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OPINIÃO ECONÔMICA
Dois pesos e duas medidas no governo
MAILSON DA NÓBREGA
A privatização das telecomunicações e a proposta de reforma tributária revelam duas faces do mesmo governo. Na primeira, vê-se a fronteira da moderna regulação e o foco na eficiência. Na segunda, aparecem
sinais de retrocesso na técnica
de tributação.
Na privatização, o governo está privilegiando a concorrência
e o consumidor, em vez da arrecadação de recursos. O valor seria maior se preservado o monopólio da Telebrás, mas a venda fragmentada é vantajosa
para o usuário e a eficiência da
economia.
Assim, o processo girará em
torno da competição. Além da
fragmentação da Telebrás, prevê-se a criação de "empresas-espelho" para cada uma das parcelas privatizadas. No final, haverá a competição de todas elas
entre si.
A vontade de beneficiar o
consumidor está sendo viabilizada pelo avanço da tecnologia
e dos novos caminhos para a
competição, proporcionados
pela informática, pelos satélites, pela comutação digital e pela telefonia celular.
Em passado recente, a competição no setor era tida como
impossível, mas nos últimos 25
anos a situação mudou sob o
impulso desses fatores, da privatização e dos novos modelos
de regulação.
A revolução daí decorrente
barateou dramaticamente o
custo dos serviços, popularizou
o acesso ao telefone, facilitou a
expansão da Internet e acelerou
a globalização, particularmente no sistema financeiro. Resultado: aumento do bem-estar e
maiores possibilidades de crescimento da economia.
Com o aproveitamento dessa
rica experiência, a privatização
das telecomunicações brasileiras dotará o país do que há de
mais moderno no campo concorrencial e regulatório.
A privatização forçará a queda das margens, pois diminuirão muito as barreiras à entrada de competidores. Haverá
metas mínimas de instalação
de novas linhas, de atendimento às populações menos favorecidas e de universalização dos
serviços.
Mais uma vez, o atraso ficará
por conta de grupos corporativistas, de segmentos retrógrados da esquerda e de políticos
oportunistas. Eles estão questionando a venda, o preço mínimo (como se fosse a parte
mais relevante do processo) e a
conveniência de efetuar a transação neste momento.
O atraso está também presente nos que se opõem à privatização alegando o caráter estratégico das telecomunicações. São
os que não entendem as mudanças em curso no mundo
nem a falência dos modelos de
intervenção estatal.
O Estado em crise é outra justificativa para a privatização, a
qual viabilizará os investimentos na expansão e na atualização tecnológica do setor. As forças armadas, como se viu, mostraram que o processo não
constitui ameaça à soberania
nacional.
Enquanto troca arrecadação
de receitas temporárias de privatização das telecomunicações
por bem-estar dos cidadãos e
eficiência na economia, o mesmo governo pretende trilhar,
com a perpetuação da CPMF,
caminho exatamente inverso.
Aparentemente, essa perpetuação seria neutra, pois a proposta prevê que o valor da
CPMF seria abatido do Imposto
de Renda (IR) devido. Representaria, assim, inofensiva antecipação do IR, com a vantagem de permitir cobrar dos sonegadores.
Há apenas uma verdade no
discurso oficial, a de que os sonegadores pagarão o imposto.
O argumento vale para quem
não se preocupa com os efeitos
colaterais da perpetuação da
CPMF.
Levada a idéia ao extremo, o
melhor seria transformar a
CPMF em imposto único. Seria
um desastre econômico e social,
mas arrecadaria muito no início e até permitiria extinguir a
Receita Federal.
O mais é no mínimo duvidoso. Um imposto permanente sobre transações financeiras é ave
rara ou inexistente na fauna
tributária mundial. Seus defeitos são inúmeros. Um deles será
reduzir a eficiência na intermediação financeira e assim conspirar contra a competitividade
das empresas e o desenvolvimento do país.
A CPMF permanente criará
incertezas, pois as empresas
não saberão a priori se terão IR
a pagar ou quanto será o seu
valor. Para os contribuintes
isentos, o tributo é injusto. O
argumento de que esses não recorrem ao sistema bancário
precisa ser provado.
A medida também dificultará
a ação do Banco Central. O recibo da CPMF dificilmente seria aceito em outros países como antecipação do IR, o que
reduziria a remuneração final
dos investidores estrangeiros e
interferiria na política de juros.
Diferentemente do que diz o
governo, a perpetuação da
CPMF não é neutra. Além de
macular sua excelente proposta
de reforma tributária, a proposta é um retrocesso e incorre em
contradição com a moderna estratégia de privatização das telecomunicações.
Mailson da Nóbrega, 56, ex-ministro da Fazenda (governo José Sarney), escreve às sextas-feiras nesta coluna.
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