São Paulo, quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

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VINICIUS TORRES FREIRE

O rebolado ideológico nos EUA


Economistas de Obama tomam meias medidas, evitam morder donos do capital e jogam para a galera

A PETROBRAS talvez não seja uma estatal, nem o Banco do Brasil. Estatais não têm acionistas privados e são totalmente dirigidas pelo governo, segundo a definição do emérito economista e presidente do Fed, Ben Bernanke, em depoimento oficial a deputados. Isso foi ontem. Anteontem, dissera que a compra de parte das ações de bancos pelo governo se chama "parceria público-privada".
Quando o governo americano entraria com mais dinheiro? Segundo o Tesouro e o BC dos EUA, assim que as auditorias indicarem que é necessário fazê-lo, mas apenas depois que se tenha "encorajado" os bancos a pegar dinheiro no mercado (rir, rir, rir). Enfim, parece que o BC e a "Fazenda" dos EUA estão com a ideia de pingar dinheiro pouco a pouco nos bancos, empurrando com a barriga a fim de não cortar na carne dos donos do capital, algo que quase 10 de 10 bons economistas americanos não recomendam.
A posse de Barack Obama abriu a temporada do teatro do rebolado ideológico na administração da economia americana. Trata-se de evitar a ruína das instituições financeiras sem que o governo pareça: 1) amigo dos "gatos gordos" de Wall Street, para o público mais popular; 2) "socialista", para o público republicano e para o americano "médio"; 3) inimigo do capital. Isto é, o governo deve dar um jeito na coisa, mas sem tirar dinheiro de acionistas e credores dos bancões zumbis (mortos-vivos, quebrados, mas respirando por aparelhos pagos pelo governo).
O terceiro passo desse rebolado é o que "está pegando". Quem detém ações e outros títulos de instituições financeiras que pagam rendimentos fixos ou contratados está com medo. Teme que, numa estatização ou coisa parecida, o governo o obrigue a converter parte de seus papéis em ações ordinárias e/ou que adie "sine die" o pagamento de dividendos.
Aqueles que estão fora dos bancos não querem investir neles porque, além do risco genérico de calote, não sabem que garantia de sobrevida o governo dará aos bancos -ou melhor, que tipo de garantia. Os acionistas em geral, por sua vez, temem ver sua participação relativa no capital dos bancos ainda mais reduzida (caso o governo entre ainda mais nos bancos, convertendo os dinheiros de vários socorros oficiais em ações ordinárias).
O problema não é só o de "expropriação do capital", mas o dia seguinte: investidores escaldados por perdas excessivas tendem a não voltar a colocar seu dinheiro em bancos. Mas os governos do mundo inteiro precisam fazer com que os investidores ajudem a recapitalizar os bancos, sem o que o crédito demorará muito tempo para voltar (ou exigirá que os governos torrem muito dinheiro para fazê-lo. Aliás, é provável que muitos governos, como os europeus, não tenham recursos para tapar os rombos).
A equipe econômica de Obama, pois, tem de rebolar e fazer teatro, conciliando os papéis que muitos deles já desempenharam: de altos burocratas e de altos financistas de Wall Street (ou agregados). Os economistas de Obama incentivaram as facilidades para lambanças financeiras, concedidas no governo de Bill Clinton, ou as apoiaram nos anos de George Bush (ou não viram o problema ou fizeram vista grossa).

vinit@uol.com.br


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