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FRAUDES DO CAPITAL
Companhia, acusada de sonegação em negociação fictícia de títulos, quer provar que operações existiram
Bombril envolve empresas em caso de lavagem
ELVIRA LOBATO
DA SUCURSAL DO RIO
Multada pela Receita Federal
em pelo menos R$ 1,8 bilhão
-acusada de sonegação na negociação de títulos no valor de US$
1,3 bilhão-, a Bombril entregou
documentos à Polícia Civil de São
Paulo que envolvem outras grandes empresas brasileiras em investigação policial sobre lavagem
de dinheiro e evasão de divisas.
São empresas como Odebrecht,
Globopar (Globo Comunicações
e Participações) e Braskem, além
do grupo Coinbra, de industrialização e exportação de soja.
Uma das maiores fabricantes de
produtos de higiene e limpeza do
país, a Bombril repassou à polícia
cópias de contratos e documentos
que detalham 180 operações de
compra e venda de títulos estrangeiros realizadas pela empresa no
período de 1998 a 2002, quando
uma brecha na legislação permitiu grande volume de negócios
com esses papéis no país, sem registro no Banco Central.
A compra e a venda de títulos
estrangeiros são legais, mas há
suspeita de que pelo menos parte
dos papéis negociados não existia,
o que constituiria fraude.
Como há essa suspeita, o objetivo da Bombril é fazer com que as
empresas que negociaram com
ela naquela ocasião sejam chamadas e apresentem os comprovantes de que os títulos existiram e
que eram operações financeiras
usuais de mercado.
A Bombril negociou US$ 1,3 bilhão em títulos naquele período,
supostamente para levantar capital de giro no curto prazo.
A Receita Federal entendeu que
houve sonegação de impostos e
multou a Bombril em R$ 1,5 bilhão, em dezembro do ano passado, só pelas negociações havidas
em 1999. No ano anterior, ela já
havia sido multada em R$ 300 milhões, por conta das operações de
98. Como a prática perdurou até
2002, a própria empresa espera
receber notificações de R$ 1,2 bilhão no final deste ano e de R$ 500
milhões nos próximos dois anos.
A Bombril está recorrendo das
multas e avalia que, se for inocentada no inquérito policial, terá
grande possibilidade de vencer
também a batalha fiscal. Daí ter
entregue os contratos à polícia.
Nas últimas duas semanas, a reportagem da Folha ouviu empresas e advogados envolvidos no caso. As empresas negam ter cometido irregularidade e dizem que as
negociações com títulos estrangeiros são amparadas em pareceres de advogados, os quais asseguravam sua legalidade, e, ainda,
que foram assessoradas por bancos de primeira linha.
Os papéis em questão eram títulos do Tesouro dos EUA (T-Bill) e
da Argentina, além de bônus da
própria Bombril lançados no exterior. As grandes empresas representaram a fatia menor das
transações efetuadas pela Bombril. A maior parte das vendas foi
para empresas desconhecidas,
que receberam depósitos oriundos de doleiros em suas contas. O
inquérito investiga a origem e o
destino final dos recursos. Algumas são acusadas de lavagem de
dinheiro em outros inquéritos.
Outras respondem a acusação
desse tipo no exterior.
As operações da Bombril são investigadas pela 7ª Delegacia Policial da Lapa (zona oeste de São
Paulo) em inquérito aberto em setembro de 2000, o que suscitou
uma outra polêmica: como evasão de divisas e lavagem de dinheiro são crimes federais, a Polícia Civil não teria competência legal para investigar o caso.
Falência
Seis ex-dirigentes da Bombril já
prestaram depoimento, e o presidente da empresa, José Edson Bacellar Júnior, vai depor na quinta.
A polícia quer que ele informe o
paradeiro dos italianos Sérgio
Cragnotti e Edoardo Battista.
Cragnotti faliu e foi preso em
Roma, em 2003, após tirar dinheiro da Bombril para outras empresas de seu grupo no exterior. Por
conta disso, foi multado em
R$ 62,5 milhões pela CVM (Comissão de Valores Mobiliários),
em 2002, a maior já aplicada pela
instituição. Battista foi o principal
executivo da Bombril na gestão de
Cragnotti e, supostamente, o responsável pela decisão de negociar
os títulos estrangeiros.
Além dos problemas com o fisco e da investigação policial, a
Bombril é alvo de disputa por seu
controle acionário. Desde a falência de Cragnotti, ela está sob regime de administração judicial, que
foi instaurada, em julho de 2003, a
pedido ex-acionista controlador,
Ronaldo Sampaio Ferreira.
Já estão identificadas no inquérito as empresas que negociaram
R$ 1,9 bilhão, em valores históricos (não corrigidos pela inflação),
com a Bombril. Entre os documentos que estão em poder da
polícia, há cópias de dois contratos assinados pela Globopar, em
agosto de 1999, em que ela vende à
Bombril T-Bills no total de US$
5,257 milhões, correspondentes,
na época, a R$ 9,4 milhões.
A Bombril repassou os papéis
no mesmo dia a um corretor uruguaio, chamado Ignácio Rospide
de León, que também foi acusado
de fraude financeira em seu país.
O corretor seria só um intermediário para repassar o dinheiro a
outras contas no exterior.
Outro contrato, também obtido
pela Folha, mostra que a Bombril
comprou US$ 3 milhões em T-Bills da Coinbra, um dos maiores
exportadores de soja e de suco de
laranja do país, subsidiária do
grupo francês Dreiffus. A Coinbra
fatura o equivalente a US$ 1,8 bilhão por ano no Brasil.
Entre as grandes empresas que
negociaram títulos com a Bombril, a OPP Petroquímica, atual
Braskem, controlada pelo grupo
Odebrecht, foi a que mais operações realizou: R$ 32,16 milhões. A
empresa está sendo intimada para esclarecer as operações.
Também há dois contratos em
nome da Construtora Norberto
Odebrecht, de julho de 1999, em
que ela aparece como vendedora
de títulos para a Bombril. Com as
cópias dos contratos, estão anexados os comprovantes de depósito
do dinheiro na conta da construtora no Brasil: R$ 11,53 milhões.
A Daslu -localizada em São
Paulo, acusada de sonegação fiscal e descaminho de mercadorias
de luxo- aparece nos documentos que a Bombril entregou à polícia como vendedora de T-Bills, no
valor de US$ 108 mil. A operação
foi realizada em outubro de 2001.
Em nome da empresa Tecnologia Bancária (Tecban, que administra o Banco 24 Horas), há dois
contratos de venda de T-Bills, de
outubro de 2001, que somam
R$ 1,44 milhão. No histórico da
movimentação de compra e venda de títulos entregue à polícia, a
Bombril informou não ter registro do destino dos papéis que ela
adquiriu da Tecban.
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