais especulativos. "A livre flutuação é, ainda, o melhor caminho para reduzir os juros. O governo deve transmitir, sim, mais confiança",diz Marcílio, consultor da Merrill Lynch.
Para o ex-ministro Mailson da Nóbrega, a centralização do câmbio é uma "não-alternativa", só tomada quando não há mais o que fazer. "Uma proposta como essa é assustadora. Pedir para que se faça isso para preservar as reservas equivale a dizer: já que se corre o risco de morrer, que se suicide."
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LEIA MAIS sobre o Real em crise nas págs. 2-3 a 2-6



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