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OPINIÃO ECONÔMICA
Palmas para o Brasil
BENJAMIN STEINBRUCH
Mais de 50 anos depois de
sua criação, decorrente da
campanha nacionalista mais importante da história brasileira, a
Petrobras anunciou na última
sexta-feira que o Brasil alcançou a
auto-suficiência em petróleo.
Não poderia haver coincidência
maior. No mesmo dia, o petróleo
estava cotado no mercado internacional em US$ 75 o barril, o nível nominal mais alto da história.
Nos anos 1970, a participação do
petróleo importado oscilou entre
80% e 90% do volume consumido
no país. Por conta dessa dependência absurdamente elevada, o
país quebrou duas vezes, depois
das crises do petróleo de 1973 e
1979.
Os avanços ocorridos na prospecção e na exploração de petróleo
nesses anos todos são uma lição
para muitos brasileiros que costumam virar o nariz para campanhas que valorizam o sentimento
nacional.
No último fim de semana, ao ler
a notícia sobre a auto-suficiência,
cheguei a um número inacreditável. Se o Brasil tivesse ainda a dependência externa naqueles níveis
dos anos 1970, estaria hoje novamente quebrado. Suponha-se que
o país tivesse de importar ainda
cerca de 85% do petróleo consumido internamente. Isso exigiria a
compra de 1,5 milhão de barris
diários. Com o petróleo a US$ 75 o
barril, os gastos diários com importações atingiriam US$ 112,5
milhões por dia. Acredite se quiser:
US$ 41 bilhões por ano, uma conta
impagável.
A última arrancada dos preços
do petróleo tem a ver com a crise
do Irã, grande exportador do produto que investe no enriquecimento de urânio e ameaça a estabilidade mundial. Mas o nível
atual de preços dessa commodity
energética se explica muito mais
por outro fator: a crescente demanda mundial de matérias-primas liderada pela China.
O efeito China domina a economia mundial há mais de dez anos.
Aquele país é um consumidor voraz de matérias-primas para uma
indústria cuja produção cresce
cerca de 20% ao ano. Os preços do
cobre, por exemplo, triplicaram
desde 2000. Tendências semelhantes afetam zinco, níquel e até o ouro, metais não-ferrosos que atingiram na semana passada níveis de
preço nunca antes registrados no
mercado internacional. O uso
crescente do etanol para substituir
combustíveis derivados do petróleo ajuda a impulsionar o preço do
açúcar.
Detalhe importante nessa história é que não existe no horizonte
nenhuma ameaça de contenção
desse ritmo frenético de crescimento da economia mundial. Até
o Japão, depois de mais de uma
década de estagnação, retomou o
crescimento. Assim, todas as previsões indicam que a demanda de
matérias-primas deverá continuar em expansão durante pelo
menos três ou quatro anos. As fontes dessas matérias-primas são escassas na Europa e nos Estados
Unidos. Elas estão na Rússia, no
Oriente Médio, em alguns países
africanos e na América Latina,
principalmente no Brasil.
A conquista da auto-suficiência
em petróleo deve servir de estímulo para o país. Nas últimas décadas, o Brasil saiu da condição de
medíocre produtor de petróleo
-era alvo de piadas quando produzia apenas 170 mil barris/dia
nos anos 1970 - para um nível
em que passou a ser referência internacional no setor, detentor da
mais avançada tecnologia de exploração em águas profundas. Isso
foi fruto de trabalho, investimentos e do desenvolvimento persistente de tecnologia nacional. O
mesmo caminho está aberto para
a exploração das outras potencialidades brasileiras, como as reservas minerais e os recursos naturais
abundantes.
Com exceção das obtidas no esporte, as conquistas nacionais são
infelizmente tratadas com apatia
e até desprezo, em razão de uma
empáfia inexplicável que leva o
brasileiro a considerar fora de moda valores como nacionalismo e
patriotismo. Comportamento civilizado, neste momento em que a
conjuntura internacional continua a conspirar a favor do Brasil,
seria a união de forças, independentemente de tendências políticas, para maximizar investimentos para preservação e aproveitamento sustentável dos recursos do
país.
Proezas como a auto-suficiência
do petróleo não pertencem a pessoas ou governos. São conquistas
nacionais, que devem ser festejadas e apresentadas como exemplos que sirvam para expurgar de
vez o complexo de inferioridade
que nos persegue há décadas.
Benjamin Steinbruch, 52, empresário,
é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho
de administração da empresa e primeiro
vice-presidente da Fiesp (Federação das
Indústrias do Estado de São Paulo).
E-mail - bvictoria@psi.com.br
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