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OPINIÃO ECONÔMICA
O FMI em tempos de eleição
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
Nas últimas semanas, temos visto toda uma movimentação no sentido de prorrogar o acordo do Brasil com o FMI,
que termina em 13 de dezembro
deste ano. Fala-se muito em um
acordo de transição, que envolveria entendimentos entre o FMI, o
atual governo e os principais candidatos à Presidência.
É difícil que um acerto desse tipo possa ser anunciado antes da
eleição, sobretudo antes do segundo turno, por mais "maduros", "responsáveis" ou "realistas" que possam ser (ou parecer)
os candidatos mais cotados. A dinâmica da disputa eleitoral não
favorece a divulgação de negociações desse tipo.
Depois da eleição, e mesmo antes da posse do novo governo, a
questão é diferente. Tudo indica
que nenhum dos quatro principais postulantes tentará evitar
um acordo com o FMI.
A revista "Estudos Avançados",
do Instituto de Estudos Avançados da USP, a ser lançada agora
em agosto, publicará entrevistas
com esses candidatos a respeito
do relacionamento internacional
da economia brasileira. Uma das
questões feitas a eles foi a seguinte: "O atual acordo do Brasil com
o FMI vence em 2002. O senhor
acredita que ele deve ser renovado?".
Nenhum dos entrevistados teve
a audácia de responder negativamente. José Serra declarou-se, como seria de esperar, favorável à
renovação do acordo. Ciro Gomes, lacônico, limitou-se a responder que "o FMI não é um bicho-papão". Lula, o mais reticente, fez críticas à atuação do FMI,
mas não descartou um acordo.
Para Anthony Garotinho, "a herança econômica que o governo
FHC vai deixar é tão grave que
dificilmente a próxima administração escapa de uma prorrogação e revisão do acordo com o
FMI".
Garotinho tocou na ferida. O
risco, contudo, é que a negociação
de um novo acordo com o FMI
constitua um dos canais de enquadramento do novo governo
no fracassado modelo econômico
em vigor.
Repare, leitor, o caráter paradoxal da situação que estamos vivendo. O FMI é co-autor da "herança econômica" que FHC deixará. O governo brasileiro se encontra, desde fins de 1998, sob a
tutela direta do Fundo. Mesmo
antes, a política econômica do governo FHC estava, em linhas gerais, bastante bem ajustada às diretrizes do chamado Consenso de
Washington.
Os resultados ficaram aquém
do esperado, para dizer o mínimo. O eleitorado brasileiro, cansado de desculpas, evasivas e conversa fiada, quer mudanças na
economia. Sintomaticamente,
nem mesmo o candidato do governo assume com convicção a
defesa da atual política econômica.
E, no entanto, o fracasso tende a
se auto-reproduzir. As próprias
vulnerabilidades econômico-financeiras geradas ou agravadas
durante o período FHC -a dependência em relação a capitais
estrangeiros, a suscetibilidade da
economia a choques externos, a
fragilidade das contas públicas-
criam condições para tentar forçar o próximo governo, mesmo
que eleito em oposição ao atual, a
render-se à orientação econômica
preconizada pelo eixo Wall
Street-Washington.
Mas, se isso acontecer, leitor, o
nosso direito de escolha terá sido
literalmente cassado. E o povo
brasileiro poderá considerar-se
vítima de um gigantesco estelionato eleitoral.
Paulo Nogueira Batista Jr., 47, economista, pesquisador visitante do Instituto de Estudos Avançados da USP e professor da FGV-SP, escreve às quintas-feiras nesta coluna. É autor do livro "A Economia como Ela é..." (Boitempo Editorial, 3ª edição, 2002).
E-mail - pnbjr@attglobal.net
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