São Paulo, quarta-feira, 25 de março de 2009

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ARTIGO

Por que ainda estamos longe do sucesso

MARTIN WOLF
DO "FINANCIAL TIMES"

MINHA PREOCUPAÇÃO cresce cada vez mais. Jamais esperei muito de europeus ou japoneses. Mas esperava que os EUA, sob um presidente novo e popular, agissem de maneira mais decidida. Em lugar disso, o Congresso está cedendo a um frenesi de populismo, e o governo se limita a esperar que tudo termine bem.
Emergiu nos EUA uma hostilidade explosiva ao setor financeiro. O Congresso debate taxar os bônus de executivos. E o procurador-geral de Nova York quer que sejam revelados os nomes. Isso equivale a um convite ao linchamento.
Se aprovadas, essas ideias levariam a um êxodo de pessoal qualificado dos bancos, destruiriam a confiança em acordos com o governo e ameaçariam o Estado de Direito. Que ideias assim sejam debatidas abertamente é um sinal claro das dimensões da raiva.
O mesmo cenário está envolvido no programa anunciado anteontem. Por ele, o governo fornece virtualmente todo o financiamento e arca com quase todo o risco, mas utiliza o setor privado para formar os preços dos ativos. Em troca, os investidores privados obtêm recompensas -talvez generosas- com base no desempenho.
Interpreto essa ideia como "esquema de alívio a fundos abutre". Mas vai funcionar? Depende do significado de "funcionar". Não se trata de um mecanismo real de mercado, porque o governo subsidia os riscos. Os preços podem não ser baixos o bastante para atrair compradores ou altos para satisfazer vendedores. Mas o esquema pode melhorar a situação lastimável das carteiras de operações dos bancos. Isso certamente não pode ser mau, pode? Na verdade pode, caso sirva como obstáculo a soluções mais fundamentais, porque ninguém -e especialmente não o Tesouro- acredita que esse esquema porá fim à subcapitalização crônica do setor. Por que esse esquema pode ser um obstáculo à recapitalização necessária? Primeiro, o Congresso pode decidir que ele torna a recapitalização menos importante; segundo, e mais importante, é provável que o plano torne a recapitalização pelo governo ainda menos popular.
Se o esquema funcionar, alguns fundos terão retornos extraordinários. Temo que isso sirva para convencer muitos americanos de que o governo é uma quadrilha que opera a favor de Wall Street. Agora imaginem o que pode acontecer caso, após a conclusão dos "testes de estresse" dos grandes bancos, o governo decida -surpresa! surpresa!- que é preciso oferecer mais capital. Como convencer o Congresso a desembolsar os recursos necessários?
A provisão de dinheiro público aos bancos é inaceitável para o público, e o controle pelo governo dos bancos é inaceitável para os banqueiros, que continuam influentes. Parecemos estar vivendo um impasse. A única saída é que a maior transparência propiciada pelos novos fundos venha a permitir que os grandes bancos levantem capital privado. Caso isso seja realizado na escala requerida -e estamos falando de até trilhões de dólares-, o novo plano seria um imenso sucesso. Será que os investidores estarão dispostos a fornecer as vastas somas requeridas por instituições com um histórico claro de gestão inepta? A confiança, quando destruída, nunca retorna rapidamente.
A conclusão, logo, é deprimente. Ninguém pode confiar em que os EUA já tenham solução confiável para o desastre bancário. Pelo contrário: com o público furioso, um Congresso em pé de guerra, um presidente tímido e um plano que depende de injetar dinheiro público em instituições subcapitalizadas, os EUA vivem um impasse.
Cabe a Obama encontrar uma saída. Quando se reunir com seus 19 colegas chefes de governo na semana que vem, não poderá alegar já tê-lo feito. E, se isso não basta para assustar, não sei o que bastaria.

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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