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ABISMO SOCIAL
Disparidade entre salários recua na maioria das faixas etárias
Cai diferença de renda entre
brancos e negros, afirma Ipea
ANTÔNIO GOIS
DA SUCURSAL DO RIO
O abismo salarial que separa negros e brancos no Brasil tem diminuído, mesmo que aos poucos. É
o que mostra um estudo do Ipea
(Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada) realizado pelos pesquisadores Maurício Cortez Reis e
Anna Risi Crespo.
Para chegar a essa conclusão,
eles compararam, por meio da
Pesquisa Nacional por Amostra
de Domicílios, do IBGE, a diferença de rendimentos entre homens
brancos e negros principalmente
na década de 90. Em quase todos
os grupos etários de 21 a 65 anos,
diminuiu a diferença salarial entre as gerações.
Em 1990, um trabalhador branco entre 48 e 50 anos, por exemplo, ganhava 130% a mais do que
um negro da mesma idade. Doze
anos depois, a diferença salarial
na mesma faixa etária caiu para
90%. A intensidade dessa queda
variou de acordo com o grupo. De
24 a 26 anos, por exemplo, a diferença no rendimento em 1990 era
de 62% a favor dos brancos. Em
2002, caiu para 55%.
Os pesquisadores consideraram
como negros todos os trabalhadores que se autodeclararam pretos ou pardos ao IBGE.
A primeira hipótese investigada
por Reis e Crespo para explicar a
diminuição foi a melhoria do
acesso dos negros à escola. Eles
perceberam, no entanto, que a
distância que separa os dois grupos não diminuiu nesse quesito.
Em quase todas as faixas etárias,
negros aumentaram sua média de
anos de estudo no período. No
entanto, como os brancos também aumentaram na mesma proporção, a diferença ficou praticamente inalterada.
Os pesquisadores levantaram
então a hipótese de que parte da
explicação pode estar na diminuição da discriminação no mercado
de trabalho: "À medida que uma
geração de negros foi avançando
no mercado de trabalho, isso facilitou as coisas para a geração seguinte, que teria sofrido menos
discriminação".
Pesquisar a discriminação no
mercado de trabalho, no entanto,
não é uma tarefa fácil. A simples
comparação de rendimento entre
negros e brancos, por exemplo,
não comprova, necessariamente,
que o mercado de trabalho discrimina o negro exclusivamente por
causa de sua cor da pele.
Em muitos casos, como demonstram também outros estudos, a principal explicação para
essa diferença está na desigualdade na educação. Ou seja, negros
ocupariam postos de menor remuneração não pelo fato de serem negros, mas por terem menos escolaridade do que brancos.
Reis afirma também que há várias razões possíveis para a discriminação: "Uma das explicações é
que ela aumenta a utilidade de
quem discrimina ao colocar o outro em posição inferior. Há também o que chamamos de discriminação estatística. Um empregador, sabendo que em média os
negros têm menos acesso a boas
escolas, interpreta a cor de um
pretendente ao emprego como
uma informação de que ele pode
ser menos preparado".
Para chegar o mais próximo do
que seria a discriminação no mercado de trabalho, Reis e Crespo
tentaram separar da diferença de
rendimento entre os grupos o
quanto seria explicado por fatores
regionais ou de escolaridade, profissão e posição na ocupação. Isso
porque sabe-se que, independentemente de cor ou raça, os salários
variam de acordo com escolaridade, região onde habita, profissão
escolhida e cargo do trabalhador.
Ao levar em conta essas variáveis (ou seja, comparando trabalhadores negros e brancos com
perfil semelhante), o estudo mostra que a maior parte da diferença
salarial desaparece. Ainda assim,
no entanto, uma parte permanece. Foi essa parte que eles chamaram de termo de discriminação.
Em 2002, 71% da diferença salarial entre trabalhadores de 24 a 26
anos estava relacionada a fatores
como educação, região, setor de
atividade e posição na ocupação.
Ou seja, 29% da desigualdade era
explicada pela discriminação ou
por outros fatores. Em 1990, no
entanto, o peso da discriminação
era maior: chegava a 35%.
Mesma tendência de queda da
discriminação foi encontrada na
comparação entre trabalhadores
de 48 a 50 anos. Em 1990, 31% da
diferença era explicada pela discriminação. Doze anos depois, essa proporção era de 25%.
Reis alerta de que outros fatores
que não são mensuráveis podem
influenciar a diferença: "Até
quando comparamos dois trabalhadores da mesma região, com
mesma escolaridade, profissão e
posição, não sabemos se um deles
teve acesso a uma boa universidade enquanto outro estudou em
uma instituição de baixa qualidade, o que pode também influenciar na escolha do empregador".
Na avaliação da ministra da Secretaria Especial de Políticas de
Promoção da Igualdade Racial,
Matilde Ribeiro, a diminuição do
hiato salarial entre negros e brancos é um avanço, mas ainda há
muita desigualdade: "Há 20 anos,
negava-se até que existia essa diferença. Hoje, ela é evidente. As melhorias são fruto de duas décadas
de luta do movimento negro, mas
ainda há muito a fazer".
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