São Paulo, terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

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BENJAMIN STEINBRUCH

Não é hora de vacilar


Se a Convenção 158 fosse boa, já estaria em vigor no Brasil e em outros países há muito tempo

PODE PARECER constrangedora para um empresário a iniciativa de criticar propostas defendidas por trabalhadores aparentemente garantidoras da estabilidade no emprego. Entro, porém, com tranqüilidade nesse tema por considerar que se trata claramente de um caso em que o feitiço vai se voltar contra o feiticeiro, com prejuízos gerais para o país.
O tema em questão é a ratificação da Convenção 158 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), que se refere ao término da relação de trabalho por iniciativa do empregador. Na semana passada, o presidente Lula enviou ao Congresso mensagem pedindo que a convenção seja ratificada e passe a vigorar no país.
Essa convenção, promulgada pela OIT em 1982, proíbe demissões de empregados sem justa causa. Diz que, para demitir um funcionário, o empregador precisa explicar por escrito os motivos da dispensa e negociá-la com o sindicato do trabalhador. Se as duas partes estiverem de acordo, o desligamento pode ser feito. Caso contrário, o empregado tem direito de ir à Justiça, que decidirá se a demissão será consumada ou se o trabalhador continuará no cargo.
Propõe negociação e recurso à Justiça em caso de desacordo. Mas na prática representa um retrocesso inaceitável, como será detalhado a seguir.
Um dos maiores especialistas em relações do trabalho no país, o professor José Pastore ("O Estado de S. Paulo", 19/2/08) enumera quatro conseqüências práticas da adoção da Convenção 158: 1) Criação de burocracias de grande complexidade, prolongamento de prazo de demissões e aumento absurdo de custos; 2) relutância das empresas em abrir vagas, porque não há certeza sobre quanto vai demorar ou custar um eventual desligamento; 3) aumento do desemprego de longo prazo e dos gastos do governo com seguro-desemprego; 4) aumento do número de ações trabalhistas, que hoje já congestionam a Justiça com mais de 2 milhões de processos.
Além desses aspectos, a adoção dessa medida certamente colocaria o país na contramão na corrida para a formalização do trabalho. Desde o início do governo Lula até janeiro, foram criados 6,4 milhões de empregos com carteira assinada, num movimento nunca antes visto no país. Com a criação de novas dificuldades para o desligamento, a tendência de opção pela informalidade seria inevitável.
Se a Convenção 158 fosse boa, já estaria em vigor no Brasil e em outros países há muito tempo, já que foi promulgada pela OIT há 25 anos. Em abril de 1996, chegou a ser ratificada pelo Congresso brasileiro, mas foi revogada em novembro do ano seguinte, por incompatibilidade com a Constituição, que adota o princípio indenizatório em rescisões contratuais de trabalho. Em todo o mundo, apenas 34 países ratificaram a convenção, a maioria em desenvolvimento.
Não é hora de retrocessos. Criar empregos deve ser o maior objetivo do país em qualquer tempo. Seria uma pena se entrasse na contramão exatamente no momento em que adquire prestígio internacional, passa a ser credor externo líquido, está próximo de conseguir o "grau de investimento" e se habilita a ser um dos maiores absorvedores de investimentos produtivos do século 21. O exame sereno dessa proposta, tanto por empregados como por empregadores, leva a uma única conclusão: ela não ajuda nem nas relações trabalhistas nem na criação de empregos. Sua rejeição pelo Congresso será uma decisão de bom senso.


BENJAMIN STEINBRUCH , 54, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

bvictoria@psi.com.br


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