São Paulo, quarta-feira, 25 de setembro de 2002

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EM TRANSE

Para investidores, disparada recente da moeda se deve a fatores técnicos

Dólar ainda não inclui Lula e pode ir a R$ 5, diz Wall Street

MARCIO AITH
DE WASHINGTON

Os investidores ainda não embutiram totalmente na cotação do real uma eventual vitória do candidato do PT à Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva. A visão de Wall Street sobre o câmbio brasileiro é que a alta recorde do dólar, verificada nos últimos dias, deveu-se muito mais a fatores técnicos do que políticos. Portanto seria lógico esperar um "estrago" adicional na cotação da moeda brasileira nas semanas e até meses posteriores a uma eventual vitória de Lula -ao menos até o candidato petista sinalizar, com nomeações, a manutenção da atual política econômica.
"Não acho difícil o dólar ultrapassar a barreira de R$ 4 se os mercados começarem a testar Lula antes mesmo de sua posse", disse Paulo Vieira da Cunha, da corretora Lehman Brothers. "Mas isso seria transitório."
José Barrionuevo, da Barclays Capital, disse concordar em que "os mercados estão apenas começando a "precificar" uma vitória de Lula".

Mercado seco
Um operador de câmbio num importante banco de Nova York disse ontem que o mercado continua "ilíquido", "seco" e controlado por poucos investidores, mais interessados em obter ganhos de curto prazo do que em fugir de um "efeito Lula".
De acordo com ele, se essas especulações de curto prazo ocorrerem simultaneamente à "precificação total da vitória de Lula", a cotação do dólar poderia facilmente atingir R$ 4,5 ou até R$ 5. No entanto, ressalvou, isso ocorreria por um período muito curto, pois seria difícil a moeda americana sustentar-se num patamar acima de R$ 4.

Alta artificial
O operador explicou que a alta do dólar nos últimos dias teve relação direta com o vencimento, hoje, de US$ 1,5 bilhão em títulos cambiais do governo. A liquidação desses papéis é feita pelo Ptax (preço médio do dólar, medido diariamente pelo Banco Central) do dia anterior ao do vencimento (no caso, ontem). Portanto, quanto maior o valor do dólar, maior é a remuneração dos investidores, que, para, se beneficiar desse mecanismo de correção, teriam pressionado a cotação da moeda norte-americana.
Outro fator importante é o fato de que, com o fim do mês, aproximam-se os vencimentos dos contratos da BM&F (Bolsa de Mercadorias & Futuros) -e, com esses vencimentos, aumenta a ansiedade dos investidores para influir artificialmente na cotação da moeda, reduzindo perdas ou majorando ganhos. Como o mercado de câmbio tem produzido poucas transações, os investidores conseguem influenciar a cotação do dólar usando muito pouca munição.

Serra com chances
A teoria de que os investidores ainda não embutiram totalmente uma eventual vitória de Lula na cotação do real pode ser vista pelos relatórios de alguns bancos de investimento. O Goldman Sachs, por exemplo, diz em suas últimas análises acreditar que o candidato do PSDB à Presidência, José Serra, ainda pode ganhar as eleições. No entanto, preparando seus clientes para uma eventual vitória de Lula, o banco adverte que, se o PT ganhar, "os mercados financeiros gostariam de ver ações econômicas fortes e rápidas que mostrem a habilidade de uma administração (do PT) para assegurar estabilidade econômica".
Caso contrário, diz uma dessas análises, "os mercados financeiros deverão testar a nova administração num momento em que as condições econômicas globais continuam difíceis para grandes devedores emergentes como o Brasil".
Já o HSBC, que em junho tinha cerca de US$ 2,6 bilhões em sua carteira de empréstimos ao Brasil e que ontem elevou provisões para o país, diz, em relatório, que a cotação do dólar está excessiva e sofrerá uma correção nos próximos dois ou três meses. No entanto, sob um cenário alternativo, chamado pelo banco de "turbulento", a correção no câmbio demoraria muito mais para ocorrer e provocaria uma aceleração da inflação.


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