São Paulo, terça-feira, 25 de março de 2008

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Déficit explode com remessas e importados

País tem no primeiro bimestre do ano o maior déficit desde 1947 nas suas transações com o exterior, de US$ 6,3 bi

BC vê déficit de US$ 12 bi no ano, contra US$ 3,5 bi há 3 meses; montadoras e bancos turbinam envio de lucros e importação cresce

SHEILA D'AMORIM
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Principal canal de contágio da economia brasileira diante de turbulências internacionais e importante ponto de apoio para o controle da inflação nos últimos anos, as contas externas brasileiras já dão sinais de enfraquecimento.
A previsão para 2008 do Banco Central do déficit nas transações do país com o mundo mais do que triplicou. Em vez dos US$ 3,5 bilhões estimados há três meses, o déficit agora deve ficar em US$ 12 bilhões, ou cerca de 1% das riquezas produzidas no país (PIB), após cinco anos de superávits.
No mercado financeiro, espera-se até o dobro: déficit de 2% do PIB. As principais causas são o forte crescimento das importações, que reduz o saldo comercial, e o aumento das remessas de lucros e dividendos.
As estatísticas do BC mostram que, ao contrário do que afirmou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a crise internacional originada nos EUA já está trazendo prejuízos indiretos ao país. A deterioração das contas externas tem um peso ainda maior porque se dá num momento delicado da inflação.
O BC contou, nos últimos anos, com as importações para controlar os preços. Havia uma situação confortável nas contas externas, as exportações estavam com toda força e compensavam a procura por produtos importados estimulada pelo real valorizado. Os importados mais baratos ajudavam a neutralizar eventuais pressões por reajustes, dizem analistas.
Mas agora o espaço para acomodar importações cada vez maiores sem preocupação com o saldo final das contas externas diminui. "O espaço para apreciações maiores do câmbio estreitou. O setor externo não conseguirá segurar sozinho pressões inflacionarias", avalia o economista Caio Megale, da MauáInvest.
Com isso, avalia, a demanda precisa ser reduzida ou a inflação deverá subir. O governo já dá sinais de preocupação com o crescimento do consumo, mas quer evitar um aumento dos juros que trave a economia como aconteceu após o forte crescimento de 2004.
O Brasil cresceu 5,4% em 2007. Neste início de ano, os dados disponíveis apontam um nível de atividade ainda mais acelerado. Com isso, as empresas aqui instaladas, sobretudo da área automotiva e financeira, elevaram o lucro enviado para suas matrizes. Os dois setores estão entre os mais punidos com a crise financeira e o quadro de recessão nos EUA.
No primeiro bimestre do ano, as remessas de lucros e dividendos para o exterior somaram US$ 4,317 bilhões, o dobro dos US$ 2,191 bilhões do mesmo período do ano passado. Em março, até ontem, já alcançavam mais US$ 2,540 bilhões. O setor de veículos respondeu por cerca de 28% das remessas, e o financeiro, por 15,6%.
O BC calcula que, ao longo de 2008, essas remessas chegarão a US$ 24 bilhões, US$ 4 bilhões a mais que a projeção anterior. Já as importações cresceram, no bimestre, 54% em comparação com o mesmo período de 2007 e somaram US$ 24,251 bilhões. Enquanto isso, o aumento das vendas externas foi de 24% no bimestre, somando US$ 26,077 bilhões.
Em 2008, o BC projeta aumento de US$ 10 bilhões nas exportações em relação ao dado estimado anteriormente (de US$ 172 bilhões para US$ 182 bilhões) e de US$ 13 bilhões nas importações (de US$ 142 bilhões projetados antes para US$ 155 bilhões).
Com esse desempenho, o saldo das transações correntes -que contabiliza o saldo comercial e de receitas e despesas com serviços, rendas e transferência unilaterais- chegará a um déficit de US$ 12 bilhões no final do ano, projeta o BC.
No primeiro bimestre, ele já foi de US$ 6,322 bilhões, o pior desempenho desde o início da série, em 1947.
Somente em fevereiro, o déficit nas contas externas foi de US$ 2,09 bilhões, também um recorde histórico para o mês. O BC esperava um resultado negativo de US$ 1,7 bilhão. Segundo o chefe Departamento Econômico do BC, Altamir Lopes, o forte aumento das importações vai ser diluído ao longo do ano e o ritmo atual não se sustentará.


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