São Paulo, sexta, 26 de junho de 1998

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LUÍS NASSIF
O caso Ceterp

É impossível que o ex-prefeito de Ribeirão Preto, Antônio Palocci (PT), tenha feito caixinha política com a venda de parte das ações da Ceterp -a telefônica local. Assim como é impossível a existência de caixinha política na privatização da Telebrás.
Ambos os processos foram transparentes. Mas o de Ribeirão foi tecnicamente desastroso para a prefeitura, muito mais pela pressa com que foi conduzido do que pela operação em si.
A Ceterp era um departamento da prefeitura. Foi transformado em Sociedade Anônima. Decidiu-se pela venda de 45% do capital da empresa. Para preparar a venda, a prefeitura recorreu a três organizações respeitadas: Banco Fator, Bradesco e Trevisan e Associados.
O momento não era oportuno. Não havia regulamentação do setor telefônico no país e os grandes investidores internacionais ainda não haviam voltado sua lupa para o setor. Além disso não havia nenhuma proposta de acordo com os novos acionistas -que ajudaria a melhorar o valor da companhia-, e firmou-se um acordo com o sindicato garantindo a estabilidade dos funcionários até o ano 2001.
Segundo me disse Palocci, também lhe foi informado que a falta de tradição de mercado prejudicaria o preço da empresa. Tudo conspirava contra o valor a ser arrecadado.
Adotou-se então o processo de venda em bloco, que fez com que o capital fosse arrematado por três fundos de pensão: a Previ (Banco do Brasil), Sistel (Telebrás) e Telos (Eletrobrás), por pouca coisa além do preço mínimo.
Demanda reprimida
A companhia tinha vantagens expressivas. Atua monopolisticamente na região, e tinha demanda reprimida, sim. De 31 de dezembro de 1995 a 31 de dezembro de 1997 o número de terminais fixos aumentou de 116.702 para 156.485 (aumento de 34%); o de celulares, de 16.767 para 49.491 (aumento de 195%).
Antes da privatização, o patrimônio líquido da companhia era de R$ 172 milhões. Foram vendidos 45% por R$ 57 milhões -um deságio de 26% sobre o valor patrimonial. No exercício de 1997, o patrimônio líquido já havia saltado para R$ 266 milhões, confirmando o seu potencial de crescimento.
Se se considerasse apenas o resultado operacional do último exercício (R$ 25 milhões), e taxa de desconto de 15% ao ano (mesma do Sistema Telebrás), sem se levar em conta crescimento futuro das receitas, o valor do investimento dos fundos já ascenderia a R$ 75 milhões.
Acordos tardios
Em setembro, depois de a ausência de um acordo ter reduzido o preço de venda, a prefeitura se dispôs a assinar, finalmente, um acordo de acionistas -que serviu para valorizar as ações que já estavam em mãos dos fundos.
Foi assinado um acordo pelo qual os fundos passaram a ter poder de veto sobre a indicação de diretores, sobre acordos salariais e sobre alienação de bens pelo controlador, como garantia de profissionalização da gestão.
Chegou-se a assinar um protocolo de intenções, conferindo direito de preferência aos fundos nas futuras alienações de capital da companhia, admite Palocci . Só não foi transformado em acordo porque dependia da aprovação prévia do Tribunal de Contas do Estado -que se recusou a opinar sobre um protocolo. Tivesse sido assinado, e o prejuízo final estaria consumado.
Segundo Palocci, do dinheiro arrecadado, R$ 50 milhões foram pagos à prefeitura, por conta da licença de venda de telefones. O restante, investido na própria empresa.
Os R$ 50 milhões foram utilizados por ele para a cobertura de despesas orçamentárias: asfaltamento de bairros, construção de escolas e de unidades de saúde e em um programa de renda mínima, tudo em 1996, ano eleitoral. Segundo Palocci, não havia disponibilidade no orçamento para essas despesas.
O programa de renda mínima foi mantido por seu sucessor, agora sem mais dispor dos recursos da privatização.
Não houve desonestidade da parte de Palocci. Mas grande dose de inexperiência na condução do negócio, e uma maneira de aplicar os recursos arrecadados que, certamente, não honra a tradição de gestão municipal do PT.

E-mail: lnassif@uol.com.br



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