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LUÍS NASSIF
Desafio para gente grande
A última reunião do Copom (Comitê de Política
Monetária do Banco Central)
marcou o final da ditadura técnica imposta pelo Banco Central ao governo Lula. O bom
senso político prevaleceu sobre
o pensamento burocrático, a
ordem veio de cima e o BC acatou.
Agora, é importante avaliar
a complexidade do desafio. É
impossível ao país manter indefinidamente a atual política
de juros e de câmbio. Não há
mais limite político ou econômico para continuar a gerar
superávits fiscais que garantam o pagamento da dívida.
Vamos a alguns pequenos
exercícios matemáticos, sem
muita atenção aos detalhes,
apenas para dar uma idéia dos
grandes números em jogo.
Imagine um pequeno modelo
com três variáveis: crescimento
do PIB, superávit primário (receita menos despesa do Estado
excluindo pagamento de juros)
e taxa real de juros da dívida
pública -e a dívida partindo
do patamar atual de 55% do
PIB.
Hipótese 1 - taxa real de 10%
ao ano, superávit primário de
4,25% ao ano e crescimento do
PIB de 2% ao ano. Nem se pode
imaginar nível maior de crescimento com taxas de juros e superávits fiscais dessa magnitude. A relação dívida interna/
PIB terminaria, em 2012, em
55% do PIB -isso se não sobrevier uma crise cambial, monetária ou política no caminho. Ou seja, dez anos com cortes monumentais de investimento público e privado, no
custeio, aumento de tributação
e manutenção de juros altos,
supondo um governo politicamente capaz de segurar a bomba sem explodir, em um quadro em que segurança, educação e saúde estão em estado
mais que precário.
Hipótese 2 - o superávit primário caindo de 4,25% para
3% (o que é mais realista, mas
ainda extraordinariamente
elevado). Em 2012, a relação
dívida interna/PIB estará em
70%, dez pontos percentuais a
mais. É possível?
Hipótese 3 - imagine que o
Banco Central baixe a taxa de
juros real para 5% ao ano e
permita crescimento do PIB de
5% ao ano. Nesse caso, se o superávit primário cair para 2%
ao ano, em 2012 a relação dívida interna/PIB ainda estaria
em 42%. Se se mantiver o superávit de 3% ao ano, a relação
cai para 32%.
É evidente que a terceira hipótese é a mais adequada.
Com juros mais baixos, estimula-se o crescimento, pode
haver mais recursos para infra-estrutura, redução da carga fiscal.
Há dois tipos de risco na terceira hipótese. O primeiro, de
parte dos investidores transferir sua liquidez para outras
praças, por meio da compra de
dólares, com desvalorização
cambial e reflexos sobre a inflação. O segundo é o da necessidade de articular a gestão da
economia de maneira a aumentar a capacidade produtiva para atender o crescimento
sem inflação. Não é tarefa para
amadores.
Posto que a terceira hipótese
é a única que sinaliza uma saída para o país, a apresentação
das contra-indicações para sua
redução dos juros é fútil. A discussão em pauta é como montar a estratégia adequada e
dispor das pessoas certas para
romper o nó górdio. Segurar o
curto prazo com uma carga de
juros suicida é fácil. O desafio
será romper com a política monetária em vigor. E aí se verá
que o Banco Central exige uma
estadista.
E-mail -
Luisnassif@uol.com.br
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